23 julho 2011

NOSSO MUNDO

Há muito tempo que os italianos não conseguem pontuações tão brilhantes no terreno econômico como as obtidas pelos alemães. Contudo, a sétima economia do mundo vive com isso tranquilamente. Enquanto os mercados financeiros não sofrerem um ataque de histeria e os bancos italianos seguirem comprando os bônus de seu Estado, a dívida resulta suportável. Desde o início da semana passada, porém, todos os acordos existentes até então perderam sua validade: as agências de classificação de risco repreenderam o país, os investidores fugiram apavorados, as ações dos grandes bancos romanos despencaram e o pânico tomou conta das bolsas. Os juros, os impostos sobre riscos e as taxas de retorno para os bônus do Estado italiano dispararam. Grécia, Portugal e Irlanda são pequenas iscas perto do peixe gordo que é a Itália que passou a figurar na alça de mira dos mercados financeiros.

Cerca de 1,84 bilhões de euros em bônus do Tesouro italiano estão atualmente em circulação. Em comparação, a Espanha, quarta economia da zona euro, conta somente com 0,65 bilhão de euros. Trata-se principalmente de credores italianos que emprestaram dinheiro à sua república. Só 262 bilhões de euros, menos de 15% desta dívida estatal, encontra-se na carteira de bancos estrangeiros, entre eles instituições francesas que, com bônus no valor de 98 bilhões, possuem a maior parte da dívida em mãos estrangeiras. Os bancos alemães têm muito menos: cerca de 36 bilhões. No entanto, sem eles, os Bad Banks limitam-se a ir guardando títulos podres. Assim, não há nenhuma razão para agitação.

Até o final de 2011, contudo, devem ser financiados 177 bilhões de euros que, em 2012, serão cerca de 245 bilhões e até o final de 2014 alcançarão os 700 bilhões. Em vista dessas consideráveis obrigações financeiras, o ministro italiano das Finanças, Guilo Tremonti, começou a se preocupar com a possibilidade de os mercados financeiros começarem a apostar na alta.

Há, porém, poucos motivos para que se alimente o pânico: a Itália não está afetada por nenhuma crise imobiliária nem bancária, nem está, tampouco, superendividada como a Espanha. Para o governo em Roma, por mais louco que seja, o enorme desemprego de jovens de segue sendo de longe um problema pior que o da dívida do Estado.

O recente programa de austeridade do ministro das Finanças – que recém assumiu o gabinete – contemplo um arrocho de 40 bilhões de euros que será prorrogado até depois das próximas eleições para o parlamento, em 2013, mas que representará pouco mais do que migalhas se os juros e taxas sobre o risco para os títulos italianos começarem a disparar como ocorreu nas semanas anteriores. Ainda que a Itália possa garantir nos próximos meses o pagamento de seus títulos, será só ao preço de acumular uma montanha de dívida que alcançará o céu.

Os fiadores da Europa só podem esperar que seus governantes vejam os sinais do incêndio que se avizinha e compreendam que a crise financeira está muito longe de ter terminado. A partir do momento em que a Itália se encontre na alça de mira dos credores e dos mercados internacionais, o tamanho de qualquer programa de resgate será incomensurável. A única libertação possível para os países da Europa está ao alcance da mão: os eurobônus devem agora competir com os bônus do Tesouro estadunidense de maneira eficaz. A zona euro necessita de uma política financeira, uma estrutura fiscal e um mercado comum para os títulos públicos; do contrário, pode ir despedindo-se do euro. Da retórica anti-crise de nossas elites, que de nada ajuda, só se aproveitam os estados anglo-saxões quebrados.

(*) Michael R. Krätke é membro do Conselho Editorial de SinPermiso.

Tradução: Katarina Peixoto


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/





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O golpe de Estado está intacto em Honduras

Por Raúl Fitipaldi, no sítio da Adital:

Qualquer conversa sobre os direitos humanos em Honduras é um tema que não se fecha nunca. A ferida aberta pelo Golpe de Estado e perpetrado em 28 de junho de 2011 pelo trio Oligarquia–Militares-Estados Unidos está sangrando e percorre Nossa América, de norte a sul. Nem só os 18 departamentos territoriais de Honduras, nem seu Departamento 19 (assim se chama os hondurenhos no exterior), como nenhum habitante do continente de Morazán, Bolívar e Artigas, pode ter sentido paz com esta agressão, baseada em um estilo de intervenção que parecia sepultado a mediados dos anos 80 na região.



Dois dias antes do assassinato de outro comunicador social, Nery Geremías Orellana, o 14º assassinado desde o golpe e sua "continuidade institucional”, gerente de Rádio Joconguera de Calendaria perto da fronteira hondurenha com El Salvador, nos reunimos, via internet, com Bertha Oliva, revitalizando a já antiga ponte virtual entre Honduras e Florianópolis, Brasil.

Falar com a señora Bertha Oliva (55), fundadora do Comitê de Familiares de Detidos Desaparecidos em Honduras (COFADEH) é, sem dúvida, uma experiência de paz, de amor pelo povo, de afinco pela verdade e de constante lembrança e homenagem às vítimas passadas e atuais de todos os golpes que a história de Honduras já viveu. Bertha Oliva de Nativí, mãe de dois filhos, iniciou seu caminho de justiça homenageando seu esposo, detido e desaparecido em 1981, sobe o exercício presidencial de Policarpo Paz García. Seu esposo era o dirigente político Tomás Nativí sobre quem declarou em outra entrevista: "Era um revolucionário que sonhou com crianças, pão e escola. Um dia seus sonhos virarão realidade, mas ainda nosso país continua sendo uma república alugada e usada”.

Esforçando-se para que sempre a tivéssemos no centro da nossa tela (durante 50 minutos), a partir da pequena câmera web do computador do colega Ronnie Huete, Bertha Oliva nos recebeu no COFADEH. Desde ali nos disse o que segue a respeito do relatório da Comissão da Verdade oficial e sobre outros aspectos de Honduras a mais de dois anos do Golpe de Estado Cívico Militar que impôs o ditador Roberto Micheleltti Bain (68) como "presidente” da nação de Lempira:

Quais são suas conclusões sobre o relatório da Comissão Stein?

O relatório da Comisão da Verdade, patrocinada pelo governo, fortalece a impunidade. De fato, não podiamos esperar outra coisa. É um relatório que me gera preocupação.

Qual é o perfil de José Miguel Insulza, secretário geral da OEA neste assunto?

A atitude do senhor Insulza está à beira da impunidade.

Juridicamente, o relatório está bem elaborado?

Tecnicamente está muito bem concebido, até parece um relatório completo, mas não é. O que acontece é que os golpistas e as classes dominantes têm pressa para fechar este asunto.

Isso é que em função da agenda de conversas do Presidente de transição Porfirio Lobo Sosa com os partidos políticos?

Me parece que a intenção de Lobo e de boa parte das hierarquias partidárias é seguir adiante com os acordos da forma antiga. Isto acontece enquanto ficam ocultos, sob os escombros, crimes de lesa humanidade e crimes de lesa pátria. Isto é a implementação da linha sugerida desde Washington.

No relatório Stein que caráter assumem as forças militares que participaram do fato?

A cúpula militar recebeu garantias e um processo que parece que os limpa de culpas, para que possam ocupar cargos estratégicos nas instituições e as empresas nacionais, como é o caso do General Romeo Vásquez Velásquez, que dirige Hondutel (a empresa telefônica nacional). O que em definitiva se aplica é uma "justiça” eficaz para os golpistas, enquanto que para o resto, os que se opuseram e se opõem ao Golpe são perseguidos.

Como no caso do Enrique Flores Lanza, do Padre Tamayo, do Padre Fausto Milla?

Olha, dá pena, muita dor, ver o Padre Fausto Milla, um homem da quarta idade, sair ameaçado do país com uma malinha junto a sua ajudante, Denia Mejía. Pode ser que não dê para retornar nunca mais… O Padre Milla é o Comissionado Nacional da Comissão de Verdade, que não tem nada a ver com a Comissão de Stein, é uma Comissão independente internacional, integrada entre outros por Adolfo Pérez Esquivel, por Nora Cortiñas, Mirna Perla e muitas pessoas reconhecidas no tema dos Direitos Humanos. Sinto a agressão a Fausto Milla como uma forma de agredir e intimidar a Comissão da Verdade que é independente do poder.

O Presidente de transição, Porfirio Lobo, gastou um considerável volume de dinheiro em propaganda sobre a paz e a reconciliação hondurenhas…

A paz dos cemitérios, porque a situação de não ter defesa é tremenda e crescente.

Mas a senhora diz que o relatório Stein está bem feito…

Tecnicamente está, mas não fala, por exemplo, da violação da Autonomia Universitária. Informa dos fatos, mas nada diz do papel do Estado no Golpe.

Qual é o papel que corresponde à Procuradoria e à Justiça em geral?

Não tem separação de poderes em Honduras. Abaixaram o perfil de Luis Alberto Rubí e nada foi imputado às procuradorias especiais. Menos ainda foram imputadas responsabilidades a Ramón Custodio, o Comissionado pelos Direitos Humanos do Estado. Aliás, só um 10% dos entrevistados pertencem ao âmbito da Resistência, nem sequer o ex-presidente Manuel Zelaya foi entrevistado.

Como caraterizaria este momento, desde a perspetiva dos Direitos Humanos?

Neste momento, o Golpe é pior que antes. É mais oculto, mais difícil de identificar, mas opera de modo mais brutal, contra os opositores. Tem crimes seletivos em todos os âmbitos da sociedade que se resiste ou reivindica seus direitos: dirigentes, professores, camponeses, estudantes. Os assassinatos se fantasiam de ajuste de contas, de acidentes, e de muitas formas.

Honduras voltou para a OEA após cumprir alguns aspectos do Acordo de Cartagena, a senhora concorda com a decisão dos países irmãos?

O cenário nos afirma, segundo vemos, que o Equador está com a razão. Honduras não deveria ter sido reinserida na OEA. Não se dão as condições nem as garantias para aquilo. Por outra parte, deste modo, por mais boa vontade que a gente sabe que os países irmãos têm, com esta medida se tirou Honduras de foco na mídia internacional, e o resultado é que ficamos sem defesa. Tem uma conspiração para liquidar física e moralmente os que estamos de pé, resistindo. Mas seguiremos enfrente, Honduras precisa que construamos um Projeto de Liberdade.

N.R. Uma semana após a realização desta entrevista (19 de julho de 2011), Honduras acordou estremecida pela notícia de que o presidente de transição, Porfirio Lobo Sosa, denunciou que existem planos para assassiná-lo, no âmbito da oligarquia supostamente, por causa de um projeto de lei que cria um imposto para aumentar os sistemas de segurança.


Fonte: http://www.altamiroborges.blogspot.com/

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