17 setembro 2011

IMPRENSA

Jefferson, pai do “Mensalão”, nega tudo – quem vai pedir o teste de paternidade?

publicada quinta-feira, 15/09/2011 às 19:17 e atualizada quinta-feira, 15/09/2011 às 19:58


por Rodrigo Vianna
Foi pelo twitter que recebi a notícia: o @emeluis anunciava (entre irônico e estupefato) que a defesa de Bob Jefferson apresentada ao STF já estava disponível na internet, num site especializado em assuntos jurídicos. Fui olhar, e chamou-me atenção o último parágrafo: “Sobre a acusação do MP, a defesa de Jefferson seguiu o mesmo tom dos demais acusados: é incompleta e faltam provas. Trata-se, segundo a petição, de uma acusação “puramente retórica” e “sem argumentos fáticos”. Não há na acusação, segundo a defesa de Jefferson, nada que prove a existência do mensalão, ou de algum esquema de lavagem de dinheiro para a compra de votos parlamentares.” (grifo meu, RV).
Dividi com os leitores no twiter minha surpresa: ora, se Bob Jefferson (que era o principal denunciante do chamado “Mensalão”) nega que haja provas do referido esquema, então sobra o que? Claro, sobram evidências de caixa 2 na contabilidade petista, e nas estranhas relações com Marcos Valério. Caixa 2 é ilegal.  E deve ser punido. Mas é muito diferente de “Mensalão” -  esquema sistemático de compra de votos no Congresso, como dava a entender Bob Jefferson na tal entrevista à Folha que foi serviu como estopim do escândalo.
Em 2005, a velha imprensa tentou provar que o tal “Mensalão” era “o maior escândalo da história do Brasil”. Franklin Martins era comentarista da Globo. E eu era repórter da Globo em São Paulo. Na redação, era nítido que os comentários de Franklin destoavam da cobertura da emissora – claramente dirigida. A Globo, em suas “reportagens” diárias – jogando de tabelinha com ACM Neto e outros gigantes da moralidade - martelava o “Mensalão” como fato consumado. Aí Franklin entrava no ar e dizia que o “Mensalão” precisava ser “provado”. Foi um dos motivos que levaram Ali Kamel a rifar Franklin no início de 2006 – aquele tormentoso ano em que Lula conseguiria a reeleição.
Foi aquela campanha desenfreada para derrubar Lula em 2005 (e que só não foi adiante porque FHC teve a brilhante idéia de “sangrar” o presidente até a eleição, para evitar o “trauma” de um impeachment)  que levou o deputado Fernando Ferro (PT-PE) a ir à tribuna e cunhar a expressão “Partido da Imprensa” para se referir à máquina que tentou derrubar Lula. Paulo Henrique Amorim aproveitou o discurso de Ferro, e acrescentou “Golpista” à expressão (uma referência histórica ao papel que a mesma imprensa cumprira em 1954, no suicídio de Vargas; em 1961, no veto à posse de Jango, só garantida após a resistência de Brizola com a Legalidade no sul; e  em 1964, com o golpe largamente apoiado pela velha mídia). Assim, nasceu o PIG.
O PIG foi a mãe do “Mensalão”. E Bob Jefferson, o pai. Bob Jefferson agora nega o “Mensalão”. Quem vai pedir o teste de paternidade? A “Folha”, Kamel, ou Diogo Mainardi (o colunista fujão)?
Quando escrevi sobre essas coisas no twitter, recebi da doutora Janice Ascari um puxão de orelha; ela lembrou que todo réu, sempre, nega o crime de que é acusado. Bob, denunciante, é também réu. Por isso, não haveria nada de surpreendente na negativa de Bob. Ele poderia ter negado participação sem negar o esquema. Seria uma forma de evitar a desmoralização. Não o fez.
Juridicamente, a doutora Ascari pode ter razão. Mas politicamente, a negativa de Bob é devastadora. Qual a prova de que o “Mensalão” existiu? A entrevista de Bob a Renata Lo Prete na (sempre ela) “Folha”, em 2005. Bob agora negou o “Mensalão”. Politicamente, fica mais evidente a operação golpista que acompanhei de perto em 2005, e à qual tenho o orgulho de ter resistido nos difíceis dias finais na campanha de 2006 (manobra patrocinada pelo PIG, com ajuda do delegado Bruno - desmascarado num histórico post de Azenha, e numa histórica reportagem de Raimundo Pereira na “CartaCapital”). Tudo isso ocorreu em 2005/2006.
Em 2010, Lula estava muito mais forte. Mas a Globo e seus parceiros ainda tentaram operar no limite da irresponsabilidade: a “bolinha de papel” de Ali Kamel e Molina foi a tentativa de repetir a história e dar a eleição aos tucanos. Mas dessa segunda vez a operação soou como farsa.
Em 2005/2006, a situação foi muito mais séria. Essa história, em detalhes, ainda está por ser melhor contada. Ainda mais agora que Bob – o tenor do “Mensalão” – jogou por terra a encenação.


Fonte: Blog do Rodrigo Vianna (O Escrevinhador)


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Murdoch e o espírito do capitalismo



Por Laurindo Lalo Leal Filho, no sítio Vermelho:

 A falta de leitura dos clássicos nos cursos de comunicação – O Capital, entre eles – obriga-me, muitas vezes, a recorrer a comparações singelas para explicar em palestras para estudantes a formação dos monopólios na mídia.

Preciso, antes de tudo, dessacralizar as empresas de comunicação. Por ingenuidade ou má fé, elas são vistas ou apresentadas apenas como instituições sociais, obscurecendo a natureza capitalista de suas estruturas básicas.

Para romper esse véu ideológico, as comparo com os donos dos velhos armazéns de secos e molhados, sempre de olho na possibilidade de comprar os estabelecimentos dos concorrentes, sonhando com a formação de grandes redes de lojas.

Essa mesma lógica, da acumulação capitalista, tão bem descrita por Marx na sua principal obra, preside a formação dos conglomerados de comunicação. De um jornal isolado, empresários mais audazes e bem relacionados, formam redes que, de locais passam a regionais, nacionais e, hoje, são globais. Exemplo a News Corporation, de Rupert Murdoch.

Alguns países impõem limites internos ao processo de concentração. No entanto, as rápidas e recentes transformações tecnológicas têm facilitado a superação desses obstáculos por empresas globalizadas.

Sons e imagens, emitidos de qualquer parte do planeta, circulam quase sem nenhuma possibilidade de restrições. O que, em princípio, pode parecer um avanço na liberdade de informação e opinião, com o processo de acumulação capitalista, torna-se um retrocesso, na medida em que reduz globalmente os criadores e emissores desses produtos.

Se como no caso dos supermercados os monopólios liquidam com a concorrência nas duas pontas, impondo preços aos produtores e aos consumidores, no caso da mídia as conseqüências são ainda mais graves.

Os bens por ela oferecidos não se esgotam, como qualquer mercadoria, no ato do consumo. Ao venderem valores, hábitos e idéias seus produtos permanecem nos corações e mentes do público por muito tempo depois de consumidos, às vezes por toda a vida.

Se a concentração dá ao dono da rede de supermercados um poder brutal para o enriquecimento econômico, ao empresário da comunicação esse poder é somado e combinado com o que lhe dá a possibilidade de impor a sua visão de mundo ao mundo e nele interferir diretamente. É ainda muito mais brutal.

Exemplo dessa imposição é o da invasão do Iraque pelos Estados Unidos. Mais de 200 editores das empresas de comunicação de Murdoch, espalhadas pelo mundo, foram obrigados a publicar matérias inverídicas justificando o ataque.

Poder político global combinado com uma acumulação de capital tão grande faz com que seus possuidores se sintam senhores do mundo. Não apenas para autorizar bisbilhotagens telefônicas mas para romper com qualquer obstáculo às suas pretensões de seguir ampliando os poderes conquistados.

A crise gerada pela revelação do uso de escutas ilegais pelos jornais de Murdoch permitiu a descoberta de outras práticas, usadas para ampliar ainda mais o seu império. O sonho do magnata australiano de possuir uma rede de televisão no Reino Unido estava prestes a se concretizar.

Num país onde as regras para a concessão de canais abertos são rigorosas e passam por um amplo debate público a empreitada de Murdoch não era fácil. Mas ele encontrou um atalho.

Depois de apoiar o Partido Conservador nas últimas eleições gerais (na anterior havia apoiado o Trabalhista, de Blair), Murdoch se achou no direito de lançar uma nova cartada.

Seus executivos iniciaram contatos diretos com o primeiro ministro David Cameron buscando autorização do governo para comprar por oito bilhões de libras (aproximadamente 20 bilhões de reais) a maior rede de TV por satélite do pais, a BSkyB, com cerca de 10 milhões de assinantes.

O negócio, ao que tudo indica, está suspenso. O que não quer dizer que esteja acabado. A lógica da acumulação é inexorável.

Se há 20 bilhões de reais para serem investidos eles serão, de uma forma ou de outra. Resta saber se Murdoch insistirá no sonho inglês ou buscará ocupação para o seu dinheiro em outras plagas.

As escutas telefônicas realizadas pelos jornais da News Corporation são, sem dúvida, um crime grave. Mas o pensamento único globalizado, produto da acumulação do capital, é um crime ainda mais grave, praticado contra a humanidade.

De positivo, a partir dessas revelações, temos a esperança de que a conversa fiada sobre liberdade de imprensa no capitalismo seja, pelo menos, um pouco mais relativizada.




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Concentração de mídia cresce no mundo





Por Valério Cruz Brittos e Jéssica M. G. Finger, no Observatório da Imprensa:


 As indústrias de comunicação vêm sofrendo profundas mudanças ao longo das últimas décadas, em consonância com as transformações do capitalismo. Novas maneiras de organizá-las vêm garantindo a este mercado outra interface, caracterizada por uma economia de disputas e atuações globais. Como consequência, cada vez mais este setor tem maior participação de conglomerados, capazes de produzir sinergias, ao atuarem em diversas mídias, capitalizados, em geral com capitais oriundos de outras áreas de investimento.

Essas novas modalidades operacionais têm sido responsáveis, nas últimas três décadas, por uma reestruturação das dinâmicas dos mercados, estruturados sob a forma de oligopólios cada vez mais concentrados. Trata-se de um problema que não chega a ser uma exceção, mas a classe de estrutura de mercado inerente ao capitalismo, com sérias consequências sobre o processo de decisão do consumidor e, no caso da comunicação, com um efeito mais devastador: de restringir mais ainda o acesso da diversidade à arena miditática.

As fusões & aquisições (F&A) – cujo agregado de recursos econômicos contribuiu para a inovação em geral – propagaram-se a partir da metade da década de 80. No caso dos Estados Unidos, em um só ano, 1985, a ABC foi vendida para a Capital Cities Communication, a NBC foi comprada pela General Electric e Ted Turner quase assumiu o controle da CBS. Durante este decênio e a primeira metade do seguinte, as atividades de F&A ficaram restritas a mercados nacionais, não transpondo barreiras fronteiriças.

News Corporation como exemplo

Contudo, a partir da segunda metade dos anos 1990, os acordos feitos entre empresas de diferentes nacionalidades aumentaram de maneira significativa, abrindo portas para o comércio e a concorrência global. Tomando como exemplo as organizações de radiodifusão, apenas 4,3% dos acordos feitos entre 1983 e 1987 foram realizados entre companhias de nacionalidades diferentes. Já entre 1997 e 2005, esse número cresceu para 16%. O mesmo destino seguiram as telecomunicações, assim como os jornais e as agências de publicidade.

Diversos fatos possibilitaram o surgimento desses novos desenhos empresariais, passíveis de resumo em três acontecimentos-chave. Os dois primeiros envolvem diretamente os Estados Unidos: a) a decisão do Federal Communications Commission (FCC), que em 1985 permitiu que uma empresa passasse a possuir, por direito, 12 canais de televisão de uma só vez; b) a Lei das Telecomunicações de 1996, que derrubou as barreiras do mercado norte-americano para a atuação estrangeira, resultando em uma enorme onda de F&A. O terceiro episódio vai além dos EUA e refere-se aos acordos para o setor de telecomunicações propostos pela Organização Mundial do Comércio (OMC) em 1997, os quais também permitiram abrir as portas para o livre comércio entre os países membros.

Todos esses eventos, frutos de políticas neoliberais, resultaram na privatização e desregulamentação do setor, possibilitando às empresas tomar uma orientação política regida pelo e para o mercado, com o primado pelo lucro, acima de tudo, sem grande tutela pública.

Fruto do crescente movimento de F&A ao redor do globo, a gigantesca News Corporation, propriedade do empresário e magnata Rupert Murdoch, serve como bom exemplo para se discutir os oligopólios mundiais e suas consequências. A companhia tem sob seu domínio dezenas de jornais, revistas, estúdios de TV e cinema, companhias de broadcasting, televisões por satélite e sistemas de cabo, entre outros. Suas principais atividades estão entre os três maiores países de língua inglesa, Austrália, EUA e Inglaterra.

Império de oligopólios

O império de Murdoch – presente em toda Europa, na América Latina e Ásia – mostra como as políticas de desregulamentação da FCC serviram ao seu propósito de um “livre mercado”, mesmo que claramente apenas indivíduos ou empresas com um alto poder aquisitivo tenham recursos para entrar no jogo com alguma garantia de êxito. Afinal, mercado livre não significa resultado positivo para a sociedade: ao contrário, auto-regulado, fica restrito aos objetivos econômicos de seus controladores, desligado de compromisso social.

Em 1985, com carta branca garantida pela nova regulação da FCC, Murdoch, cidadão australiano naturalizado norte-americano, tomou controle do estúdio de televisão estadunidense Fox TV que, por seus esforços, foi lançada ao mercado como concorrente direto das outras três estações televisivas do país, CBS, NBC e ABC. A iniciativa foi bem sucedida e, após a aquisição de um conjunto de emissoras da Metromedia, aprovada pela FCC em 1986, surgiu a Fox, desde então a quarta maior rede de TV aberta dos EUA.

Entre centenas de aquisições que a News Corporation realizou, uma tentativa recente vale ser reportada. No ano passado, Murdoch iniciou uma odisseia para adquirir a BSkyB, empresa da qual já possuía 31,9% das ações. Durante as negociações, que já duravam um ano, veio à tona um escândalo, que partiu de um dos jornais de propriedade da News Corp, o News of the World. Seus editores e jornalistas vinham praticando escuta ilegal e grampeamento de telefones. O jornal fechou e o acordo não resistiu, sendo Murdoch forçado a desistir.

Questões como essa trazem à tona o problema deste modelo empresarial concentrado e concentrador. Suas ações e objetivos colocam-se acima das constituições e da capacidade de governança dos países, afetando inclusive a democracia, visto que o poder da mídia concentra-se, cada vez mais, em menos mãos. Se, por um lado, prolifera a inovação tecnológica e informacional, por outro cria-se um império de oligopólios, onde tudo é possível, como em uma disputa de titãs, na qual nem mesmo o Estado consegue intervir.





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