06 abril 2012

DESENVOLVIMENTO E EDUCAÇÃO

Pensar (livremente) o Brasil




Por Ciro Gomes (*)













Neste espaço tentarei desenvolver uma compreensão holista do Brasil, tal qual o vejo. Passo por passo, submeterei meu entendimento político e econômico de nosso Pais à inteligência dos que me derem sua paciente leitura. Por momentos refletirei sobre questões estruturais. Em outros, chamarei a conjuntura a demonstrar o que penso.

No Brasil, todas as melhores energias se dispersam nas conjunturas, diz Ciro Gomes. Foto: Galeria de Patricia Oliveira/Flickr
No Brasil, todas as melhores energias se dispersam nas conjunturas. Ao pensamento estratégico pouco, ou quase nada, se dedica. Entre os tomadores de decisão na vida pública, então, esta constatação beira o trágico! Há explicação compreensível pra isto. O que não há é justificativa para a persistência deste colapso institucional crônico; para este apagão de idéias, ou para a morte da audácia, mínima que seja, que se exige daqueles ou daquelas  de quem a sociedade espera e precisa para crer no futuro da Nação.
Dois momentos explicam modernamente este fenômeno: a geração que está operando o País na política ainda é, em larga escala , aquela dos tempos que se sucederam a 1964. Mais precisamente, de Fernando Henrique para cá, é a geração que se opôs ao regime autoritário. Esta geração de gente respeitabilíssima, e a quem o povo brasileiro deve muito, historicamente, padece de um cacoete, entretanto: foi obrigada a reduzir sua compreensão do Brasil a um conjunto de reivindicações de natureza institucional essenciais mas não o bastante: eleições diretas, anistia, constituinte,democracia política, enfim.
Economia política virou assunto proibido em nossas reuniões. O consenso necessário à reinstitucionalização se dissolveria numa frente em que, na reta final, confraternizavam, por exemplo grato, Teotônio Vilela e João Amazonas, Arraes e Quércia, Tasso Jereissati e José Dirceu. Democracia formal e sua agenda uniam, refletir modelos de economia política desunia.
Tudo certo! Certíssimo! Para a hora…
Depois veio o governo Fernando Henrique. À absoluta falta de projeto e, capitaneando o exitosíssimo plano de estabilização econômica, que encerrou 25 anos de superinflação, FHC aderiu à exuberante ideia neoliberal. O mundo se prostara a ela. O gravíssimo buraco em nossas contas externas nos impunha uma submissão à hegemonia ideológica norte-americana enfeitada pelo charme de Bill Clinton. O apetite particular pela reeleição abatia a tradição progressista de FHC. Esta é a segunda fase.
De novo, o Brasil não perdeu propriamente, mas a tática das organizações progressistas do País e mais, do melhor de seu pensamento acadêmico, dos intelectuais, dos artistas, das vanguardas sindicais e estudantis, optou por aceitar a sábia inflexão de Lula e aceitar o adiamento, por assim dizer, do debate sobre nossa estratégia de futuro em nome de avanços possíveis que evitassem os riscos reais de enfrentamento do pacto reacionário vigente no seu centro.
Debater modelo de desenvolvimento poderia dissolver, num primeiro momento, a vitória eleitoral; no segundo e terceiro momentos, atrapalhar o avanço de melhorias concretas na vida do povo, agora! E mais uma vez nos vemos como Nação, levados a dar valor definitivo à comparação do que temos hoje em comparação com o passado. Como se essa fosse a tarefa definitiva que nos toca. Não é!

Não há dúvida em defender a tática de Lula, seu legado, os valores que impôs ao Estado Nacional Brasileiro. Foto: Yuri Cor. Foto: Yuri Cortez/AFP
Tudo tem melhorado em nosso País. Concretamente. O desemprego caiu, a participação dos salários na renda nacional aumentou, as políticas sociais compensatórias atingiram níveis inéditos, o poder de compra do salário mínimo é o maior da história, políticas afirmativas acenam concretudes para estudantes pobres, para quilombolas, negros, mulheres, agricultura familiar. Ações tópicas recuperaram de forma expressiva a indústria naval e a nova orientação pública deu-nos protagonismo global em petróleo. Não há dúvida em defender a tática de Lula, seu legado, os valores que impôs ao Estado Nacional Brasileiro.
Nosso País desfruta hoje de uma presença internacional nunca vivida modernamente. Não só porque temos reservas cambiais em nível jamais experimentado, mas porque politicamente jogamos o jogo internacional sem vassalagens e subalternidades que nos encheram de vergonha em vários momentos recentes, inclusive.
Quer dizer então que agora, desta vez por nosso lado, anunciaremos que a história acabou, como dizia o sub intelectual guru modista do neoliberalismo, Fukuyama?
Penso comovidamente que não! Se compararmos o Brasil de hoje com o passado das últimas 3 décadas, tudo está melhorando. Mas e se compararmos o Brasil com os países que dispõem de condições semelhantes? Pior: e se perguntarmos para onde estamos indo em 10, 20, 30 anos, alguém sabe dizer?
Crescer e parar a cada 3 anos é tudo que temos para nossos 60 milhões de pobres? Pior, crescer em taxas menores que a soma dos ganhos de produtividade – que substituem gente por máquinas – e da chegada de cerca de um milhão e meio de jovens por ano ao mercado de trabalho é mesmo o máximo que podemos aspirar coletivamente?
Dá pra crer que, com os atuais e crescentes déficits nas contas externas, não estaremos daqui a pouco revendo o filme inglório de crises externas que nos atolaram por décadas inteiras?
Nada devemos fazer em relação ao fato de que temos déficit de gigantescos 100 bilhões de dólares no comércio externo, se olharmos apenas as trocas de manufaturados?
A conta de nossas aspirações de consumo de massa será sustentável se aceitarmos passivamente o que a divisão internacional do trabalho deixa pra nós: produtores decommodities de baixo ou nenhum valor agregado?
Temos algum futuro com a educação que temos? É minimamente responsável darmos a quem não tem plano de saúde privado a saúde pública indigna que oferecemos a nosso povo?
Apos 32 anos de experiência na vida pública brasileira, aprendi pelo menos que o céu não é perto. Sei que não é fácil nem trivial encaminhar saída factível pra esta encalacrada.
Mas aprendi também que é possível avançarmos muito mais profundamente e muito mais velozmente. Já experimentei algumas vezes o milagre da política feita com largueza, amor verdadeiro ao povo, competência, seriedade e audácia!
E as condições hoje são, em parte, muito melhores que jamais foram em tempos modernos.
É sobre o que escreverei neste espaço.

*CIRO GOMES – deputado estadual duas vezes, prefeito de Fortaleza, governador do Estado do Ceará, ministro da Fazenda de Itamar Franco, candidato a presidente da República duas vezes, ministro da Integração Nacional de Lula, deputado federal mais votado proporcionalmente do País.
(Novo colunista da Revista CartaCapital)



ESTÃO ACABANDO COM O MAGISTÉRIO


Por Aurélio Munhoz (*)


A mais nobre das profissões no rol das gloriosas ocupações que integram o universo da Educação está a um passo de entrar em colapso. O magistério nunca esteve tão desmotivado e nem nunca foi tão vilipendiado como tem sido na 6ª maior economia do planeta.

Não que o drama da classe seja novidade. Professor é desrespeitado desde sempre. Mas esqueçamos as barbaridades cometidas contra o magistério no passado para nos concentrar em apenas um dos problemas centrais da categoria no Brasil de hoje: os baixos salários dos professores.

Foto: Galeria de JD Hancock/Flickr
O novo piso do magistério, anunciado no mês passado pelo MEC (Ministério da Educação), recomenda aos estados e municípios pagar um salário mensal de 1.451 reais aos professores por um regime de 40 horas semanais de trabalho. Note-se que este valor é apenas uma recomendação. Não uma exigência.
Mesmo sendo baixo para uma categoria desta importância, o piso proposto é inatingível à grande maioria das 5,5 mil prefeituras brasileiras.
Levantamento divulgado em março no Paraná, estado onde o cenário de crise da Educação é menor, revelou um dado assustador: 51% dos 399 municípios do Estado já concederam reajustes salariais ao magistério em 2012.
Mesmo assim, não atingiram o valor. E o quadro deve piorar em 2013. Primeiro, devido à insuficiência das receitas das prefeituras. Depois, em função do efeito cascata que a correção do piso acarreta sobre as folhas de pagamento dos governos municipais devido à necessidade de repasse do valor aos professores aposentados e a todos os beneficiados pelos Planos de Cargos e Salários do Magistério – fato que, aliás, deve obrigá-los a superar o limite dos 52% de comprometimento de sua receita corrente líquida com pessoal, fixados pela LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).
Em estados mais pobres, o quadro é ainda pior. Seus governadores podem pedir ajuda à União para complementar os valores que as prefeituras pagam até atingir o piso. Mas apenas 1.756 municípios de nove estados do Norte e Nordeste (AL, AM, BA, CE, MA, PA, PB, PE e PI) que recebem recursos do governo por meio do Fundeb (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização do Magistério) têm este direito garantido. Os demais penam em tirar da cartola soluções financeiras mágicas para honrar as exigências previstas na Lei do Piso.
Esta é uma das razões pelas quais, como denunciam os prefeitos, um dos pilares do problema é a insuficiência dos recursos para o financiamento da Educação. De acordo com o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, de cada 1 real arrecadado em impostos pelo Brasil, 57 centavos ficam com a União e apenas 18 centavos, com os municípios.
Isto não significa que os municípios não tenham culpa pelos baixos vencimentos pagos aos professores, mas que a política salarial do magistério não pode ser tratada apenas como uma questão econômica e de responsabilidade apenas das prefeituras. Há um componente fortemente político na solução dos baixos salários dos professores, que passa por uma ampla reforma tributária – seguida de uma distribuição mais justa de receitas entre os Entes Federados – para garantir o custeio dos aumentos de vencimentos que os professores merecem.
Mas o caos do magistério é extremamente grave por outra razão – e é neste aspecto que reside o eixo deste artigo. É que a consequeência direta do descaso imposto ao magistério é o desinteresse dos jovens pela carreira e a fuga dos profissionais que já atuam na área para outras atividades, mais rentáveis e menos desgastantes.
Os dados justificam esta preocupação. Estudo encomendado pela Fundação Victor Civita à Fundação Carlos Chagas revelou que somente 2% dos estudantes do ensino médio têm como primeira opção no vestibular cursos ligados ao magistério.
E isto não é tudo.
De acordo com o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), entre 2001 e 2006, o número de cursos de licenciatura cresceu 65%; o de matrículas, apenas 39%. As conseqüências do problema são palpáveis: ainda segundo o Inep, considerando-se apenas o Ensino Médio e as séries finais do Ensino Fundamental, o déficit de professores com formação adequada passa dos 710 mil no Brasil todo.
Como se percebe, a degradação das condições de vida do magistério é muito mais que a degeneração de uma categoria profissional. É sinal da grave crise enfrentada pela instituição Educação.
E não se diga que a culpa pelo problema é apenas dos governantes e legisladores que prometem – e nunca cumprem – posicionar a Educação como sua prioridade. A imprensa, o setor privado e a sociedade adotam rigorosamente a mesma atitude.
A mídia porque, ao invés de promover um debate sério e profundo sobre a Educação, prefere concentrar seu poder de fogo na divulgação sistemática da mediocridade e da cretinice, classificadas de notícias. “Notícias” que agradam ao andar de baixo mas que, acima de tudo, rendem mais reais porque possuem perfil marcado por apelo supostamente popular – futebol, sexo, escândalos, criminalidade e as costumeiras idiotices envolvendo celebridades midiáticas.
O setor privado porque, embora se defina como de vanguarda no ensino, guardadas as exceções de sempre, paga aos seus professores menos que a grande maioria dos profissionais com formação universitária e lhes oferece condições de trabalho nem sempre dignas.  Com a diferença de que, pela pressão da lógica capitalista, cobra deles muito mais resultados que no setor público.
A sociedade também é responsável pelo problema. Ao invés de enfrentar este cenário com a seriedade que o tema merece, intensificando as cobranças tanto dos agentes públicos quanto dos privados, prefere desestimular seus filhos a seguir a profissão, rendendo-se à lógica pragmática do capital. Ou apenas se omitir do processo, quando entrega às escolas o ingrato papel (que é seu) de educar os próprios filhos.
O Brasil, que sonha em ser alçado ao seleto rol dos países desenvolvidos, está acabando com a carreira do magistério. Por analogia, está comprometendo seriamente a Educação e, o que é pior, o futuro que estamos reservando aos nossos descendentes. Triste que seja assim.

*Aurélio Munhoz é jornalista, sociólogo, consultor em Comunicação e presidente da ONG Pense Bicho. Pós-graduado em Sociologia Política e em Gestão da Comunicação, foi repórter, editor e colunista na imprensa do Paraná.


 Fonte: www.cartacapital.com.br 



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