política e DIREITOS HUMANOS
INDIGNAÇÃO, NUNCA
Por Mino Carta, na Revista Carta Capital
O The New York Times na segunda 5 publicou com destaque uma reportagem sobre a situação dos cidadãos brasileiros enxotados de suas moradias por se encontrarem no caminho das obras da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016. A história não envolve somente o Rio, mas também outras cidades-sede do Mundial de Futebol. CartaCapitaldenunciou as remoções forçadas na edição de 20 de abril do ano passado. Poucos dias depois, a Relatora Especial da ONU, Raquel Rolnik, denunciou as autoridades municipais envolvidas na operação, que desrespeita a legislação e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil para a defesa dos direitos humanos.
Já então a relatora apontava diversas violações, “todas de grande gravidade”. Multiplicaram-se de lá para cá, inexoravelmente. Maus-tratos generalizados, “zero dias” de tempo para deixar a moradia, 400 reais de “aluguel social” enquanto o enxotado espera ser contemplado por algum demorado plano de habitação. Antes do diário nova-iorquino, nos últimos tempos levantaram o assunto outros jornais e sites estrangeiros, como The Guardian, El País, o Huffington Post.CartaCapital voltou a tratá-lo em janeiro passado, com uma larga reportagem assinada por Rodrigo Martins e Willian Vieira, intitulada “Os retirantes das favelas” para focalizar, entre outros aspectos, uma das consequências das remoções forçadas.
E a mídia nativa? Não foi além de raros e ralos registros. Para saber das coisas do Brasil, recomenda-se amiúde recorrer à imprensa estrangeira. Ou melhor, seria recomendável o recurso. No mais, vale reconhecer, a mídia tem sido eficaz na manipulação das informações quando não na omissão dos fatos, de sorte a se fortalecer na convicção de que eventos por ela não noticiados simplesmente não se deram. É o resultado inescapável do conluio automático, tácito, instintivo eu diria, que se estabelece entre barões midiáticos e fiéis sabujos quando consideram ameaçado seu desabusado apreço pelo status quo.
Encarada deste ângulo, é mídia de mão única, daí a eficácia da doutrinação. E esta, de certa forma, transcende as expectativas, pois os próprios doutrinadores se tornam doutrinados, ao acreditarem, eles mesmos, na situação definida por aquilo que relatam ou deixam de relatar. Não é necessário espremer as meninges para perceber o quanto o Brasil emburrece, não bastassem as taxas de ignorância atingidas por nosso ensino em todas as suas instâncias. Este que escreve tem a frequente oportunidade de constatar que os nossos universitários, em diversos rincões, ignoram a história recente, e nem se fale da antiga, salvo surpreendentes exceções.
A aposta, no entanto, é esta exatamente, na ignorância da plateia, e nela se afogam em perfeita concomitância os jornalistas e seus patrões, em proveito do “deixa como está para ver como fica”. Certo é que o caminho das obras da Copa e das Olimpíadas se escancara com o sacrifício de incontáveis cidadãos para a felicidade de empreiteiros, políticos e quejandos. Quanto aos enxotados, disse cidadãos, mas terão eles consciência da cidadania? Vexado por uma opção fortemente populista, haverá quem consiga abrir os olhos para assistir ao assalto aos cofres públicos, de proporções nunca dantes navegadas. A maioria, entretanto, mais uma vez ou não enxerga ou se resigna, como se o enredo estivesse escrito nas estrelas.
A indignação não é uma característica dos humores verde-amarelos, genuína manifestação da alma brasileira. Aceitamos que Ricardo Teixeira permaneça incólume à testa da CBF, ou que as denúncias formuladas no livro do repórter Amaury Jr. a incriminarem José Serra candidato à prefeitura de São Paulo sejam letra morta, ou que a Operação Satiagraha seja sumariamente enterrada a bem do onipresente orelhudo, o banqueiro Daniel Dantas, aparentemente sem o menor abalo nos precórdios, ou apenas e tão somente porque privados das condições mínimas para entender o significado disso tudo.
Neste pântano a mídia nativa chafurda, em meio a uma pretensa redemocratização em um país que jamais conheceu a democracia, vincado por desequilíbrios sociais ainda monstruosos, incapaz de apagar de vez uma dita Lei da Anistia imposta pela ditadura e entregue a uma chamada Justiça destinada a proteger os ricos.
GOVERNO E ATINGIDOS POR
GRANDES OBRAS FRENTE A
FRENTE
Por Najla Passos, na Agência Carta Maior
Brasília - Surtiram efeito as denúncias do movimento social brasileiro e de organismos internacionais contra a forma com que o governo tem conduzido o diálogo com as comunidades atingidas pelas grandes obras em desenvolvimento no país. Teve início nesta quinta (8), em Brasília, um seminário para discutir a regulamentação da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que estabelece os parâmetros para consultas aos povos indígenas, tribais e comunidades tradicionais afetados por obras e empreendimentos de infraestrutura.
O seminário, promovido pela Secretaria-Geral da Presidência e pelo Ministério das Relações Exteriores, reúne 160 lideranças indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais que, reiteradamente, durante a abertura do evento, denunciaram irregularidades no diálogo estabelecido entre governo e atingidos para a construção de empreendimentos como a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, e remoções de comunidades para as obras de infraestrutura da Copa do Mundo, em diversas capitais do país.
A vice-coordenadora da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Sônia Guajajara, afirma que, por mais que o governo diga que tem consultado os povos afetados pelas grandes obras, esse diálogo nunca ocorreu de fato. “Apesar da convenção ter sido ratificada pelo Brasil há dez anos, o governo promove, no máximo, conversas informais . Por isso, a importância deste seminário, que marcará o ponto de partida para discutirmos, entre os povos, como se dará este processo, como serão os procedimentos para atender essa lei da consulta livre, prévia e informada”.
Segundo ela, o exemplo de Belo Monte é citado com freqüência porque, pela sua grandiosidade, ganhou repercussão internacional. “Direta e indiretamente, cerca de 25 mil indígenas serão afetados. Uma minoria irá perder suas terras, mas muitos também sofrerão com a diminuição de caça e pesca”, esclarece. A liderança acrescenta que há vários outros casos de irregularidades ocorrendo nos mais diversos rincões do Brasil. “São obras de hidrelétricas, hidrovias, rodovias, transposições de rios, entre. Outro exemplo grande é a transposição do rio São Franciso que, apesar da população ser toda contrária, aconteceu da mesma forma”, disse.
Membro da Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas do Brasil (Conaq), Maria Risalina dos Santos, também aposta que o seminário será um marco história na trajetória de luta dos povos tradicionais. “A Convenção 169 está aí há dez anos e só agora somos convidados a tratar de sua ativação. Isso significa que o governo busca nossa participação para efetivar o que diz a OIT. E nós vamos dizer como a consulta deve ocorrer, em nossos estados e municípios, para que nossos direito não sejam violados”.
Ela também reitera que os processos de diálogo promovidos pelo governo não se constituem como tal. “Nós temos questões urgentes das comunidades quilombolas afetadas pelos grandes empreendimentos, e acreditamos que são violações dos direitos humanos, porque não fomos consultados. Nós sabemos que viemos no Brasil do desenvolvimento, e não somos contra ele, mas somos contra a forma como o desenvolvimento é instalado em nossas comunidades”, esclarece.
O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, disse que o governo está se empenhando para que o processo de consulta se aperfeiçoe, mas negou que ele não ocorra. “O governo não tem complexo de culpa porque nós entendemos que ouvimos as comunidades até agora. Mas nós entendemos também que é possível aperfeiçoar esses mecanismos: consultar com mais antecedência, quando o projeto ainda estiver sendo desenhado, fazer consultas nas línguas indígenas diversas, mobilizar um maior número de pessoas para se ter maior expressão”, afirmou.
Em relação às críticas feitas pelos movimentos, ele rebateu que o processo de consulta aos atingidos pelas obras de desenvolvimento é sempre tenso e é natural que haja reclamações. “Este debate sobre a Convenção 179 é muito importante porque vai estabelecer regras claras de consulta. Até agora, há muita contradição. O governo diz que consulta e a população diz que não é suficiente”.
O ministro afirmou, porém, que o governo entende que a Convenção 169 não é vinculante, ou seja, que o fato de uma população não querer uma obra não impede que ela seja realizada, porque o Brasil precisa continuar crescendo. “O desejável é que aja um acordo com a comunidade, e que sejam respeitados todos os direitos que ela tenha”. Como exemplo positivo de diálogo, ele cita a mesma hidrelétrica de Belo Monte que os atingidos apontam como negativo. “O projeto original, o lago ocupava uma área muito maior. Por causa da pressão, nós conseguimos avançar em tecnologia e diminuir muito a área alagada”, afirmou.
O ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, disse que o país pode se orgulhar da sua vanguarda internacional em assinar a convenção 169, mas acrescentou que, tanto para o Brasil quanto para os outro 19 países que a ratificaram, ela passa a ser uma obrigação. Segundo ele, o grupo interministerial já criado para definir a implementação do tratado terá 180 para concluir seus trabalhos, mas que o prazo pode ser prorrogado, caso as comunidades necessitem de mais tempo para serem ouvidas.
O seminário, promovido pela Secretaria-Geral da Presidência e pelo Ministério das Relações Exteriores, reúne 160 lideranças indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais que, reiteradamente, durante a abertura do evento, denunciaram irregularidades no diálogo estabelecido entre governo e atingidos para a construção de empreendimentos como a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, e remoções de comunidades para as obras de infraestrutura da Copa do Mundo, em diversas capitais do país.
A vice-coordenadora da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Sônia Guajajara, afirma que, por mais que o governo diga que tem consultado os povos afetados pelas grandes obras, esse diálogo nunca ocorreu de fato. “Apesar da convenção ter sido ratificada pelo Brasil há dez anos, o governo promove, no máximo, conversas informais . Por isso, a importância deste seminário, que marcará o ponto de partida para discutirmos, entre os povos, como se dará este processo, como serão os procedimentos para atender essa lei da consulta livre, prévia e informada”.
Segundo ela, o exemplo de Belo Monte é citado com freqüência porque, pela sua grandiosidade, ganhou repercussão internacional. “Direta e indiretamente, cerca de 25 mil indígenas serão afetados. Uma minoria irá perder suas terras, mas muitos também sofrerão com a diminuição de caça e pesca”, esclarece. A liderança acrescenta que há vários outros casos de irregularidades ocorrendo nos mais diversos rincões do Brasil. “São obras de hidrelétricas, hidrovias, rodovias, transposições de rios, entre. Outro exemplo grande é a transposição do rio São Franciso que, apesar da população ser toda contrária, aconteceu da mesma forma”, disse.
Membro da Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas do Brasil (Conaq), Maria Risalina dos Santos, também aposta que o seminário será um marco história na trajetória de luta dos povos tradicionais. “A Convenção 169 está aí há dez anos e só agora somos convidados a tratar de sua ativação. Isso significa que o governo busca nossa participação para efetivar o que diz a OIT. E nós vamos dizer como a consulta deve ocorrer, em nossos estados e municípios, para que nossos direito não sejam violados”.
Ela também reitera que os processos de diálogo promovidos pelo governo não se constituem como tal. “Nós temos questões urgentes das comunidades quilombolas afetadas pelos grandes empreendimentos, e acreditamos que são violações dos direitos humanos, porque não fomos consultados. Nós sabemos que viemos no Brasil do desenvolvimento, e não somos contra ele, mas somos contra a forma como o desenvolvimento é instalado em nossas comunidades”, esclarece.
O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, disse que o governo está se empenhando para que o processo de consulta se aperfeiçoe, mas negou que ele não ocorra. “O governo não tem complexo de culpa porque nós entendemos que ouvimos as comunidades até agora. Mas nós entendemos também que é possível aperfeiçoar esses mecanismos: consultar com mais antecedência, quando o projeto ainda estiver sendo desenhado, fazer consultas nas línguas indígenas diversas, mobilizar um maior número de pessoas para se ter maior expressão”, afirmou.
Em relação às críticas feitas pelos movimentos, ele rebateu que o processo de consulta aos atingidos pelas obras de desenvolvimento é sempre tenso e é natural que haja reclamações. “Este debate sobre a Convenção 179 é muito importante porque vai estabelecer regras claras de consulta. Até agora, há muita contradição. O governo diz que consulta e a população diz que não é suficiente”.
O ministro afirmou, porém, que o governo entende que a Convenção 169 não é vinculante, ou seja, que o fato de uma população não querer uma obra não impede que ela seja realizada, porque o Brasil precisa continuar crescendo. “O desejável é que aja um acordo com a comunidade, e que sejam respeitados todos os direitos que ela tenha”. Como exemplo positivo de diálogo, ele cita a mesma hidrelétrica de Belo Monte que os atingidos apontam como negativo. “O projeto original, o lago ocupava uma área muito maior. Por causa da pressão, nós conseguimos avançar em tecnologia e diminuir muito a área alagada”, afirmou.
O ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, disse que o país pode se orgulhar da sua vanguarda internacional em assinar a convenção 169, mas acrescentou que, tanto para o Brasil quanto para os outro 19 países que a ratificaram, ela passa a ser uma obrigação. Segundo ele, o grupo interministerial já criado para definir a implementação do tratado terá 180 para concluir seus trabalhos, mas que o prazo pode ser prorrogado, caso as comunidades necessitem de mais tempo para serem ouvidas.
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POLÍTICA E DEMOCRACIA pOLítICA e Democracia
CHANTAGEM E OS LIMITES DA
TOLERÂNCIA
Por Izaías Almada
Muitos daqueles que gostam de encher a boca para falar em democracia, a que lhes satisfaz, é claro, pois há democracias para todos os gostos, curiosamente se calam diante de algumas atitudes e opiniões que lhes desagradam ou vão de encontro aos seus interesses.
Jornalistas, de preferência os especialistas em qualquer coisa ou coisa nenhuma; políticos ou seja lá o que isto signifique nos dias de hoje; juristas mais cegos do que o símbolo da profissão que abraçaram; intelectuais e artistas cujas ideias e criações estão comprometidas com o lado efêmero da vida mundana; empresários do supérfluo, fiscais da natureza que se autointitulam ecologistas, defensores dos ‘direitos humanos’ dos animais e por aí afora; alguns militares de pijamas e bermudas, gostam todos de boquejar sobre o que entendem por democracia e o que é preciso fazer, no seu entender, para que ela deva continuar em benefício da SUA liberdade de expressão e de SEUS grandes negócios.
No Brasil, após redescobrirmos alguns dos valores do que é viver em democracia, recuperando-nos de alguns dos principais traumas do golpe civil/militar de 1964, descobrimos que milhares – senão mesmo milhões – lutaram para que essa recuperação fosse possível. Milhões?! A tal ponto que já me fiz uma perguntinha idiota, mas muito pertinente: se foram tantos assim a lutar contra a ditadura naqueles tempos sombrios, por qual razão ela se impôs e durou tantos anos no Brasil? E ainda esbraveja por aí nas entrelinhas de jornais, revistas e imagens de televisão ou no arreganho de alguns homens fardados, por exemplo?
Contudo, com o passar dos anos, parece que nem todos estão satisfeitos com a democracia que se tem. Nem os que se beneficiaram da ditadura e também muitos dos que se beneficiaram com a volta da democracia, mesmo que esta ainda vá se mostrando um pouco capenga das pernas.
Até prova em contrário, a democracia brasileira como tantas outras do mundo cristão ocidental, é a democracia representativa formal, tutelada pelo poder econômico. Quem tem mais dinheiro faz lobby e elege os “representantes do povo”, compram juízes, policiais, deputados, senadores e por aí segue incólume o trem dessa democracia.
Quem não tem dinheiro é obrigado a depositar o seu votinho na urna de dois em dois anos, obrigatoriamente – é bom que se diga – e se tenta reclamar alguma coisa, corre o risco de ter a PM no seu calcanhar. Ou a reputação enxovalhada pela tal liberdade de imprensa.
Qualquer indício de que a sociedade brasileira gostaria de mudar esse padrão viciado de cidadania a que chamam de democracia, começam a pipocar na imprensa e não só, as “advertências” sobre os perigos que corre o país: querem instituir a censura e calar a liberdade expressão, dizem uns, querem a hegemonia do poder, esbravejam outros, querem o revanchismo, boquejam terceiros, e por aí afora.
O esquema é tão safado e sem vergonha, além de útil, que bastou a presidente Dilma Rousseff mandar embora ou aceitar a demissão de alguns ministros (com provas ou não, outra gracinha da nossa grande democracia), que alguns dos partidos políticos aliados (imaginem se não fossem) já iniciaram a cantilena das chantagens nas votações no Congresso Nacional. TUDO BEM TIRAR MILHÕES DE BRASILEIROS DA MISÉRIA, MAS PRECISAMOS GARANTIR A NOSSA MAMATA, O NOSSO MINISTERIOZINHO E AS NOSSAS VERBAS!
Apurar mazelas e trambiques do Poder Judiciário? Nem pensar. Isto é uma afronta a democracia. Levar criminosos do colarinho branco aos tribunais e, uma vez comprovado o crime, às prisões? De forma alguma, “somos um povo pacífico, que detesta a violência”. E no dia seguinte, os mesmos argumentadores em causa própria pedem providências contra a violência do dia a dia nas grandes cidades brasileiras, a violência dos pobres, bem entendido.
Apurar mazelas e trambiques do Poder Judiciário? Nem pensar. Isto é uma afronta a democracia. Levar criminosos do colarinho branco aos tribunais e, uma vez comprovado o crime, às prisões? De forma alguma, “somos um povo pacífico, que detesta a violência”. E no dia seguinte, os mesmos argumentadores em causa própria pedem providências contra a violência do dia a dia nas grandes cidades brasileiras, a violência dos pobres, bem entendido.
Tamanha hipocrisia e cinismo já ultrapassam os limites da tolerância, do bom senso. Os próximos meses, com as eleições municipais que se aproximam, irão deixar à mostra o lado mais sórdido da nossa democracia: aquele em que se pode dizer tudo e mais alguma coisa do adversário, mesmo sem provas e, eleitos, alguns milhares de prefeitos e vereadores – em sua maioria – se oferecerão como base de troca para as presidenciais de 2014. Será tudo uma questão de distribuição de verbas, chantagens e alianças espúrias, onde a governabilidade se define entre o péssimo e o menos ruim.
Grande democracia!
Izaías Almada é escritor, dramaturgo e roteirista cinematográfico, É autor, entre outros, dos livros TEATRO DE ARENA, UMA ESTÉTICA DE RESISTÊNCIA, da Boitempo Editorial e VENEZUELA POVO E FORÇAS ARMADAS, Editora Caros Amigos.
Fonte: Blog O Escrevinhador, de Rodrigo Vianna
O senador Demóstenes, paladino da
ética e dos bons costumes, flagrado
em conversas amigáveis com o
contraventor "Cachoeira". Para nossa
chamada grande mídia, pode. Petista,
não pode.
Caiu a cabana do "Pai Demóstenes"
Por Leandro Fortes, na Revista Carta Capital
Ao longo de nove anos no Congresso Nacional, o senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás, notabilizou-se por não dar trégua à corrupção. Nem aos corruptos. Nem aos amigos dos corruptos. Nem aos amigos dos amigos dos corruptos. Ex-promotor de Justiça, ex-delegado e ex-secretário de Segurança Pública de Goiás, Torres sempre se mostrou inflexível com o crime. Dele, portanto, não se esperava outra coisa senão distância de criminosos e corruptos.Mas a força desse mito desmoronou em 29 de fevereiro passado, quando aconteceu a Operação Monte Carlo, da Polícia Federal. Naquele dia, a PF desmontou uma quadrilha que atuava no ramo ilegal da jogatina e prendeu, em Goiânia, o famoso bicheiro Carlos Augusto Ramos. Apelidado de Carlinhos Cachoeira, o contraventor, quem diria, é um amigão do senador linha-dura.
Entre fevereiro e agosto de 2011, Torres e Cachoeira trocaram nada menos que 298 telefonemas, segundo interceptações telefônicas feitas pela Polícia Federal, com autorização da Justiça. No inquérito aberto pelo Ministério Público Federal, é possível observar que a dupla conversou, no período, mais de uma vez por dia, inclusive nos fins de semana, mas ainda não foi revelado o exato teor de tanta prosa. Por ser senador, Torres tem direito a foro privilegiado, e a investigação será encaminhada à Procuradoria-Geral da República. Caberá ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, denunciar ou não o parlamentar do DEM por associação com o notório criminoso goiano.
Os sinais da amizade foram detectados não só pelo número de ligações entre o senador e o contraventor, mas pela singular generosidade de Carlinhos Cachoeira com o amigo parlamentar. Torres ganhou do amigo uma cozinha completa, com fogão e geladeira, no valor de 27 mil dólares (46,7 mil reais). O regalo foi importado dos Estados Unidos, não se sabe ainda se pelas vias oficiais. Outro a cair nas graças do bicheiro foi Geraldo Messias (PP), prefeito de Águas Lindas de Goiás, um dos municípios mais miseráveis da região do entorno do Distrito Federal. Messias ganhou uma viagem a Las Vegas, em maio de 2011, hotel e despesas incluídos.
Foi o próprio senador, graças a um corolário de desculpas esfarrapadas, quem revestiu a história de tragicomédia. Sobre a cozinha de luxo, explicou que a mulher com quem casou em 13 de julho do ano passado é, além de advogada, boa cozinheira. Por essa razão singela Cachoeira havia prometido um “bom presente”. Como promessa é dívida e o bicheiro parece ser um homem de palavra, a cozinha foi entregue sem atrasos.
Mas e as outras mais de 200 conversas telefônicas? O assunto, diz Torres, também era mulher, mas não a dele. O parlamentar garante ter gastado tanto tempo para contornar uma grave crise conjugal protagonizada pelo empresário Wilder Pedro de Morais, atual secretário de Infraestrutura de Goiás e seu primeiro suplente. De acordo com Torres, a mulher de Morais, Andressa, mudou-se de mala e cuia para a casa de Carlinhos Cachoeira. Essa traição foi suficiente para acionar o gatilho de um psicodrama capaz de obrigar o senador, por longos seis meses, a atuar de conselheiro amoroso na nobre tentativa de evitar uma tragédia passional.
Aparentemente por ter sido surpreendido pela ação da Polícia Federal e do Ministério Público, o senador foi obrigado a montar o álibi que até o momento só serviu para torná-lo alvo de piadas na internet. No Twitter e no Facebook, por exemplo, criou-se a figura do “Pai Demóstenes”, um curioso cartomante que “traz a pessoa amada de volta em 298 ligações”.
Mas nenhuma declaração do senador foi mais constrangedora do que a desculpa para justificar a aproximação com o bicheiro. “Pensei que ele tivesse abandonado a contravenção e se dedicasse apenas a negócios legais”, declarou, após perceber que negar a amizade seria tecnicamente impossível. Para quem foi promotor, delegado e secretário de Segurança Pública, é no mínimo humilhante não saber que um amigo tão próximo estava no topo de uma rede de cassinos ilegais. E ao que parece, Cachoeira ainda dava pitaco nas nomeações de delegados de polícia de Goiás.
Mas nenhuma declaração do senador foi mais constrangedora do que a desculpa para justificar a aproximação com o bicheiro. “Pensei que ele tivesse abandonado a contravenção e se dedicasse apenas a negócios legais”, declarou, após perceber que negar a amizade seria tecnicamente impossível. Para quem foi promotor, delegado e secretário de Segurança Pública, é no mínimo humilhante não saber que um amigo tão próximo estava no topo de uma rede de cassinos ilegais. E ao que parece, Cachoeira ainda dava pitaco nas nomeações de delegados de polícia de Goiás.
A história não deixa de trazer embutida uma ironia particularmente cruel à oposição fincada pelo DEM, em parceria com o PSDB, no Congresso Nacional. Isso porque o bicheiro foi o pivô do primeiro escândalo do governo Lula, em 2004. Na época, Waldomiro Diniz, então assessor da Casa Civil comandada por José Dirceu, apareceu numa gravação de 2002, quando presidia a Loteria Estadual do Rio de Janeiro, em um escancarado achaque ao contraventor. A crise instalou-se no governo e o Congresso acabou por editar uma Medida Provisória para acabar com os bingos e as máquinas de caça-níquel em todo o País. No início de março deste ano, Diniz foi condenado por corrupção a 12 anos de reclusão.
Cachoeira foi preso agora, em compa-nhia de outros 34 suspeitos, sob a acusação de explorar as mesmas máquinas caça-níqueis e por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Segundo a ordem expedida pela Justiça Federal, a ação da PF se deu assim: “a partir do monitoramento do terminal utilizado por Carlos Cachoeira, foram identificados laços estreitos com políticos e empresários. Além disso, descobriu-se a influência de Carlos Cachoeira na nomeação de dezenas de pessoas para ocupar funções públicas no estado de Goiás”.
A prisão do contraventor coincidiu com sua condenação no mesmo processo de Diniz. A juíza Maria Tereza Donatti, da 29ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, o sentenciou a oito anos de cadeia pelos crimes de corrupção passiva e contra a Lei de Licitações. Não fosse pela infeliz coincidência de ver sua estranha amizade revelada ao público, Torres teria sido o primeiro, sem dúvida, a subir à tribuna do Senado para louvar mais uma vitória da Justiça contra a corrupção. Agora, apesar dos afagos dos colegas senadores, corre o risco de sofrer um processo por quebra de decoro.
A operação Satiagraha e os sinais
de alento
DEBATE ABERTO
A Operação Satiagraha e os sinais de alento
O recurso da Procuradoria Geral da República, junto ao STF, contra a decisão do STJ que anulou toda a operação Satiagraha, traz novo ânimo à cidadania. No entendimento do ministro Gilmar Mendes e de mais um ou outro juiz o banqueiro Dantas sempre terá razão. Mas, pelas decisões recentes, sabemos que provavelmente esse não será o entendimento da maioria da alta corte.
Mauro Santayana
O recurso da Procuradoria Geral da República, junto ao Supremo Tribunal Federal, contra a decisão do STJ que anulou toda a operação Satiagraha, traz novo ânimo à cidadania. É mais um dos sinais alvissareiros de que a República se aprimora, apesar da reincidência da corrupção em certas áreas da sociedade.
A operação, autorizada pela Justiça, e comandada pelo delegado Protógenes Queiroz, foi conduzida dentro dos procedimentos rotineiros da Polícia Federal, sem fugir dos trilhos da realidade. É possível, conforme acusam os defensores do banqueiro Daniel Dantas, que os policiais se tenham entusiasmado, diante das provas recolhidas, e deixado vazar algumas informações à imprensa. Esses descuidos, no entanto, não invalidam o processo. As provas recolhidas – e conhecidas – não deixam dúvida de que houve atos ilícitos, previstos na legislação penal.
Mas o banqueiro Daniel Dantas é um honourable man. Todos nos recordamos de seu comparecimento à CPI que não prosperou. O banqueiro não foi inquirido, mas, sim, homenageado, pela maior parte dos parlamentares presentes. Ele estava à vontade, e se esgueirava das poucas e pertinentes perguntas que lhe faziam, discorrendo sobre a sua vitoriosa vida empresarial. Não se encontrava na cadeira dos acusados, mas no púlpito em que, de forma sutil, pregava a filosofia do êxito capitalista.
E havia razões para isso. Daniel Dantas é um dos fenômenos de nossos tempos neoliberais. Recorde-se, entre outros fatos, a admiração quase reverencial do então presidente Fernando Henrique Cardoso - admiração emulada por sua equipe econômica – pelo “gênio” das finanças. Recordem-se os esforços dos responsáveis pela privatização criminosa das empresas estatais a fim de privilegiar o Banco Opportunity, de acordo com as interceptações telefônicas, nunca contestadas. É difícil esquecer o fato de que, nas semanas finais do mandato de Fernando Henrique, o presidente recebeu, no Palácio da Alvorada, o banqueiro, para um jantar a dois, sem testemunhas.
O Brasil é um dos poucos países do mundo em que os homens de negócios têm acesso direto aos chefes de Estado. Não é um bom hábito. Os homens de Estado, ainda que procurem manter-se bem informados sobre os assuntos, devem ser preservados desses contatos pessoais. Para receber os mercadores, os banqueiros, os empreiteiros, investidores – seja lá que títulos tenham esses homens de negócios, existem os ministros de Estado, responsáveis pelas áreas de interesse. E é importante que esses encontros sejam registrados e tenham a presença de testemunhas. Se os negócios são lícitos, não há por que manter os encontros secretos, ainda que possam ser provisoriamente sigilosos; se não são lícitos, não podem ser realizados.
Será difícil ao STF negar o pedido da Procuradoria, diante dos argumentos expostos. Como considerar ilícita uma prova, apenas pelo fato de que mais de um órgão legítimo do Estado, tenha contribuído para a investigação?
É certo que no entendimento jurídico do Ministro Gilmar Mendes e, provavelmente de mais um ou outro juiz, o banqueiro Dantas sempre terá razão. Mas, pelas decisões recentes, sabemos que provavelmente esse não será o entendimento da maioria da alta corte.
A operação, autorizada pela Justiça, e comandada pelo delegado Protógenes Queiroz, foi conduzida dentro dos procedimentos rotineiros da Polícia Federal, sem fugir dos trilhos da realidade. É possível, conforme acusam os defensores do banqueiro Daniel Dantas, que os policiais se tenham entusiasmado, diante das provas recolhidas, e deixado vazar algumas informações à imprensa. Esses descuidos, no entanto, não invalidam o processo. As provas recolhidas – e conhecidas – não deixam dúvida de que houve atos ilícitos, previstos na legislação penal.
Mas o banqueiro Daniel Dantas é um honourable man. Todos nos recordamos de seu comparecimento à CPI que não prosperou. O banqueiro não foi inquirido, mas, sim, homenageado, pela maior parte dos parlamentares presentes. Ele estava à vontade, e se esgueirava das poucas e pertinentes perguntas que lhe faziam, discorrendo sobre a sua vitoriosa vida empresarial. Não se encontrava na cadeira dos acusados, mas no púlpito em que, de forma sutil, pregava a filosofia do êxito capitalista.
E havia razões para isso. Daniel Dantas é um dos fenômenos de nossos tempos neoliberais. Recorde-se, entre outros fatos, a admiração quase reverencial do então presidente Fernando Henrique Cardoso - admiração emulada por sua equipe econômica – pelo “gênio” das finanças. Recordem-se os esforços dos responsáveis pela privatização criminosa das empresas estatais a fim de privilegiar o Banco Opportunity, de acordo com as interceptações telefônicas, nunca contestadas. É difícil esquecer o fato de que, nas semanas finais do mandato de Fernando Henrique, o presidente recebeu, no Palácio da Alvorada, o banqueiro, para um jantar a dois, sem testemunhas.
O Brasil é um dos poucos países do mundo em que os homens de negócios têm acesso direto aos chefes de Estado. Não é um bom hábito. Os homens de Estado, ainda que procurem manter-se bem informados sobre os assuntos, devem ser preservados desses contatos pessoais. Para receber os mercadores, os banqueiros, os empreiteiros, investidores – seja lá que títulos tenham esses homens de negócios, existem os ministros de Estado, responsáveis pelas áreas de interesse. E é importante que esses encontros sejam registrados e tenham a presença de testemunhas. Se os negócios são lícitos, não há por que manter os encontros secretos, ainda que possam ser provisoriamente sigilosos; se não são lícitos, não podem ser realizados.
Será difícil ao STF negar o pedido da Procuradoria, diante dos argumentos expostos. Como considerar ilícita uma prova, apenas pelo fato de que mais de um órgão legítimo do Estado, tenha contribuído para a investigação?
É certo que no entendimento jurídico do Ministro Gilmar Mendes e, provavelmente de mais um ou outro juiz, o banqueiro Dantas sempre terá razão. Mas, pelas decisões recentes, sabemos que provavelmente esse não será o entendimento da maioria da alta corte.
Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.
Fonte: www.cartamaior.com.br
direitos humanos
DIREITOS HUMANOS
DEBATE ABERTO
Ditadores e torturadores não podem ser nomes de ruas
Rodovia Castello Branco, elevado Costa e Silva, rua Dr. Sergio Fleury, avenida Presidente Médici e por aí vai. O Brasil é uma das poucas democracias do mundo que não só deixa tiranos impunes, como os homenageia em praça pública. Boa iniciativa para a Comissão da Verdade seria propor a mudança imediata de tais nomes.
Gilberto Maringoni
Uma Comissão da Verdade de verdade poderia começar seus trabalhos propondo ao Congresso Nacional uma lei simples: proibir em todo o território nacional que logradouros públicos sejam batizados com nomes de pessoas que enxovalharam a democracia e os bons costumes. E alterar as denominações existentes.
Em São Paulo, a situação é vergonhosa. A principal rodovia do estado chama-se Castello Branco. De tão naturalizada está a questão, que poucos param para pensar no seguinte: aquele foi o chefe da conspiração que acabou com a democracia no Brasil, em 1964. A homenagem foi feita por Roberto de Abreu Sodré, governador biônico, que inaugurou a via em 1967. Estávamos em plena ditadura e seria natural que um serviçal do regime quisesse adular seus superiores.
A via não representa uma exceção. A cidade comporta ainda o elevado (?) Costa e Silva, em homenagem ao segundo governante da ditadura. O idealizador foi outro funcionário do regime, Paulo Salim Maluf, nos idos de 1969. O mesmo Maluf mimoseou, em 1982, quando governador, o famigerado Caveirinha, alcunha que imortalizou o general Milton Tavares de Souza, falecido no ano anterior. Caveirinha foi chefe do Centro de Informação do Exército (CIE) e suas grandes obras foram a implantação dos DOI-CODI e da Operação Bandeirantes (Oban), órgãos responsáveis pelo assassinato de inúmeros oponentes do regime. Foi também um dos planejadores da repressão à guerrilha do Araguaia (1972-76).
Ernesto Geisel, ditador entre 1974 e 1979, é o nome de um conjunto habitacional em Bauru. Emilio Garrastazu Médici, o comandante da fase mais repressiva da ditadura, nomeia dezenas de ruas, escolas e praças pelo Brasil. Presidente Figueiredo é uma cidade no Amazonas. Diadema abriga uma Escola Estadual Filinto Muller, temido chefe da Polícia Política do Rio de Janeiro entre 1933 e 1942. Imortalizou-se por ter comandado a operação que resultou na deportação de Olga Benario à Alemanha, em 1936.
Mas nada supera a inacreditável rua Dr. Sergio Fleury, na Vila Leopoldina, na capital.
Os nomes dos funcionários mais ou menos graduados da ditadura podem ser localizados com uma rápida olhada no Google. Castello, Costa e Silva, Médici e Figueiredo emprestam seus nomes a centenas de ruas, avenidas, estradas, escolas e edifícios públicos espalhados pelo Brasil.
Propostas de mudança
Em 2006, o então prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB) enviou mensagem à Câmara dos Vereadores de São Paulo, propondo alteração do nome do viaduto que enaltece Caveirinha. Aprovado em primeira instância, o projeto aguarda até hoje sanção de Gilberto Kassab.
O vereador Pedro Ruas e a vereadora Fernanda Melchiona, do PSOL de Porto Alegre, apresentaram em dezembro último um projeto de lei visando mudar o nome da Avenida Presidente Castello Branco para Avenida da Legalidade. A intenção é não apenas banir a memória do líder golpista, mas homenagear o movimento liderado por Leonel Brizola, em 1961, que deteve as articulações visando impedir a posse do presidente João Goulart, após a renúncia de Janio Quadros.
Manter tais denominações significa conservar viva a memória de gente que deve ser colocada em seu justo lugar na História: o daqueles que perpetraram crimes contra a democracia e a cidadania, prejudicaram o país e contribuíram para o atraso em vários campos de atividade.
Na Itália não existe rua, monumento ou edifício público com o nome de Benito Mussolini ou de outro funcionário graduado do regime fascista. A decisão faz parte de uma luta ideológica que visa extirpar as marcas da intolerância, da brutalidade e da xenofobia que marcaram a vida do país entre 1924 e 1944.
Tampouco há na Alemanha uma avenida Adolf Hitler, um aeroporto Herman Göering (que foi ás da aviação na I Guerra Mundial), um viaduto Joseph Goebbels ou coisas que o valham. Aliás, evitou-se durante décadas batizar crianças com o nome Adolf, por motivos mais ou menos óbvios.
Argentina, Chile e Uruguai também não fazem rapapés à memória de responsáveis pelos anos de terror institucionalizado. A cidade de Puerto Stroessner, no Paraguai, teve seu nome mudado para Ciudad Del Este, assim que o ditador foi deposto, em 1989.
No Brasil, como os zumbis da ditadura não apenas assombram, mas aparentemente intimidam o poder democrático, as mudanças não acontecem. Estão aí, fagueiros e lampeiros na vida nacional, figuras como José Sarney, Marco Maciel, Paulo Maluf e outras, crias da ditadura e cheios de autoridade na vida pública. E os pijamas do Clube Militar volta e meia fazem ordem unida para enaltecer os anos de chumbo.
Banir os nomes de gente dessa laia dos logradouros públicos é um bom passo para se consolidar a democracia.
Em São Paulo, a situação é vergonhosa. A principal rodovia do estado chama-se Castello Branco. De tão naturalizada está a questão, que poucos param para pensar no seguinte: aquele foi o chefe da conspiração que acabou com a democracia no Brasil, em 1964. A homenagem foi feita por Roberto de Abreu Sodré, governador biônico, que inaugurou a via em 1967. Estávamos em plena ditadura e seria natural que um serviçal do regime quisesse adular seus superiores.
A via não representa uma exceção. A cidade comporta ainda o elevado (?) Costa e Silva, em homenagem ao segundo governante da ditadura. O idealizador foi outro funcionário do regime, Paulo Salim Maluf, nos idos de 1969. O mesmo Maluf mimoseou, em 1982, quando governador, o famigerado Caveirinha, alcunha que imortalizou o general Milton Tavares de Souza, falecido no ano anterior. Caveirinha foi chefe do Centro de Informação do Exército (CIE) e suas grandes obras foram a implantação dos DOI-CODI e da Operação Bandeirantes (Oban), órgãos responsáveis pelo assassinato de inúmeros oponentes do regime. Foi também um dos planejadores da repressão à guerrilha do Araguaia (1972-76).
Ernesto Geisel, ditador entre 1974 e 1979, é o nome de um conjunto habitacional em Bauru. Emilio Garrastazu Médici, o comandante da fase mais repressiva da ditadura, nomeia dezenas de ruas, escolas e praças pelo Brasil. Presidente Figueiredo é uma cidade no Amazonas. Diadema abriga uma Escola Estadual Filinto Muller, temido chefe da Polícia Política do Rio de Janeiro entre 1933 e 1942. Imortalizou-se por ter comandado a operação que resultou na deportação de Olga Benario à Alemanha, em 1936.
Mas nada supera a inacreditável rua Dr. Sergio Fleury, na Vila Leopoldina, na capital.
Os nomes dos funcionários mais ou menos graduados da ditadura podem ser localizados com uma rápida olhada no Google. Castello, Costa e Silva, Médici e Figueiredo emprestam seus nomes a centenas de ruas, avenidas, estradas, escolas e edifícios públicos espalhados pelo Brasil.
Propostas de mudança
Em 2006, o então prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB) enviou mensagem à Câmara dos Vereadores de São Paulo, propondo alteração do nome do viaduto que enaltece Caveirinha. Aprovado em primeira instância, o projeto aguarda até hoje sanção de Gilberto Kassab.
O vereador Pedro Ruas e a vereadora Fernanda Melchiona, do PSOL de Porto Alegre, apresentaram em dezembro último um projeto de lei visando mudar o nome da Avenida Presidente Castello Branco para Avenida da Legalidade. A intenção é não apenas banir a memória do líder golpista, mas homenagear o movimento liderado por Leonel Brizola, em 1961, que deteve as articulações visando impedir a posse do presidente João Goulart, após a renúncia de Janio Quadros.
Manter tais denominações significa conservar viva a memória de gente que deve ser colocada em seu justo lugar na História: o daqueles que perpetraram crimes contra a democracia e a cidadania, prejudicaram o país e contribuíram para o atraso em vários campos de atividade.
Na Itália não existe rua, monumento ou edifício público com o nome de Benito Mussolini ou de outro funcionário graduado do regime fascista. A decisão faz parte de uma luta ideológica que visa extirpar as marcas da intolerância, da brutalidade e da xenofobia que marcaram a vida do país entre 1924 e 1944.
Tampouco há na Alemanha uma avenida Adolf Hitler, um aeroporto Herman Göering (que foi ás da aviação na I Guerra Mundial), um viaduto Joseph Goebbels ou coisas que o valham. Aliás, evitou-se durante décadas batizar crianças com o nome Adolf, por motivos mais ou menos óbvios.
Argentina, Chile e Uruguai também não fazem rapapés à memória de responsáveis pelos anos de terror institucionalizado. A cidade de Puerto Stroessner, no Paraguai, teve seu nome mudado para Ciudad Del Este, assim que o ditador foi deposto, em 1989.
No Brasil, como os zumbis da ditadura não apenas assombram, mas aparentemente intimidam o poder democrático, as mudanças não acontecem. Estão aí, fagueiros e lampeiros na vida nacional, figuras como José Sarney, Marco Maciel, Paulo Maluf e outras, crias da ditadura e cheios de autoridade na vida pública. E os pijamas do Clube Militar volta e meia fazem ordem unida para enaltecer os anos de chumbo.
Banir os nomes de gente dessa laia dos logradouros públicos é um bom passo para se consolidar a democracia.
Gilberto Maringoni, jornalista e cartunista, é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de “A Venezuela que se inventa – poder, petróleo e intriga nos tempos de Chávez” (Editora Fundação Perseu Abramo).
Fonte; www.cartamaior.com.br
O discurso da direita
Por Emir Sader, em seu Blog
O discurso da direita
A direita brasileira tem no seu DNA o golpe de 1964 e a ditadura militar. No momento mais decisivo da história brasileira até aqui, quando se jogava o futuro do país, no choque entre democracia e ditadura, a direita – em todas as suas vertentes, partidárias, intelectuais, midiáticas, empresariais, religiosas – ficou com a ditadura.
A boa pergunta a cada homem público, a cada instituição, a cada força política, a cada jornalista, a cada intelectual, a cada brasileiro, a cada cidadão, é saber onde estava naquele momento crucial: defendendo a democracia ou apoiando o golpe e a ditadura militar?
Por isso os constrangimentos desses setores todos para se referir àquele período da nossa história. Tratam de esconder sua postura na ruptura da democracia, para deslocar tudo para os momentos em que foram vítimas do próprio monstro que ajudaram a criar como, por exemplo, na censura a órgãos de imprensa. Querem deixar de passar como verdugos para aparecerem como vítimas da ditadura cuja instalação eles apoiaram. Ou para anularem o papel de verdugos e vítimas, igualando e anulando aos dois.
Como a direita se refere agora à ditadura? Há vários discursos. A ultra direita –incluindo setores militares – segue com o discurso dos militares no momento do golpe - reproduzido naquela época por todos os que os apoiavam – mídia, partidos de direita, igreja, empresários, etc., etc . – de que se tratava de um golpe preventivo, que buscava evitar um golpe da esquerda (?), que levaria o Brasil a ser um país comunista, como Cuba, China e a URSS (sic).
Teriam atuado então na defesa da democracia, literalmente diziam que era um movimento de defesa da democracia, contra o totalitarismo comunista. É o discurso que mantem a ultra direita, cívica e militar. Teria se dado uma “guerra” entre duas partes, uma defendendo a democracia, outra querendo implantar o “totalitarismo comunista”, triunfou uma delas, que deveria ser reconhecida pela nação como sua salvadora.
Desconsideram que tudo aconteceu porque eles violaram a democracia e impuseram a ditadura, eles destruíram o Estado de direito, prenderam arbitrariamente, torturaram, fuzilaram, desapareceram pessoas e seus corpos. Destruíram a democracia que o Brasil vinha construindo e impuseram um regime de terror, valendo-se do aparato de Estado, construído com os impostos da cidadania, para controlar e atacar o Estado de direito.
Por isso, eles têm medo da Comissão da Verdade, têm medo da democracia, têm medo da apuração do realmente aconteceu. Dizem que haverá “revanchismo”. Só se for a revanche da verdade sobre a mentira. (Como disse Dilma, na ditadura não há verdade, só mentira.) Da Justiça sobre o regime de terror. Da democracia sobre a ditadura. Quem não deve, não teme, não tem medo da verdade.
Outra versão - proveniente dos que defenderam essa primeira versão no seu momento, mas que pretenderam estar reciclados para a democracia - é a chamada “teoria dos dois demônios”, segundo a qual a democracia teria sido assaltada por duas forças antidemocráticas, que se equivalem, ambas totalitárias. Dizem isso, embora eles mesmos tivessem estado firmemente de um dos lados – o da ditadura.
Agora, reclicados como liberais, pretendem equidistância dos enfrentamentos entre duas propostas supostamente “totalitárias”, felizmente derrotadas pelo advento da democracia liberal. Não consideram que, quem assaltou a democracia – com o seu apoio –, foram os golpistas, que os da resistência a defenderam, usando do direito à rebelião, consagrado como direito universal.
Precisam esquecer 1964, daí que encaram a história brasileira depois do fim da ditadura. A direita brasileira não pode falar de 1964, do seu papel de promover as mobilizações e as articulações golpistas, do bloco que articularam, para promover a ditadura militar. Não pode fazer sua história. A ultra direita é mais sincera, mas é inaceitável pelos consenso liberais predominantes hoje, então fica isolada, como primo renegado da direita oficial de hoje.
A Comissão da Verdade é um momento que a direita, nas suas distintas versões, tem medo, porque tem medo da verdade.
A boa pergunta a cada homem público, a cada instituição, a cada força política, a cada jornalista, a cada intelectual, a cada brasileiro, a cada cidadão, é saber onde estava naquele momento crucial: defendendo a democracia ou apoiando o golpe e a ditadura militar?
Por isso os constrangimentos desses setores todos para se referir àquele período da nossa história. Tratam de esconder sua postura na ruptura da democracia, para deslocar tudo para os momentos em que foram vítimas do próprio monstro que ajudaram a criar como, por exemplo, na censura a órgãos de imprensa. Querem deixar de passar como verdugos para aparecerem como vítimas da ditadura cuja instalação eles apoiaram. Ou para anularem o papel de verdugos e vítimas, igualando e anulando aos dois.
Como a direita se refere agora à ditadura? Há vários discursos. A ultra direita –incluindo setores militares – segue com o discurso dos militares no momento do golpe - reproduzido naquela época por todos os que os apoiavam – mídia, partidos de direita, igreja, empresários, etc., etc . – de que se tratava de um golpe preventivo, que buscava evitar um golpe da esquerda (?), que levaria o Brasil a ser um país comunista, como Cuba, China e a URSS (sic).
Teriam atuado então na defesa da democracia, literalmente diziam que era um movimento de defesa da democracia, contra o totalitarismo comunista. É o discurso que mantem a ultra direita, cívica e militar. Teria se dado uma “guerra” entre duas partes, uma defendendo a democracia, outra querendo implantar o “totalitarismo comunista”, triunfou uma delas, que deveria ser reconhecida pela nação como sua salvadora.
Desconsideram que tudo aconteceu porque eles violaram a democracia e impuseram a ditadura, eles destruíram o Estado de direito, prenderam arbitrariamente, torturaram, fuzilaram, desapareceram pessoas e seus corpos. Destruíram a democracia que o Brasil vinha construindo e impuseram um regime de terror, valendo-se do aparato de Estado, construído com os impostos da cidadania, para controlar e atacar o Estado de direito.
Por isso, eles têm medo da Comissão da Verdade, têm medo da democracia, têm medo da apuração do realmente aconteceu. Dizem que haverá “revanchismo”. Só se for a revanche da verdade sobre a mentira. (Como disse Dilma, na ditadura não há verdade, só mentira.) Da Justiça sobre o regime de terror. Da democracia sobre a ditadura. Quem não deve, não teme, não tem medo da verdade.
Outra versão - proveniente dos que defenderam essa primeira versão no seu momento, mas que pretenderam estar reciclados para a democracia - é a chamada “teoria dos dois demônios”, segundo a qual a democracia teria sido assaltada por duas forças antidemocráticas, que se equivalem, ambas totalitárias. Dizem isso, embora eles mesmos tivessem estado firmemente de um dos lados – o da ditadura.
Agora, reclicados como liberais, pretendem equidistância dos enfrentamentos entre duas propostas supostamente “totalitárias”, felizmente derrotadas pelo advento da democracia liberal. Não consideram que, quem assaltou a democracia – com o seu apoio –, foram os golpistas, que os da resistência a defenderam, usando do direito à rebelião, consagrado como direito universal.
Precisam esquecer 1964, daí que encaram a história brasileira depois do fim da ditadura. A direita brasileira não pode falar de 1964, do seu papel de promover as mobilizações e as articulações golpistas, do bloco que articularam, para promover a ditadura militar. Não pode fazer sua história. A ultra direita é mais sincera, mas é inaceitável pelos consenso liberais predominantes hoje, então fica isolada, como primo renegado da direita oficial de hoje.
A Comissão da Verdade é um momento que a direita, nas suas distintas versões, tem medo, porque tem medo da verdade.
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Mino Carta: ‘A mídia atua em favor da “casa grande”‘
Fonte: www.cartacapital.com.br
SAÚDE SAÚDE SAÚDE SAÚDE
Nos EUA
09.03.2012 11:22
Coca-Cola e da Pepsi terão de informar sobre riscos à saúde no rótulo(*)
Renata Giraldi(**)
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