Infância erotizada: a menina-mulher-
objeto
Da CartaCapital
Andar pela casa com os sapatos de salto alto da mãe, colocar seus brincos e pulseiras, batom e perfume… Que menina nunca fez isso? Que menina não quis vestir os signos da mulher adulta e imitá-la? É assim que crescemos, nos espelhando nos outros; buscando, por meio dos gestos copiados, um modelo a seguir, uma orientação para ser. A mola mestra da vida está em seguir exemplos. Fazemos isso com pais e mães, mas também com artistas, professores, enfim, com aqueles que chamam a nossa atenção e provocam o nosso interesse.
Mesmo já adultos, são os outros que nos inspiram e que imitamos: nos vestimos como se vestem os profissionais da nossa área, por exemplo. Agimos e falamos como eles, frequentamos os mesmos lugares e adotamos para nós os fins e valores que eles têm.
Portanto, brincar de ser adulto, sob essa ótica, não só é algo corriqueiro para as crianças como também esperado. Não nos causa estranhamento desde que, nesse terreno, não adentre nenhum toque de sexualidade, como no caso das fotos da menina de 10 anos, Thylane Blondeau, para o mundo da moda. Ensaio de modelo e de que mais?
A mim, particularmente, as fotos incomodaram por terem um toque bizarro. A sexualidade antecipada de Thylane é uma fantasia que ela enverga como se fosse sua mais original realidade. Uma sexualidade, ao mesmo tempo, postiça e natural. Sem dúvidas, precoce. Fruta verde colhida cedo demais.
Fiquei me perguntando, ao olhar as fotos, o que tudo aquilo significaria para a própria Thylane. E se ela entenderia os olhares que certamente a contemplariam. Compreenderia o desejo sexual? Saberia decodificar e lidar com a pedofilia? Saberia o significado de ser criança-mulher-objeto? Puro produto de consumo?
E a anorexia? Saberia que é uma doença e não um padrão estético? Nas fotos, seus bracinhos compridos parecem modelados por ela. Seu corpo todo controlado pelos critérios do mundo da moda: a escassez.
Penso que não só o corpo, mas toda sua vida deve ser parametrada pelas necessidades e ritmos da carreira escolhida (não -certamente por ela): horários de dormir e acordar, alimentos que consumir, férias, tempo para a escola, brincadeiras, companhias, interesses, objetivos, sentido da vida, enfim.
Temo que Thylane construa sua identidade a partir de uma circunstância de trabalho. E de uma circunstância que a condiciona a ser corpo em serventia, principalmente para os interesses anônimos do consumo. Seria uma identidade recolhida da sua condição prematura de mercadoria: sem vontade própria nem destino pessoal. Uma identidade a serviço do desejo (do outro), dos interesses (do outro), da admiração (do outro), da cobiça (do outro)…
As “Thylanes” da moda são meras imagens vestidas de erotismo e vendidas como tal. Mas, se o mercado da moda chega a tanto, é porque recebe da sociedade seu consentimento. Nessas pequenas modelos se apresentam as duas consignações mais presentes em nossa sociedade: sexualidade e juventude. A elas, de um modo ou de outro, todos nos curvamos e por elas somos atingidos.
Juventude estendida
A sexualidade tem sido a exigência capital para quase todas as situações. Ela substitui o amor, a honra, a inteligência, a honestidade, o interesse pelo bem comum… E é requisito para a conquista de empregos, namoros e casamentos, autoestima, posição social etc. No dia a dia, são essas convocações da sexualidade que nos fazem frequentar academias, fazer dietas, nos equilibrar em saltos desconfortáveis e danosos, escolher o estilo das roupas. O insuportável é não ser (sexualmente) desejável.
A juventude tem sido o que rege a busca desenfreada pelas plásticas. Aos 30 anos já são muitos os que recorrem a ela, não para corrigir imperfeições, mas para esconder os primeiros sinais da idade. O estilo do vestuário é todo determinado pelo gosto juvenil e os tamanhos pautados por essa faixa etária.
A sexualidade tem sido a exigência capital para quase todas as situações. Ela substitui o amor, a honra, a inteligência, a honestidade, o interesse pelo bem comum… E é requisito para a conquista de empregos, namoros e casamentos, autoestima, posição social etc. No dia a dia, são essas convocações da sexualidade que nos fazem frequentar academias, fazer dietas, nos equilibrar em saltos desconfortáveis e danosos, escolher o estilo das roupas. O insuportável é não ser (sexualmente) desejável.
A juventude tem sido o que rege a busca desenfreada pelas plásticas. Aos 30 anos já são muitos os que recorrem a ela, não para corrigir imperfeições, mas para esconder os primeiros sinais da idade. O estilo do vestuário é todo determinado pelo gosto juvenil e os tamanhos pautados por essa faixa etária.
A juventude, porém, tem de ser cada vez mais extensa. Ela não é vista como um estiramento para a longevidade, mas em direção à infância. E quanto mais jovem aparentarmos ser, mais desejáveis seremos. Ser desejável é ser jovem, quase uma criança – assim é que sexualidade e juventude se conciliam.
Vestindo a criança com a moda adulta, podemos ter a ilusão de que é a vida adulta que impõe padrões à infância e a obscurece. Mas, se olharmos de perto, e com calma, compreenderemos que é da infância que a vida adulta tem retirado os padrões de seu comportamento e aparência.
Não é apenas a criança que se torna, através da sexualização precoce, adulta mais rapidamente. São os adultos que sonham em não crescer.
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A oposição dos mauricinhos
Por Izaías Almada
Acabo de assistir a um vídeo inacreditável. Gravado por funcionários da Rede Globo de Televisão, o vídeo tem a intenção de criticar a construção de uma hidrelétrica na Amazônia brasileira, a de Belo Monte. Tema polêmico por natureza e que, no atual momento político brasileiro e de crise econômica mundial, poderá crispar ainda mais os debates sobre o assunto.
Antes mesmo de ver a última imagem do vídeo, minha memória transportou-me à lembrança de um amigo que não vejo há anos e que espero, sinceramente, esteja vivo e gozando de boa saúde. O amigo Tatá.
Tatá era filho de um funcionário público do governo federal ainda nos tempos do presidente Juscelino Kubstcheck. A família mudou-se para Brasília, mas o Tatá terminou seus estudos no Rio de Janeiro, onde também eu vivi por dois ou três anos. Foi quando o conheci.
Ser humano pacato, de fala arrastada, não era afeito a polêmicas. Fugia de uma discussão como o diabo da cruz. Não era muito chegado ao trabalho e vivia de biscates como costumava dizer. Quem quisesse encontrar o Tatá era só ir até a sua casa, numa tranquila rua da Tijuca, e lá bater um papo com ele na agradável varanda da casa. Ou mesmo no quintal, onde cuidava de dois cães, um pastor alemão e um dobermann, fiéis defensores do patrimônio familiar.
Nessa época o Tatá era proprietário de um fusca, presente do pai e, em meio à inflação que corroia a economia brasileira, gabava-se de só colocar dez cruzeiros de gasolina no tanque do carro. O preço do combustível poderia subir, mas meu amigo Tatá só gastava seus indefectíveis dez cruzeiros para encher o tanque. Nós, seus amigos, costumávamos rir da situação, mas o Tatá, sempre bem humorado, dizia: “Estão rindo do quê? Esse é o meu jeito de fazer economia”. Na verdade, era uma maneira de economizar, claro, mas um dia o fusca não sairia da garagem, como é óbvio.
Outra história saborosa do Tatá é que ele passava dias na varanda da casa olhando o horizonte, até que recebeu o apelido de Fiscal da Natureza. Pensam que ficou chateado com isso? Nada, incorporou o apelido e até se orgulhava dele, pois dizia que a natureza tinha que ser preservada de seu principal predador, o homem. Como não gostava de discussões, jamais se dispôs e dialogar sobre todos os fatores que envolvem muito dos conceitos de economia e meio ambiente.
O Tatá tinha tudo para se tornar um desses especialistas normalmente entrevistados em programas de televisão, em especial os da Rede Globo de Televisão, palco aonde qualquer argumento, venha ele de onde vier, pode se tornar um indício contra ou a favor de qualquer coisa, por vezes verdadeiras aulas sobre nada ou coisa nenhuma. Como o tal vídeo sobre Belo Monte.
O Eduardo Guimarães no seu Blog da Cidadania ironizou a defesa que os funcionários da emissora fazem dos índios brasileiros, afirmando que provavelmente a maioria daqueles depoentes jamais tenha visto um índio brasileiro de perto. Concordo. Ou talvez tenham visto índios em telenovelas. Ou seria a defesa do Índio do Brasil, aquele que foi candidato a vice do cidadão José Bolinha de Papel Serra?
Ironias à parte, a discussão sobre a hidrelétrica de Belo Monte neste momento, reveste-se de características que para muitos de seus adversários se somam a argumentos de forte coloração oportunista antigovernamental. Se não é esse o verdadeiro motivo, listo aqui alguns temas para o mesmo grupo gravar outros vídeos e com isso demonstrar a sua consciência política, independência e fé nos valores verdadeiramente democráticos:
1 – Um vídeo pela despoluição do Rio Tietê provocada por indústrias às suas margens;
2 – Um vídeo condenando o massacre de índios kaiowa guaranis no Mato Grosso do Sul a soldo de fazendeiros da região;
3 – Um vídeo condenando a vergonhosa corrupção no metrô de São Paulo (leia-se governo do PSDB);
4 – Um vídeo condenando o irresponsável vazamento de petróleo da empresa Chevron no litoral fluminense.
Fica aí a sugestão para os mauricinhos da oposição, que muito me lembraram o Tatá.
Izaías Almada é escritor, dramaturgo e roteirista cinematográfico, É autor, entre outros, dos livros TEATRO DE ARENA, UMA ESTÉTICA DE RESISTÊNCIA, da Boitempo Editorial e VENEZUELA POVO E FORÇAS ARMADAS, Editora Caros Amigos.
Fonte. www.rodrigovianna.com.br
A manjada psicologia de negação da conspiração
Se ganhasse 1 real para cada vez que alguém chama de “teoria conspiratória” alguma análise que faço dizendo que as reiteradas matérias da mídia contra o ministério de Dilma e as tais “marchas contra corrupção” integram plano da direita de se preparar para montar o cavalo do golpe caso ele passe selado, ficaria rico.
Também enriqueceria se ganhasse até mesmo 50 centavos por cada vez que chamam de “teoria conspiratória” quando digo que se Dilma perde tantos ministros “por corrupção”, cedo ou tarde a direita se assanhará e passará a dizer – amparada pelos fatos, ainda que distorcidos – que a culpa seria de quem os nomeou.
A esta altura, porém, provavelmente todo mundo já sabe que o líder do DEM no Senado, Demóstenes Torres (GO), afirmou, nesta sexta-feira (25), que a chamada “faxina” do governo precisa atingir até a presidente Dilma Rousseff, pois, segundo ele, haveria um “conluio” para “roubar o Brasil”.
Isso ocorreu ao fim de uma semana em que blogueiros da direita midiática como Ricardo Noblat ou Augusto Nunes desandaram a chamar a presidente da República de “farsante” e outras gentilezas. E em tom ameaçador.
Palavras do senador do DEM de Goiás: “As denúncias são gravíssimas. Só em uma delas, há um prejuízo de R$ 700 milhões e foi feito por determinação da presidente. Tem de ser feita uma faxina para tirar presidente e não só ministro. Há um conluio para roubar o Brasil“.
Enquanto esse quadro vinha se desenhando, tomado até por certo espanto vi proliferar um outro tipo de discurso róseo sobre a realidade política: seria “bom” para Dilma deixar que seus ministros caiam um a um após cada campanha denuncista da mídia porque a imagem da presidente estaria sendo beneficiada pela tal “faxina”.
Por mais que eu brade que se o cavalo do golpe passar selado a mídia monta, sempre aparece alguém para afirmar que eu estaria sofrendo um processo de confusão mental que me estaria levando a ver fantasmas. E o que é pior: a impressão, até a penúltima queda de ministro, era a de que a própria presidente da República pensava igual.
Agora, tem-se a impressão de que não é mais assim. Mas que já foi, tenho poucas dúvidas. E nem se sabe se ainda não é…
Todavia, para que a direita midiática tente de verdade pôr na rua essa campanha pelo impeachment de Dilma, só falta uma coisa: a popularidade da presidente cair por conta de aumento do desemprego, por exemplo. E mesmo se a sua popularidade não cair, as sessões de economia dos jornais afirmam que a piora no emprego já começa a acontecer.
É óbvio que essas “análises econômicas” da mídia tucana se baseiam em dados ainda incertos e mais em torcida do que em fatos, mas já não dá para descartar a hipótese de que alguma perda real para os trabalhadores e para a sociedade em geral possa, sim, vir ocorrer nos próximos meses.
A grande incógnita é se essa provável redução da atividade econômica terá o condão de provocar queda tal na aprovação da presidente que estimule a direita a investir mais em seus delírios antidemocráticos. Todavia, não nos esqueçamos de que a mídia pode optar por tentar fazer a queda de popularidade acontecer juntando economia, denúncias e protestos de rua.
Sempre digo que o primeiro passo de toda conspiração é tentar caracterizar como “teoria conspiratória” qualquer suspeita de que tal conspiração esteja ocorrendo. Aliás, os estrategistas dão até nome a essa tática: Psicologia da Negação da Conspiração.
Chega a ser irracional que em um país como o Brasil alguém chame de mera “teoria conspiratória” a suspeita de que a direita esteja tendo uma recaída. Ainda mais em um momento geopolítico latino-americano em que forças como as que conspiram no Brasil andaram tentando – e, em certos casos, até conseguiram – derrubar governos de esquerda.
Finalmente, se alguém quiser saber a minha opinião sobre o que o governo Dilma e os seus aliados deveriam fazer em uma situação como essa, tal opinião é a de que a melhor defesa ainda é o ataque. Até porque, a direita midiática e golpista cobraria caro para aceitar um termo de rendição.
¨Fonte: Blog de Eduardo Guimarâes
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