27 março 2012


POLÍTICA      POLÍTICA        POLÍTICA





A maior batalha do governo


                Dilma Rousseff






Por Antonio Lassance, na Agência Carta Maior










A derrota do governo, em 2011, na votação da proposta de novo Código Florestal, e o atraso com a Lei Geral da Copa , depois que deputados tiraram o time de campo e negaram quórum à decisão (no último dia 21), foram as duas maiores derrotas congressuais da presidência Dilma, até o momento.


Tanto a velha mídia quanto a oposição conferiram ao episódio um clima de salve-se quem puder. O senador Fernando Collor (PTB-AL) também deu uma ajuda ao catastrofismo ao dizer que, por experiência própria, não se pode brigar com o Congresso, pois os resultados são trágicos.

Em 2011, a presidência Dilma teve uma agenda comedida. Menos medidas provisórias e poucas matérias polêmicas, comparativamente às presidências anteriores. Do que era mais polêmico, aprovou tudo o que propôs: a Comissão da Verdade, o fim do sigilo eterno de documentos, a DRU, o regime diferenciado de contratação (para a Copa das Confederações e o mundial de 2014).

Pode não parecer, mas grande parte da agenda congressual caminha sem ser necessariamente orientada pela clivagem governo-oposição. Em 2011, mais de 70% do que foi aprovado na Câmara e quase 80% do aprovado no Senado sequer precisou ir a plenário. Tramitou em comissões, obteve consenso entre os partidos e foi aprovado em decisões terminativas, ou seja, sem a necessidade do voto de cada parlamentar.

O governo ainda se prontificou, em alguns casos, de abrir mão de suas propostas para aprovar iniciativas nascidas no próprio Congresso, algumas delas de parlamentares da oposição, negociando-se pontualmente a inclusão das prioridades do Executivo. Isso foi essencial para a aprovação da política nacional de resíduos sólidos e a de mobilidade urbana, que significam mudanças institucionais importantes para o País.

Qualquer balanço do ano que passou desfiará um rosário de temas bastante complexos. As principais batalhas foram travadas em temas como a distribuição dos royalties do pré-sal, a regulamentação da Emenda 29, o Plano Nacional de Educação (ainda emperrado), a chamada “guerra dos portos” (uma nova modalidade de guerra fiscal entre os Estados), a divisão (frustrada) do Pará, as obras da Copa e, claro, o pomo da discórdia, o Código Florestal.

O que todas essas questões têm em comum? Todas são batalhas federativas. Mesmo a Copa. Ser sede dos jogos implica em obras de melhoria urbana, reforma de aeroportos, atração de investimentos imobiliários e turísticos. Nos outros assuntos, é muito mais que isso. União, Estados e Municípios têm interesses distintos, e as unidades da federação muitas vezes disputam posições no ranking final dessas decisões. Haverá ganhadores e perdedores.

O federalismo brasileiro está em pleno processo de redefinição de seu pacto. Os partidos e os governos, em cada Estado, representam coalizões com estratégias diferentes de desenvolvimento e apropriação de recursos naturais, públicos e privados, decorrentes de processos que se associam de modo desigual e combinado à lógica de acumulação de capital.

O novo Código Florestal é questão estratégica para o agronegócio que vê, na legislação ambiental atual, uma barreira à expansão da fronteira de exploração de recursos naturais.

Na visão míope do articulismo de plantão da velha mídia, algumas dessas batalhas são perdidas por “tropeços” do governo. Os problemas de fundo são vendidos como problemas de articulação política ou do estilo pessoal da presidenta. É uma boa maneira de simplificar interesses políticos, econômicos e ideológicos maiores e descontextualizá-los de sua dimensão política mais ampla.

Há sinais importantes, bem apontados por Maria Ines Nassif, em artigo na Carta Maior, de que o atual governo não pretende ser um simples condomínio de partidos aliados a ocupar suas vagas e a fazer da presidência o síndico do prédio.

Mas também há sinais de um risco preocupante: o do burocratismo. É a ideia de que governar é gerenciar. De que o objetivo principal para o qual foi eleito é alcançar a máxima eficiência (em quê? Pra quê? Pra quem?). De que a articulação política com o Congresso, assim como a negociação com governadores e prefeitos, é um problema exclusivo da Secretaria de Relações Institucionais. De que a relação com os movimentos sociais é um assunto específico da Secretaria Geral. De que a coordenação de governo é uma rotina da Casa Civil. De que a interlocução com o PMDB é um assunto do vice-presidente. De que a comunicação é um assunto da Secretaria de Comunicação Social. De que a boa gestão de políticas públicas se faz com as ferramentas do "Balanced Scorecard".

A origem grega da palavra governar, associada a navegar, deixa clara algumas obrigações dos que empunham o leme. Apontar o rumo, conduzir a um destino, desafiar águas turbulentas, saber tirar proveito de marés e ventos favoráveis, quando não, remar contra a maré, confrontando o “status quo”.

A questão do Código Florestal é uma dessas em que é preciso remar contra a maré. O governo esticou a negociação até onde pôde, abriu mão de pontos importantes, indispôs-se com os movimentos sociais. Derrotado, é hora de fazer o movimento de pêndulo, retornar à sua posição original e confrontar, na batalha perante a opinião pública nacional e internacional, aqueles que fazem de tudo para derrotá-lo novamente. A chantagem do atraso na votação da Lei Geral da Copa associou ruralistas que se negam até a recuperar a vegetação nativa às margens de rios, a oposição, a bancada homofóbica e os fisiológicos em crise de abstinência. O novo Código se tornou, até o momento, a maior batalha do governo Dilma. Merece ter seu tom elevado e que se dê uma resposta à altura, não confinada aos limites do Congresso.

Antonio Lassance é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e professor de Ciência Política. As opiniões expressas neste artigo não refletem necessariamente opiniões do Instituto.






























MEMÓRIA        MEMÓRIA        MEMÓRIA













Com Chico Anysio o fascismo


                                       não sorria




Por Gilson Caroni Filho, na agência Carta Maior







Com o desaparecimento de Chico Anysio, vale lembrar o dito rikiano de que "a fama é a soma de todos os equívocos em torno de alguém"? Ou estamos assistindo a grandes e justificadas homenagens ao mais importante humorista das últimas quatro décadas? Ciente da força corrosiva do humor e da sátira, Chico criava personagens obstinadamente, talvez intuitivamente, sabendo que o jogo da linguagem crítica é, em si, o jogo do espírito em seu aspecto lúdico.


A irreverência no trato com autoridades e seu refinado senso de resistência política o levaram a um intenso processo de criação, como se não quisesse perder um só detalhe do que estivesse à sua volta. Operando com similaridades e antíteses, captou, com sua lente fina, as luzes e o dia-a-dia do povo brasileiro, dos oligarcas aos estratos populares que não se curvam ao desencanto e à decepção. Do rádio à televisão, Chico Anysio foi um perito em extrair de múltiplos detalhes da nossa formação cultural significados precisos, dissolvendo mitos e máscaras com o ácido sulfúrico da piada certeira e do sarcasmo.

Como ninguém, ele soube fazer isso com ternura, estranha ternura onde o lado amargo da vida é plenamente resgatado pelo humor atordoante. Há quem diga que, como os poetas, os humoristas habitam um mundo em decomposição e decadência, mas o fazem de forma visceral, com arte feita do mais puro aço da reflexão e da lucidez crítica.

Dotado de profunda consciência social, o cearense de Maranguape tem uma face pouco conhecida, que vai bem além do talentoso humorista, autor e compositor: a de um resistente que não se curvou às tentativas de cooptação dos setores golpistas aglutinados, nos anos 1960, na rede de propaganda geral e doutrinação do Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES).

Conforme nos revela René Armand Dreifuss (1981: 248), "a elite orgânica se aproximou de inúmeros produtores, atores e diretores famosos de televisão, tais como Gilson Arruda e Batista do Amaral. Favorecia o uso de programas cômicos, quando possível. Rui Gomes de Almeida observava que uma piada contra um político provocaria um "dano enorme". Negava, ao contrário, o apoio aos atores que não cooperassem ou agissem contra os programas, as linhas de raciocínio e as pessoas que o IPES patrocinava. Tal foi o caso do humorista Chico Anysio, sagaz observador da realidade social". [1]

Na melhor tradição do humor de combate, ainda que sem engajamento explícito, Chico não renegou princípios. Entendeu corretamente e cumpriu com competência a melhor missão do humor: a de fiscal mordaz e crítico visceral das estruturas do poder. Na galeria de mais de duzentos personagens, há lugar de destaque para a velha oligarquia e parlamentares com um profundo sentimento antipopular. Tudo operado com destreza e rara sensibilidade.

Na ausência de herdeiros, o panorama, após sua morte, é desolador. Quadros do Instituto Millennium elegem o ódio de classe, a homofobia e a descriminação de gênero como mote para piadas grosseiras. Programas como Casseta & Planeta e CQC parecem restabelecer uma velha sina: no Brasil, homens que tiveram voos de águia ou condor acabam em incursões galináceas, saltando direto para o poleiro. Enquanto outros, ainda jovens, antecipam a hora do perjuro.

Vai-se a multiplicidade que transforma. Fica a vala comum do transformismo. Não esperem perspicácia, iconoclastia irônica e imaginativa. O que toma a cena como "humor político" nada mais é do que o fascismo que lhe sorri.

Nota
[1] DREIFUSS, René Armand. 1964: a conquista do Estado. Ação Política, Poder e Golpe de Classe, Vozes, Petrópolis, Rio de Janeiro, 1981

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil





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Millôr Fernandes (1923-2012)






Frases




A maior vantagem da comida macrobiótica é que, por mais que você coma, por mais que encha o estômago, está sempre perfeitamente subalimentado.




Anatomia é uma coisa que os homens também têm, mas que, nas mulheres, fica muito melhor.




Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem.




De todas as taras sexuais, não existe nenhuma mais estranha do que a abstinência.




Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim.




Não devemos resistir às tentações: elas podem não voltar.




O cara só é sinceramente ateu quando está muito bem de saúde.




O melhor movimento feminino ainda é o dos quadris.




O pior casamento é o que dá certo.




Se todos os homens recebessem exatamente o que merecem, ia
sobrar muito dinheiro no mundo.




É porque ninguém gosta de trabalhar que o mundo progride.




Por mais imbecil que você seja, sempre haverá um imbecil maior para
achar que você não o é.


Se durar muito tempo, a popularidade acaba tornando a pessoa
impopular.


O mal de se tratar um inferior como igual é que ele logo se julga
superior.





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