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Pedro Estevam Serrano, na Revista CartaCapital
A separação de Poderes em nossa Constituição é clausula pétrea. Não existe emenda constitucional tendente a aboli-la.
A expressão “tendente a abolir” significa não apenas que é inconstitucional a emenda que pretenda a extinção da separação como também a que altere o modelo especifico de separação adotado pela Constituição de 1988.
Diversos são os modelos de separação de Poderes existentes no mundo. Há os que dão preponderância ao Legislativo, como no caso dos parlamentarismos; em outros, o Executivo – ou mesmo o Judiciário e as Cortes Constitucionais – tem preponderância. Nossa Constituição não adotou nenhum deles. Promoveu um mix pelo qual, dentre outras características, cabe ao Legislativo a inovação primária da ordem jurídica criando originariamente direitos e obrigações por meio da lei e ao STF o controle de constitucionalidade das leis e emendas constitucionais com definitividade no sistema.
Nossa Constituição, no inciso III do paragrafo 4º do seu artigo 60 tornou intangível e imutável tal modelo. Só pode mudar por uma nova Constituinte.
Nos meios de comunicação, durante a semana, tivemos a oportunidade de constatar uma “queda de braço” entre Legislativo e Judiciário. A meu ver, nenhum lado tem razão integral.
De um lado, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou a chamada PEC 33. O texto pretende submeter à aprovação do Congresso as decisões do STF pela inconstitucionalidade de leis e emendas. Óbvia inconstitucionalidade, ofensiva ao modelo de separação de poderes, e destruidora da principal competência do STF no sistema: interpretar com definitividade a Constituição.
Ao submeter a decisão do Supremo ao crivo do Congresso, a PEC 33 retira da Corte a definitividade de suas interpretações constitucionais no controle de constitucionalidade, a sua principal função e poder como Corte Constitucional. Isso implicaria em seu inconstitucional esvaziamento.
De outro lado, nos mesmos jornais – algumas páginas à frente – vimos notícias da nova decisão liminar do STF, emitida com base em decisões recentes daquela Corte, impedindo a tramitação de projeto legislativo tendo por fundamento a inconstitucionalidade no seu mérito.
Realiza-se aí uma espécie de controle judicial preventivo de constitucionalidade. Isso, a nosso ver, não tem sentido em nosso sistema.
Nossa Constituição autoriza o controle abstrato de constitucionalidade apenas pela via adequada, qual seja a da Ação Direta proposta pelo procurador-geral da Republica ou outro legitimado específico, não por mandado de segurança individual, bem como só em relação a leis e emendas já aprovadas e promulgadas e não quanto a meros projetos e proposituras apresentadas no âmbito interno do Legislativo.
Promover medidas de impedimento de tramitação de projetos legislativos por conta de seu mérito constitucional, e não por aspectos formais da própria tramitação, em essência, é impedir o livre exercício da função parlamentar, que se realiza através da apresentação e debates de tais projetos.
Ao agir assim o STF, a título de defender a Constituição, invade a competência do Parlamento, fere a liberdade parlamentar e – o que me parece mais relevante – restringe indevidamente a soberania popular.
Ambos os Poderes, portanto, ferem com tais medidas a separação de Poderes ao intervir na esfera de competência alheia procurando drenar em proveito próprio a esfera legítima de poder do outro.
É, portanto, benvinda a decisão do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), de suspender a tramitação da PEC 33. O momento exige equilíbrio e espirito público dos mandatários e togados envolvidos. Ambos os Poderes devem promover medidas de contenção interna para evitar uma crise que tem apresentado pouca maturidade democrática
Na queda de braço entre Legislativo e STF, saem feridas a nossa Constituição, a democracia e nossa cidadania.
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