17 setembro 2011

BRASIL

Projetos golpeiam leis trabalhistas




Por Antônio Augusto de Queiroz, no sítio do Diap:

 Sob a lógica de redução dos encargos trabalhistas, parlamentares vinculados ao setor empresarial estão investindo sobre direitos dos trabalhadores. São exemplos disto, entre outros, os projetos de lei (PL) 948/2011 e 951/2011, apresentados respectivamente pelos deputados Laércio Oliveira (PR-SE) e Júlio Delgado (PSB-MG).

O primeiro, PL 948, sob relatoria do deputado Sandro Mabel (PR-GO) na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, tem por finalidade impedir que o empregado demitido possa reclamar na Justiça do Trabalho qualquer direito trabalhista que não tenha sido expressamente ressalvado no momento da rescisão contratual.

O texto, além de tentar valer-se da desatenção, ingenuidade ou desinformação do empregado, representa uma afronta ao princípio prescricional, previsto no inciso XXIX do artigo 7º da Constituição, segundo o qual é direito do trabalhador propor "ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho".

O segundo projeto, o PL 951, sob relatoria do deputado Jorge Corte Real (PTB-PE) na Comissão de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, destina-se a criar um simples trabalhista para as pequenas e microempresas, com a redução dos direitos trabalhistas dos empregados desses estabelecimentos.

A proposta consiste em flexibilizar os direitos trabalhistas dos empregados de pequenas e microempresas, com redução dos encargos e custos da contratação, mediante acordo ou convenção coletiva específica ou, ainda, por negociação direta entre empregado e empregador, que terão prevalência sobre qualquer norma legal.

O projeto, objetivamente, pretende incluir os direitos trabalhistas entre os incentivos previstos no artigo 179 da Constituição, segundo o qual "A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei."

O dispositivo constitucional em questão, entretanto, não tem esse alcance. Ele foi concebido para permitir aos entes federativos proporcionarem tratamento jurídico diferenciado voltado para a simplificação das obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, sem qualquer menção ou margem para alcançar os direitos trabalhistas, que estão protegidos como cláusula pétrea no artigo 7º, do titulo II da Constituição, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais.

Portanto, querer extrapolar os comandos constitucionais de proteção às empresas de pequeno porte, especialmente o inciso IX do artigo 170, que recomenda "tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País", e o artigo 179, para incluir os direitos trabalhistas é forçar a barra.

Essa tentativa, aliás, não é original. Nos governos FHC e Lula houve tentativas idênticas, no primeiro caso no momento de criação do estatuto das pequeno e microempresas e, no segundo, quando da votação da lei do Supersimples, oportunidade em que a equipe econômica pressionou sem sucesso o então relator, deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), para reduzir os direitos trabalhistas.

O movimento sindical deve ficar atento. Os setores interessados na flexibilização estão se rearticulando, com uma série de iniciativas, como a rejeição da convenção 158 da OIT, a aprovação do projeto de terceirização e a proposta (PL 1.463/11) de criação do Código de Trabalho, além da apresentação dos projetos aqui comentados, ambos sob relatorias de lideranças sindicais patronais com mandato na Câmara.




Fonte: http://www.altamiroborges.blogspot.com/


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Escravidão na Cutrale não é manchete



Por Altamiro Borges

 Não saiu no Jornal Nacional da TV Globo. Também não foi capa nos jornalões. A Folha publicou uma notinha bem tímida. Mas o Ministério Público do Trabalho flagrou ontem na Cutrale de Itatinga, interior paulista, 62 trabalhadores em condições irregulares.

Quando o MST ocupa as terras griladas pela empresa, uma das maiores produtoras de suco de laranja do mundo, é o maior escândalo. Já quando a fiscalização encontra trabalhadores escravizados na Cutrale, a mídia “privada” se finge de morta!

32 numa única residência

O Ministério Público do Trabalho visitou o local e constatou que 32 trabalhadores habitavam numa única residência. “Ela estava em péssimas condições de higiene e conforto, sem vestiários, cozinha, ventilação e iluminação adequada. Além disso, os trabalhadores pagavam R$ 24,00 por dia pela alimentação e recebiam salários de apenas R$ 620”, registra a Radioagência NP.

Os próprios trabalhadores, que atuavam na colheita de laranja, denunciaram a situação ao Ministério Público do Trabalho (MPT). Oriundos de Sergipe e Maranhão, eles chegaram na região em setembro passado, “já endividados pelas despesas com transporte e alimentação”. Segundo o procurador da Justiça do Trabalho, Luis Henrique Rafael, a Cutrale é responsável pela grave situação.

Responsável pela condição degradante

“Quando ela faz a contração de trabalhadores de outros estados, existe uma instrução normativa do Ministério do Trabalho obrigando que o registro da carteira seja feito no estado de origem do funcionário. Isso garante que os trabalhadores, durante a viagem, sejam protegidos pelo contrato de trabalho e tenham benefícios se acontecer algum acidente. Porém, ela aceitou essa situação e não fiscalizou. Por isso, é responsável pelas condições degradantes do alojamento”.

Após o flagrante, a empresa se comprometeu a indenizar os trabalhadores. Mas é bom lembrar que a Cutrale, tão protegida pela mídia comercial, é reincidente em vários crimes. Entre outras maracutaias, ela sofre processo na Justiça por ocupar, ilegalmente, 2,6 mil hectares de terras da União no município de Iaras (SP), também no interior de São Paulo.





Fonte: http://www.altamiroborges.blogspot.com/



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Os equívocos do voto distrital


Vamos imaginar que, por qualquer razão, a campanha que a direita brasileira move por meio de seus jornais e revistas em favor do voto distrital dê certo. E que, com a mesma irresponsabilidade com que tem sido propagandeado, o Congresso resolva aprová-lo.

As pessoas que foram convencidas pelos argumentos de políticos, jornalistas e intelectuais conservadores se sentiriam bem. Para elas, com o fim do voto proporcional, teríamos dado um grande passo para consertar as deficiências de nossa democracia.

Estariam enganadas.

Acreditaram que ele não tinha contraindicações e que era simples implantá-lo. Mas a verdade é que o voto distrital traz vários problemas e é difícil adaptá-lo à nossa cultura.

A primeira pergunta é quantitativa: quantos distritos haveria no Brasil? Alguns dizem que seriam 513, o número de deputados federais existentes. Mas, nas eleições para as Assembleias, qual seria o número? Os deputados estaduais são 1.059 (incluídos os distritais). Haveria municípios agrupados na eleição para a Câmara, mas separados na estadual?

Teríamos, também, de concordar com o tamanho dos distritos. No ano passado, éramos 135,8 milhões de eleitores. Se fossem 513 distritos, a média seria de perto de 265 mil eleitores em cada um.

Nos países com voto distrital, a praxe é fazer essa conta, aplicando o princípio de “cada cabeça, um voto”. Quando são federativos (como os Estados Unidos), procura-se, no entanto, corrigir a eventual falta de representação dos estados pequenos, assegurando que tenham ao menos um distrito.


Aplicando o princípio e supondo que ficaríamos com 513 distritos (pois seria pouco provável que a sociedade apoiasse o aumento do número de deputados), todos os estados teriam sua representação diminuída, à exceção de São Paulo (onde ela quase dobraria).

Há que pensar no que são distritos com 265 mil eleitores. Como imaginar que neles haveria a propalada proximidade entre representantes e representados? Alguém pensa, a sério, que deputados eleitos com base em territórios tão complexos e heterogêneos estariam “perto” dos eleitores? Que aumentaria a possibilidade de serem cobrados?

E onde começariam e terminariam os distritos recém-criados? O bairro tal ficaria junto de quais outros? A cidade A seria do distrito X ou Y? As microrregiões hoje reconhecidas administrativamente seriam mantidas?

Essas perguntas estão na base do que os norte-americanos chamam de apportionment: a necessidade de calcular e, periodicamente, recalcular o número de distritos dos estados e a combinação de localidades dentro deles, de forma a que reflitam as mudanças demográficas.

É um processo cheio de complicações e possibilidades de manipulação. A ponto de terem inventado uma palavra para designar a procura de vantagens individuais ou partidárias ao fazê-lo. O nome é gerrymandering e ocorre com frequência por lá.


Se, então, o Congresso aprovasse o voto distrital no Brasil, o que teríamos de imediato seriam novos problemas. Em vez de consertar nossos males, criaríamos outros.

Tudo valeria a pena se houvesse certeza da superioridade do voto distrital em relação ao proporcional. Nos aborreceríamos até chegar a ele, mas o resultado compensaria.

Não é, no entanto, o caso.

Por várias razões, o voto distrital está longe de ser uma solução. Nele, é possível que quase a metade de uma região, estado ou do País fique sem representação. E é certo que, para as minorias étnicas, religiosas, culturais, de gênero ou opinião, entre outras, seria quase impossível eleger deputados.

A disputa de votos baseados na territorialidade faz com que o conteúdo político das candidaturas fique em plano secundário. O que predomina é a discussão dos “problemas concretos” e de quem tem “mais capacidade” de resolvê-los. O típico eleito é (e se orgulha disso) um “despachante de luxo”, um parlamentar paroquial que vai para Brasília com a ideia de que só deve explicações à sua região. Isso já existe hoje, e se generalizaria e se intensificaria.

No voto distrital, os candidatos não precisam de seu partido para se eleger. Só sua votação conta. Sentem-se, portanto, donos exclusivos de “seus” votos. Estar filiado a determinado partido chega a ser irrelevante.
Complicado, sujeito a manipulações, o voto distrital é ruim na representação de minorias, leva à falta de ideologia na política e enfraquece os partidos.

Talvez sejam seus problemas que atraiam a direita. Ou, então, ela só quer mesmo é posar de quem tem a solução para o Brasil (mesmo que saiba que é conversa fiada). •


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