Já perto do fim da sessão desta quarta-feira, Cássio Cunha Lima, senador pelo PSDB, admitiu que o governador Agnelo Queiroz conseguiu provar sua inocência em relação ao esquema Cachoeira. Aproveitou, contudo, numa jogada esperta, ou supostamente esperta, para inocentar igualmente Marconi Perillo. Lembrou um advogado que tentasse inocentar Fernandinho Beira-Mar dizendo que não há provas contra Bin Laden. Ou seja, uma coisa não tem nada a ver com outra.
Marconi Perillo era um membro do clube Cachoeira. Era amigo pessoal do bandido (telefonou-lhe pessoalmente para lhe desejar feliz aniversário) e tinha com ele íntimas ligações financeiras (Cachoeira foi preso na casa que Perillo lhe vendeu).
Ficou provado que o esquema Cachoeira tentou derrubar Agnelo. Há gravações que mostram o próprio Cachoeira xingando o governador por não conseguir arrancar o que queria de sua administração, ameaçando botar o “gordinho” (apelido de Demóstenes Torres) e a revista Época para prejudicá-lo. Dias depois Demóstenes subiu à tribuna para pedir o impeachment do governador do Distrito Federal. E a revista Época iniciou ataques sistemáticos contra Agnelo. Ou seja, mais uma vez observamos a mídia aliada ao crime organizado.
O fato é que o depoimento de Agnelo resultou numa estrondosa derrota da oposição. Alguns parlamentares falaram em “xeque-mate” de Agnelo, ao abrir a sessão oferecendo seus sigilos bancários, fiscal e telefônico. Parlamantares do PSDB, DEM e PPS não conseguiram sequer encontrar acusações consistentes contra o governador e começaram a levantar fatos totalmente desconectados do foco da CPI.
Os sigilos de Agnelo já tinham sido quebrados pela Justiça ao final do ano passado, num daqueles escândalos que, agora sabemos, tinham o dedo do esquema Cachoeira-Veja, mas somente os fiscais e bancários. Agnelo acrescentou agora seus sigilos telefônicos e de email.
Com isso, criou-se uma enorme onda nas redes sociais e na própria comissão para quebrar o sigilo de Marconi. O governador de Goiás, vendo o fato consumado, procurou-se adiantar-se e também ofereceu seus sigilos.
Estou muito curioso para ver como a imprensa repercutirá o dia de hoje. Certamente os colunistas continuarão desqualificando a CPI, mas todas acusações que se fazia contra ela já caíram por terra.
Falaram que havia interesse de blindar a Delta. Pois bem, o sigilo nacional da empresa foi quebrado, a Controladoria Geral da União declarou-a inidônea e todos seus contratos com o governo federal
estão disponíveis na internet.
Falaram que havia acordo para blindar governadores: pois bem, ambos foram convocados pela CPI, prestaram esclarecimenots e seus sigilos serão quebrados e suas vidas devassadas.
A CPI engrenou de vez. Pode não ser perfeita, os parlamentares não são investigadores profissionais, e às vezes os que tem mais caráter são os menos incisivos, menos astutos. Na guerra moral que se desenrola em paralelo com as batalhas políticas, veremos que os piores elementos frequentemente se revelam mais fortes, mais desenvoltos, mais inteligentes. Mas desta vez as pessoas estão muito mais atentas. Há um percentual muito maior da população monitorando os debates do que em qualquer outro momento, e ao contrário do que diz a mídia corporativa (que é ligada aos agentes mais reacionários da luta política), a maioria da pessoas está interessada unicamente no aperfeiçoamento das instituições e na derrota da corrupção. E são as pessoas, ou seja, o povo brasileiro, que irão dar a palavra final sobre quem ganha ou perde nesta história. Não serão necessariamente os mais astutos, mas aqueles nos quais a sociedade confiar mais. A democracia brasileira, aos trancos e barrancos, continua avançando. E talvez esta CPI lhe permita dar alguns saltos à frente.
NÓS E O MUNDO
O Brasil diante de dois inimigos
por Mauro Santayana, no JBOline
Em discurso recente no Senado, Pedro Simon advertiu contra o perigo de que o crime organizado se aposse das instituições do Estado. Até o caso Cachoeira, disse o parlamentar gaúcho, havia sido comprovada a corrupção de setores da burocracia dos governos, mas não a da estrutura do Estado.
O governador Marconi Perillo se esquivou, com habilidade, das questões mais graves, em seu depoimento na CPMI. Registre-se que ele se encontrava mais do que tranqüilo, mesmo respondendo às indagações precisas do relator, até que chegou a vez do deputado Miro Teixeira. O experiente homem público, mesmo tendo como ponto de partida o caso menor, que é o da venda da casa de Perillo, deixou, na argúcia de suas perguntas, graves suspeitas.
Como pôde o governador receber o dinheiro de uma empresa e passar a escritura a um particular? Também ficou claro a quem ouviu o governador ser difícil que ele ignorasse as atividades ilícitas do apontado contraventor; ele conhecia, com intimidade, a sua vida empresarial, social e familiar.
O caso Cachoeira – e a advertência de Pedro Simon é importante – mostra como a nação está acossada por um inimigo interno insidioso, que é o crime organizado. Os recursos públicos são desviados para alimentar um estado clandestino, que está deixando de ser paralelo, para constituir o núcleo do poder, em alguns municípios, em muitos estados e na própria União. Essa erosão interna da nacionalidade brasileira, que se assemelha a uma gangrena, coincide com o cerco internacional contra o nosso país.
Enquanto parte da opinião nacional acompanha, indignada, as revelações do esquema Cachoeira, articula-se eixo internacional entre os Estados Unidos, a Espanha e todos os países da Costa do Pacífico, com a exceção do Equador e da Nicarágua, contra o nosso povo, mediante a Aliança do Pacífico. Não há qualquer dissimulação.
Como informa a publicação Tal Cual, da oposição venezuelana, o foro funciona ativamente e já celebrou seis reuniões de alto nível. “Os quatro países signatários da nova Aliança do Pacífico – revela a publicação – têm, todos eles, governos de centro ou centro-direita, crêem no capitalismo, são amigos dos Estados Unidos, e favorecem os tratados de livre comércio e o princípio do livre-comércio em geral. Une-os sobretudo um temor comum e impulso defensivo frente à ascendente potência hegemônica ou neo-imperial que é o Brasil”. E termina: “sentimo-nos satisfeitos e aliviados pelo surgimento do muro de contenção à expansão brasileira, que é a Aliança do Pacífico”.
Assim, os Estados Unidos cuidam de retomar a sua influência e presença militar na América Latina. Nesse sentido, procuram valer-se da Aliança do Pacífico para estabelecer bases militares cercando o Brasil, da Colômbia ao sul do Chile. Leon Paneta, o Secretário de Defesa dos Estados Unidos, acaba de acertar com o presidente do Chile, Sebastián Piñera, o estabelecimento de uma base norte-americana em Fuerte Aguayo, nas proximidades de Valparaíso. Entre outras missões dos militares americanos está a de treinar os carabineiros chilenos, a fim de coibir manifestações populares. Há, ao mesmo tempo, uma orquestração da imprensa e dos meios políticos e empresariais, a fim de reabilitar a figura do ditador Pinochet.
Os Estados Unidos, que mantêm uma base no Chaco paraguaio, quiseram também ocupar o aeroporto de Resistência, na província argentina do Chaco, e o governador Capitanich assentiu, mas o governo de Cristina Kirchner vetou o acordo.
A participação da Espanha nesse novo cerco ao Brasil é evidente. Em Madri, os embaixadores dos quatro paises maiores envolvidos (México, Colômbia, Peru e Chile) se reuniram, para defender a nova aliança, e coube ao embaixador do Chile, Sergio Romero, ser bem explícito. Ao afirmar que o bloco não nasce contra o Brasil, nem contra o Mercosul, aclara, no entanto, que o grupo recebe de braços abertos os investimentos europeus, especialmente da Espanha e dos Estados Unidos – que poderiam formalmente participar da Aliança.
Limpemos os nossos olhos, vejamos os perigos que ameaçam diretamente a nossa sobrevivência como nação independente, nas vésperas do segundo centenário do Grito do Ipiranga. Não temos que ficar abrindo mais divisões internas, e devemos nos unir para enfrentar, ao mesmo tempo, o inimigo interno, que é o crime organizado e suas teias nas instituições do Estado, e os inimigos externos.
Esses, sempre que estivemos avançando no desenvolvimento social e econômico, procuraram quebrar as nossas pernas, contando com traidores brasileiros. Não é preciso recuar muito no passado. Basta lembrar o cerco contra Vargas, em 1954, a tentativa de golpe de 1955, repetida em 1961 e, por fim, o golpe de 1964, com as conseqüências conhecidas. Registre-se que, apesar da vinculação com os Estados Unidos, durante o governo Castelo Branco, e a famosa doutrina das “fronteiras ideológicas”, vigente durante o governo Médici, a partir de Geisel os militares brasileiros não mantiveram a mesma subserviência diante de Washington.
Enfim, espera-se que o Itamaraty mantenha o governo da Sra. Dilma Roussef a par dessas manobras anti-brasileiras, comandadas a partir de Madri e de Washington, e que a CPMI vá até o fundo, nas investigações em curso. Elas não devem parar nas imediações de Anápolis, mas chegar a todo o Brasil, conforme os indícios surjam. É bom conhecer a verdade do passado, mediante a Comissão formada para isso. E se faz também necessário conhecer a verdade do presente, e impedir que o crime tome conta das instituições nacionais, como está ocorrendo no México de Calderón.
E não nos devemos esquecer que o sistema financeiro mundial é também uma forma – superior e mais poderosa – de crime organizado. E muito bem organizado.
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