24 março 2012

IMPRENSA

VALE FRAUDE CONTRA FRAUDE?


Mauro Malin, no Observatório da Imprensa





A reportagem/ação policial do Fantástico da TV Globo (18/3) sobre propinas para seleção de fornecedores do Hospital Pediátrico da UFRJ deixa no ar algumas perguntas sobre ética jornalística.

 Primeira: é lícito usar câmera oculta? A discussão não está encerrada. Nem a favor, nem contra.

 Segunda: repórter pode, no exercício da profissão, ocultar sua condição profissional?

 Terceira: é aceitável que, para fazer reportagem, repórter cometa o delito de se fazer passar por alguém com uma função determinada? (Isso é diferente de se apresentar numa loja como eventual comprador, qualquer um que estava passando, por exemplo?)

 Se a falsa identidade é válida, serviria também para denunciar crimes como aliciamento de menores, tráfico de crack, assassinato de morador de rua, constituição de esquadrão da morte, contrabando, assalto a carro-forte, desvio em unidade militar, etc.?

 Quarta: por que a reportagem não mencionou que o repórter fez uma tarefa que cabe à polícia? Por que o diretor, que sabia da atividade criminosa, não havia chamado a polícia?

 As fachadas dizem muito

 Uma questão de fundo desfilou discretamente na reportagem do Jornal Nacional sobre o assunto exibida na segunda-feira (19/3). Há uma filmagem da fachada do Hospital Pediátrico da UFRJ, quando este é mencionado, e em seguida uma filmagem da fachada do Tribunal de Contas da União, idem. No primeiro caso, fachada em mau estado, feiosa. No segundo, resplandecente. Essa maneira de repartir o gasto diz muito sobre o modo brasileiro de administrar os serviços públicos. E, quem sabe, sobre supostos superfaturamentos.



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O DIREITO DE ESPERNEAR




Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa




A proposta de recomposição legal do direito de resposta, determinada pelo Senado Federal e encaminhada à Câmara dos Deputados, começa a assombrar as empresas jornalísticas. Entre os aspectos que preocupam a imprensa está a inversão do foro para julgar a ação – em vez de ser julgada na comarca onde se localiza a sede do veículo que provocou a demanda, a questão será tratada no domicílio do reclamante.

Esse detalhe pode fazer uma enorme diferença, conforme observa editorial publicado na quarta-feira (21/3) pela Folha de S. Paulo: a situação é particularmente perniciosa se a pessoa que pede direito de resposta for influente em sua região.
O editorialista do jornal paulista sabe muito bem do que se trata. Basta dar uma olhada, de passagem, nas reportagens recentes sobre a formação de quadrilhas em alguns tribunais para se chegar à óbvia conclusão de que esse mero detalhe pode abrir a oportunidade de lucrativos negócios com ações por danos morais.
Ataque à regulamentação
Digamos que um jornal de São Paulo ou do Rio de Janeiro publique reportagem que seja considerada ofensiva por um deputado que mora em outro estado. O cidadão poderia demandar na Justiça local o direito de resposta, com possibilidade de exigir indenização por dano moral. Além dos custos adicionais pela litigância em outro foro, o jornal teria que enfrentar a possibilidade do jogo combinado entre o reclamante e o julgador.
Os jornais exercem seu direito de espernear, e algumas das considerações já divulgadas por representantes da imprensa, como essa, fazem sentido. Mas é preciso ponderar que a situação que levou o senador Roberto Requião a propor a recomposição do direito de resposta foi criada pela própria imprensa, ao produzir reportagens com base em vazamentos de informação e dar curso a acusações mal fundamentadas, desconsiderando as versões dos acusados.
Ao se negar reiteradamente a atender as queixas de pessoas e instituições que se consideraram injustiçadas pelo noticiário, os jornais acabaram produzindo uma maioria no Congresso Nacional em favor de uma lei mais rigorosa sobre a questão.
Para se ter uma ideia sobre o estado de espírito que se criou entre a imprensa e o Congresso, basta lembrar a estatística citada pelo senador Requião na semana passada: nos últimos três anos, a presidência do Senado encaminhou a diversos jornais nada menos do que 148 ofícios, solicitando a correção de erros em reportagens e denúncias consideradas sem fundamento. Nenhuma dessas manifestações foi publicada.
O texto que foi aprovado no Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados certamente pode ser melhorado. A Associação Nacional de Jornais e outras entidades representativas da mídia tradicional defendem a integração do direito de resposta a uma legislação mais ampla e atualizada sobre o funcionamento da imprensa, que ao mesmo tempo assegure a liberdade de informação e garanta o direito em caso de atentados a interesses individuais e à privacidade.
No entanto, a situação que conduziu à proposta que agora tramita na Câmara dos Deputados foi criada pela própria imprensa, ao promover o ataque à regulamentação da profissão de jornalista e defender a anulação da antiga Lei de Imprensa sem propor, na ocasião, qualquer espécie de regulamentação.
Ampliar o debate
A atitude arrogante das empresas de comunicação também tem impedido qualquer tentativa de autorregulação, o que deixa a instituição imprensa flutuando sobre a sociedade sem qualquer espécie de limite.
Para se convencionar se é possível regulamentar a atividade jornalística sem que isso venha a afetar o direito da sociedade a ser informada de maneira ampla e transparente, é preciso em primeiro lugar que a imprensa se apresente para o debate sobre suas atribuições no ambiente público.
Acontece que esse debate, quando ocorre, é manipulado ou enviesado pela própria imprensa, que se refugia no bunker de uma suposta liberdade de informação cujos parâmetros não consideram o estado contemporâneo das comunicações.
O texto que passou pelo Senado oferece, é certo, uma interpretação muito ampla do direito de resposta e contém algumas contradições. Mas para superar essas deficiências, é preciso enfrentar outra controvérsia: um suposto limite da imprensa quando trata de questões que podem causar danos irreversíveis a direitos individuais ou ao desempenho de uma empresa, por exemplo.
O editorial da Folha é um sinal de que o lobby dos jornais não está conseguindo bloquear a tramitação do projeto. Mas o assunto, por sua importância, deveria estar exposto a um debate mais amplo.














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