09 junho 2012

POLÍTICA


POLÍTICA E JORNALISMO



Marcha dos Marcianos


Mino Carta, na Revista CartaCapital 



Ícone. Quando O Globo via o golpe como retorno à democracia
Recebi de um leitor a imagem que ilustra este editorial. Primeira página de O Globo pós-golpe de 1964, Presidência interina de Ranieri Mazzilli, enquanto os donos do poder e seus gendarmes decidem o que virá. Treze dias depois o então presidente da Câmara volta a seu assento de congressista e a ditadura é oficialmente instalada. Comentário do amável leitor: eis aí os defensores midiáticos da democracia sem povo.
De fato, acabava de ser desferido um golpe de Estado, mas seus escribas, arautos e trompetistas declamam e sinfonizam a história oposta. O marciano que subitamente descesse à Terra, diante da página de O Globo, e de todas as dos jornalões, acreditaria que o Brasil vivera anos a fio uma ditadura e agora assistia à sua derrubada. Em editorial, nosso colega Roberto Marinho celebrava: “Ressurge a Democracia!”
É o jornalismo nativo em ação, entre a ficção e o sonho, a hipocrisia e a prepotência, sempre na sua função de chapa-branca da casa-grande. Vaticinava a invasão bárbara da marcha da subversão, passou, entretanto, a Marcha da Família, com Deus e pela Liberdade. A Marcha dos Marcianos, me arrisco a dizer. Não é que faltassem entre os marchadores os hipócritas e os prepotentes. A maioria, contudo, era marciana. Só mesmo um alienígena para acreditar em certos, retumbantes contos da carochinha.
Agora, observem. Quarenta e oito anos depois, a Marcha dos Marcianos ainda desfila, sem deixar de arrolar hipócritas e prepotentes. Ocorre que muitas mudanças aconteceram neste tempo longo. Inúteis ferocidades e desmandos a ditadura praticou, para esvair-se em suas próprias contradições enquanto fermentava a fortuna de empreiteiros, banqueiros e barões midiáticos. A pretensa redemocratização teve seus lances de ópera-bufa. Collor foi louvado por abrir os portos, mas cobrou pedágios nunca vistos. O governo tucano quebrou o País três vezes.
Fernando Henrique Cardoso contou de fio a pavio com os aplausos febris da mídia, seduzida pelo príncipe dos sociólogos disposto, oh, surpresa, a encarnar as preferências da reação, impávido ao conduzir a privataria tucana e a comprar congressistas para garantir a reeleição. A vitória de Lula é o divisor de águas, não somente porque um homem dito do povo chegou ao trono, mas também em virtude de um governo que elevou o teor de vida dos setores menos favorecidos da população e ganhou prestígio internacional nunca dantes navegado. A presidenta Dilma garante a continuidade. Para entender melhor, leiam nesta edição a coluna Vox Populi de Marcos Coimbra.
Sim, os bairros ricos, alguns dubaienses, ainda pululam de marcianos, assinantes fiéis e parvos dos jornalões, sem falar das pilhas de Veja que abarrotam no fim de semana os saguões dos seus prédios. Não enxergo, porém, a maioria dos brasileiros debruçados sobre estes textos sagrados e consagrados pela chamada classe A e parte da B. É possível que os da maioria ainda não tenham atingido o grau adequado de consciência da cidadania, de resto incomum em geral, mas estão maciçamente com Dilma como estiveram com Lula. E, quem sabe, pouco se preocupem com os destinos do processo do mensalão.
Leio e ouço até agora que a questão incomoda sobremaneira tanto Lula quanto Dilma, e que a CPI do Cachoeira foi excogitada para desviar as atenções da Nação. CartaCapital entende que é do interesse geral, inclusive do PT, que o julgamento se faça o mais rapidamente possível e que o assunto seja finalmente encerrado por sentença justa.
Insistimos na convicção de que o mensalão, conforme a denúncia original de Roberto Jefferson, como mesada oferecida a um certo número de congressistas, não será provado. Outros crimes, acreditamos, terão prova. Crimes igualmente gravíssimos, uso de caixa 2, lavagem de dinheiro, aquele que o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos recebe do contraventor Cachoeira para defendê-lo. CartaCapital arrisca-se a prever condenações óbvias, e nem tanto, e espera que o conspícuo envolvimento do banqueiro Daniel Dantas venha à tona neste enredo. Difícil imaginar como a mídia se portará ao cabo. Vale acentuar apenas o silêncio que manteve sem pestanejar diante dos “mensalões” tucanos. De todo modo, limpar a mancha convém ao País.



IMPRENSA
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UM POUCO DE HISTÓRIA






Recordar é... às vezes, passar
vergonha


Mauro Malin, no Observatório da Imprensa


O entusiasmo com a eleição de Fernando Collor de Mello passou a fronteira da compostura e explodiu em êxtase na edição do Estado de S. Paulo do dia de sua posse na presidência da República, 15 de março de 1990.
Não se trata de reportagem, mas de um pequeno ensaio sobre a possível – ou esperada – longevidade política de Collor. Ele poderia se reeleger sucessivamente, se reeleger a intervalos, ou se tornar primeiro-ministro num regime parlamentarista, pelo qual já demonstrara várias vezes predileção.
No alto da página (10), o texto diz, ladeando um selo com o mapa do Brasil cortado na diagonal por uma faixa presidencial que lembra a marca dos dois eles da campanha collorida:
“Êxito no governo e votos podem fazer de Collor um presidente dos últimos anos do século 20 e dos primeiros do século 21. Os adversários nem sonham, mas ele poderia se reeleger no ano 2000, quando terá 50 anos, e repetir a façanha em 2010. A juventude ajuda o presidente até em uma possível mudança de regime. No parlamentarismo, ele poderia disputar reeleições seguidas e realizar o sonho de algumas centenas de amigos que querem vê-lo governando o país por pelo menos mais 30 anos.”
De volta ao palco
Se alguém naquele dia dissesse aos editores do Estadãoque o antagonista de Collor, Lula, é que poderia protagonizar tal saga...
O box “Arte e ciência” informa que um ilustrador do jornal levou 20 horas desenhando as três imagens de acordo com orientações de um cirurgião plástico e apoiado no exame de fotos de antepassados de Fernando Collor, como o avô, Lindolfo, o pai, Arnon, e a mãe, Leda. Como se diria em tom blasé, os desenhos antecipatórios saíram à côté de la plaque.
Collor, que submeteu o povo a desastres econômicos e políticos, exibe em 2012 uma estampa bem mais jovem do que a prevista para 2010. E já deixa um sorriso aflorar aqui e ali: ultimamente, até conseguiu uma pontinha no elenco da política nacional. Bem distante do esplendor exibido naquela posse que, vinte e dois anos atrás, eletrizou o Estadão. Mas, como se sabe, ninguém é perfeito.



POLÍTICA    POLÍTICA


Mensalão e CPMI não devem influenciar
eleições, diz professor


Najla Passos
Brasília - Se o eleitorado brasileiro mantiver o pensamento atual, nem o julgamento do processo do mensalão e nem a CPMI do Cachoeira deverão influenciar de forma significativa as eleições municipais deste ano. De acordo com o professor Fabiano Guilherme Santos, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), esses debates interessam apenas a um percentual da elite, considerado parte quase inexpressiva do eleitorado. 

“As pesquisas que temos observado indicam que mensalão e CPMI não são temas que constam no horizonte de preocupações do cidadão comum. Eleições locais envolvem temas locais que afetam diretamente o dia-a-dia das pessoas que convivem nos municípios”, justifica. 

Em relação ao mensalão, ele acredita que uma mudança no cenário ocorrerá se as lideranças petistas, preocupadas com possíveis efeitos do processo, decidirem redimensionar as candidaturas lançadas pela sigla. 

Segundo ele, o PT, maior afetado pelo julgamento, possui grandes planos de ampliação de bases para 2012, o que o colocaria sob grande pressão. “O poder nacional da sigla não tem correspondência no âmbito dos municípios. É o maior partido nacional, com maior número de deputados, segundo maior em senadores, mas o quarto em número de prefeituras”, acrescenta. 

Já a CPMI do Cachoeira, na avaliação de Fabiano Guilherme, não deverá provocar impactos significativos porque não envolve diretamente nomes colocados para a disputa. A não ser, claro, que as investigam exponham novos políticos. “Até agora, talvez o Eduardo Paes [candidato à reeleição pelo PMDB], no Rio de Janeiro, saia um pouco arranhado, por causa das suas relações com o governador Sérgio Cabral, do mesmo partido, que é citado nas investigações. Mas é um caso pontual”, avalia. 

Segundo ele, a variável decisiva no debate pré-eleitoral continua sendo a avaliação das administrações locais. “Desde que a reeleição foi aprovada, a avaliação é o determinante. Se é boa, a tendência é de reeleição ou, no caso do impedimento desta, da eleição de um sucessor. Se a avaliação é ruim e o atual administrador encara a reeleição, o resultado é mais incerto. O cenário mais interessante, contudo, é quando o prefeito não pode se reeleger e não é bem avaliado. Aí, fica totalmente aberto”, avalia. 

Fabiano afirma que este é o caso, por exemplo, da disputa pela prefeitura de São Paulo. “Há uma grande insatisfação com a administração atual, de centro, mas o eleitorado é reconhecidamente conservador. Portanto, o que precisa ser avaliado é se a insatisfação atual é suficiente para fazer decolar uma candidatura de esquerda”, analisa. 

Para o professor, no atual momento, o que mais chama a atenção em relação às campanhas municipais é o desinteresse generalizado dos eleitores. “A campanha ainda não começou, o que comprova que elas ocorrem em período de tempo cada vez mais curto no país. Reflexo, também, da institucionalização do processo democrático brasileiro”, acrescenta. 

Mensalão e CPMI 
O STF confirmou, na quarta (6), que o julgamento do mensalão terá início em 1/8, devendo se estender, pelo menos, até meados de setembro, já na véspera do pleito eleitoral. Pelo cronograma aprovado, serão nove sessões, até 14/8, para as sustentações orais. No primeiro dia, o ministro relator, Joaquim Barbosa, fará a leitura da síntese do relatório. A seguir, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, terá até cinco horas para sua manifestação. 

No dia 2/8, começam as sustentações orais dos 38 réus. Cada advogado terá até 1h para apresentar a defesa no Plenário do STF, com cinco sustentações orais por dia. Em 15/8, deve começar a fase em que serão proferidos os votos dos ministros. Nessa etapa, as sessões serão realizadas três vezes por semana, às segundas, quartas e quintas. Não há previsão de quantas sessões serão necessárias para concluir o julgamento.

A CPMI do Cachoeira, instalada no dia 25/4 para investigar as ligações do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com agentes públicos e privados, ainda patina. Apesar de ter sido considerada uma CPMI diferente, porque partia de investigações já realizadas pela Polícia Federal (PF) e Ministério Público Federal (MPF), enfrentou problemas jurídicos e, principalmente, técnicos para ter acesso aos milhares de documentos levantados. 

Só o STF enviou à CPMI cerca de mil horas de gravações de conversas telefônicas de membros da quadrilha de Cachoeira, feitas com autorização judicial. Além das mais de 15 mil páginas de inquéritos. Até a semana passada, a exigência de senhas digitais para acesso aos documentos sigilosos atrasou o processo de análise. E a maioria dos depoentes, incluindo o contraventor Carlinhos Cachoeira, tem feito uso do direito constitucional de permanecer calado para não produzir provas contra si mesmo.


Fonte: www.cartamaior.com.br 









Democracia e falência da moralidade da direita

A melhor forma de ajudar a recuperação da oposição direitista é transformar a CPI num repto moralista, aproveitando a “onda” anti-Demóstenes (a direita quer se livrar dele), apenas invertendo a mão do que vinha acontecendo contra Lula. Com isso deixa de lado a gravidade do que ocorreu: não apenas atos isolados de corrupção, mas uma conspiração criminosa que usava a luta contra a corrupção para promover uma corrupção ainda maior, a destruição no atacado do espaço político democrático. O artigo é de Tarso Genro.

O episódio envolvendo a conversa do Presidente Lula com o Ministro Gilmar Mendes só adquiriu notoriedade e importância, em função do debate político que atravessa marginalmente a sociedade brasileira. Um debate que se faz através de códigos, de discursos não explícitos, de alusões ligeiras a temas relevantes, que refletem visões sobre o estado e o modelo de desenvolvimento em curso e também sobre os efeitos da crise mundial sobre este modelo. O encontro, na verdade, serviu para rememorar posicionamentos anteriores sobre estes dois temas – Estado e modelo de desenvolvimento - que vem marcando a última década. O resto é manipulação política para, mais uma vez, a grande mídia tentar desgastar Lula, o Presidente que iniciou uma grande virada democrática e social no Brasil, contra as idéias da direita conservadora e do neoliberalismo, hegemônicos no período anterior.

A grande mídia tem composto a agenda política do país em torno da questão da corrupção, como nunca ocorrera. É uma agenda importante e permanente do país e muito se avançou, até agora, com as ações do governo federal na Controladoria Geral da União, com a reorganização e a autonomia investigativa da Polícia Federal e, até mesmo, com algumas denúncias fundadas que saíram na grande imprensa, que ajudaram o Ministério Público nas suas tarefas de fiscalização da legalidade. Mas a transformação da corrupção no assunto político principal da República obedece a outros objetivos: transferir à esquerda que governa todas as mazelas do país, para esconder o fracasso político dos governos anteriores, que não só foram ineptos para governar, mas também incompetentes para atacar a corrupção enraizada no Estado, promovida diretamente por setores da iniciativa privada mancomunados com agentes públicos.

A oposição conservadora de matiz neoliberal, que promoveu as privatizações selvagens, que pretendia privatizar a Petrobras, vender ativos públicos que hoje se configuram como “chaves” para enfrentar a crise - como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil - a mesma oposição que defendia e defende uma política externa de subserviência aos EUA (e não relações de cooperação interdependente com soberania) -esta oposição - tinha adquirido através da campanha midiática, formalmente contra a corrupção, a condição de paradigma da moralidade. 

O processo teve realmente efeito em vastos setores das classes médias, mas o povo de baixa renda, que ganhou com o emprego, com a renda, com o Pronaf, com o Prouni, com os aumentos reais do salário mínimo, com as centenas de obras públicas, com o bolsa-família, não se enganou. O moralismo udenista voltou-se contra a própria direita e a sua saída agora é recuperar o mensalão.

Esta falência “múltipla dos órgãos” oposicionista tem conseqüências negativas e positivas para a democracia. Negativas, porque ajuda a campanha contra os partidos e a esfera da política, contra os políticos em geral que, “na sua maioria, estão aí para roubar”, como disse recentemente um conhecido jornalista. A afirmativa permitiria qualquer um dizer que “todos os jornalistas estão aí para mentir e manipular informações”, o que em ambos os casos não é verdade. 

A falência oposicionista, neste momento, também tem conseqüências positivas, pois o debate sobre ética pública, que está em curso, pode abrir espaços para uma discussão de fundo sobre a questão democrática: debate que também pode incidir sobre a recuperação das funções públicas do Estado e sobre o sistema político vigente. Se esquerda que apóia Lula e Dilma acordarem uma agenda mínima, unitária, sobre a reforma política e, ao mesmo tempo, utilizarem a CPI para fazerem um trabalho sério e profundo, este episódio da CPI pode se tornar um grande evento republicano.

Um trabalho republicano exige que as investigações e os debates na CPI não sejam pautados pela mídia, que eles tenham foco, que não se preocupem com as colorações partidárias dos envolvidos, porque o esquema Cachoeira não é um simples evento de criminalização de políticos, mas é um vasto esquema de dominação de partidos pelo crime organizado. É um esquema de interferência na agenda política da nação, para falsificá-la e colocá-la a serviço da corrupção e do atraso neoliberal, inclusive usando para isso - criminosamente, portanto - a liberdade de imprensa e os órgãos de imprensa que se prestam para isso.

A melhor forma de ajudar a recuperação da oposição direitista é transformar a CPI num repto moralista, aproveitando a “onda” anti-Demóstenes (a direita quer se livrar dele), apenas invertendo a mão do que vinha acontecendo contra Lula. Com isso deixando de lado a gravidade do que ocorreu: não apenas atos isolados de corrupção, mas uma conspiração criminosa que usava a luta contra a corrupção para promover uma corrupção ainda maior, a destruição no atacado do espaço político democrático com falsificação de informações, destruição de reputações, negócios ilegais com bens públicos, articulação com o submundo do crime e aparelhamento do estado para fins ilícitos.

Entendo que a esquerda deve pensar que, em todos os partidos, há pessoas - em maior ou menor número- que gostariam de fazer o Brasil avançar na luta contra a corrupção. O udenismo reacionário é que divide o espaço político, entre a oposição “pura” e os “governos corruptos”. Não podemos estabelecer, agora, em função do caso Demóstenes, uma dialética inversa. Ou seja, os que estão no governo são “puros” e progressistas e os que estão na oposição são “falsos moralistas”.

É óbvio que o próprio olhar sobre a corrupção é derivado do lugar social e político que se olha e, segundo esse lugar, a corrupção será vista com mais, ou menos, leniência. Mas há uma questão democrática preliminar, que pode alargar a influência da esquerda e ampliar a base do governo na sociedade: a corrupção pode ajudar a destruir a democracia e também reduzir, ainda mais, as funções públicas do Estado. Esta questão democrática é que deveria ser considerada pela esquerda para dar um destino exemplar à CPI: dar uma nobre função política à CPI, não transformá-la num mero inquérito policial que, de resto, é o espaço real de construção da persecução criminal. Apurar rigorosamente todos os fatos (que servirão para o Ministério Público cumprir as suas funções) e mostrar que a malha grossa do sistema político, erguido sobre o financiamento privado das campanhas, é o grande alicerce da corrupção no Brasil. 

(*) Governador do Estado do Rio Grande do Sul.







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