02 dezembro 2011

ECONOMIA

Ainda sobre Belo Monte…


Paulo Daniel


Vídeo que satiriza produção de globais em campanha contra Belo Monte. Imagem: Reprodução Youtube
Nos últimos dias, principalmente no mundo digital, muito se falou de dois vídeos. Um com uma excelente produção e atores globais, diga-se de passagem, com um razoável conteúdo contra a construção de Belo Monte e, outro, realizado em sua maioria por estudantes da Unicamp (Universidade de Campinas) e, também, com excelente conteúdo, entretanto, em defesa da construção da Usina Hidrelétrica no Pará. Em ambos a questão central discutida é o meio ambiente. Neste sentido, gostaria de ampliar as provocações ou, quem sabe, talvez, procurar discernir algo.
As palavras “ecologia” e “meio ambiente” mantêm um grau elevado de neutralidade diante dessa realidade. Elas se tornaram impróprias e perigosamente inadequadas, de forma que seria necessário substituí-las por outras mais apropriadas. Isso só poderá ser feito no quadro de uma crítica renovada do capitalismo que vincularia, de forma indissociável, a exploração dos dominados pelos possuidores de riqueza e a destruição da natureza e da biosfera.
Para entender as relações do capitalismo com suas condições de produção “externas”, é necessário retornar às origens e aos fundamentos sociais desse modo de produção e de dominação social. A guerra travada pelo capital para arrancar o campesinato à terra e para submeter a atividade agrícola inteira e exclusivamente ao lucro, da qual vivemos novos episódios hoje em dia, é uma guerra fundadora do novo modo de produção e das formas sociais de dominação que lhe são próprias.
Marx foi quem melhor explicou as consequências, digamos, ecológicas do capitalismo. Na longa quarta seção do livro I do Capital, sobre a produção da mais-valia relativa, ele trata da exploração dos operários agrícolas e industriais no quadro de desenvolvimentos mais amplos sobre a relação entre a agricultura e a grande indústria. Uma leitura minimamente atenta indica até que ponto, para Marx, a ideia de progresso está subordinada à de revolução: “Com a crescente preponderância da população das cidades que ela aglomera em grandes centros, a produção capitalista, de um lado, acumula a força motora da história; de outro lado, ela destrói não somente a saúde física dos operários urbanos e a vida intelectual dos trabalhadores rústicos, mas ainda perturba a circulação material entre o homem e a terra”.
Hoje como ontem, em condições históricas distintas, toda a questão está na capacidade de auto-organização dessa população, majoritariamente urbana, de vendedores de sua força de trabalho a ponto de ser capaz de desempenhar esse papel de “força motriz da história”, isto é de sujeito político decidido a acabar com o capitalismo.
Na ausência ou numa situação de paralisia de tal sujeito político, o que domina é a consolidação e a acentuação de um processo em que “cada progresso da agricultura capitalista é um progresso não somente na arte de explorar o trabalhador, mas também na arte de depenar o solo; cada progresso na arte de aumentar a fertilidade por um certo tempo torna-se um progresso na ruína das fontes duradouras da fertilidade. Quanto mais um país, os Estados Unidos por exemplo, se desenvolve na base da grande indústria, mais rápido ocorre esse processo de destruição”. E Marx terminava com essa frase da qual se fez uma utilização teórica bastante, ou mesmo muito limitada: “A produção capitalista só desenvolve a técnica (…) esgotando as duas fontes das quais jorram toda a riqueza: a terra e o trabalhador”.
Portanto, a necessidade da construção de grandes centrais hidrelétricas na Amazônia deriva, não só porque deverá arrefecer o movimento de aumento do preço da energia no mercado atacadista, mas também, para a manutenção do multifacetado capitalismo brasileiro. É intrínseco ao capital sua acumulação e produzir uma enxurrada de mercadorias, por isso, a energia é essencial, não somente para a utilização dos “i tudo”, mas para sua produção. Além do que, me desculpem meus(minhas) amigos(as) verdes, mas não é possível discutir energias alternativas no capitalismo, isso é, tão somente só, paliativos e marketing ambiental.
O ator Ary Fontoura é um dos globais que participa da campanha satirizada pelos alunos da Unicamp. Imagem: reprodução Youtube
Por fim, o vídeo dos globais me coloca em dúvida. São contra a construção de Belo Monte, pois a oferta de energia aumentará e, por sua vez, de acordo com sua distribuição (neste sentido, o Estado é essencial para regular, distribuir e interferir nesse tipo de mercado), tenderá a diminuir aqueles(as) que vivem nas trevas? Ou porque são realmente contra o processo produtivo que estamos vivendo, ou seja, o capitalismo? Se, for pela segunda opção, sugiro um segundo vídeo; com o seguinte tema: Produzir o quê? E para quem?
Será que alguém toparia?



Fonte: www.cartacapital.com.br 

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Inclusão e ilusão na classe A



André Siqueira

 
Um fato interessante, e pouco observado, no Brasil dos últimos tempos é a movimentação interna na classe A, sem dúvida a categoria mais confusa, e cheia de nuances, dentro da barafunda que é o nosso sistema de estratificação social. Segundo o IBGE, basta afirmar ter renda superior a 5 mil reais mensais por pessoa para uma família se considerar no topo da escala. E eis aí, talvez, o maior fenômeno de inclusão deste País: para fins estatísticos, o dono de uma empreiteira figura na tabela ao lado de seus engenheiros, como se guardassem a mais tênue semelhança de proventos ou de hábitos.
O orgulho que se segue ao ingresso na classe A acompanha a necessidade de apropriar-se de valores e sentimentos dos novos colegas de riqueza, que Mino Carta define muito apropriadamente como os “herdeiros da Casa Grande”. É justamente essa heterogênea fatia da população, verdadeira pirâmide dentro da pirâmide, a que tem acesso garantido a alguns serviços que consideram “básicos” desde o fim da escravidão: empregadas domésticas, babás, passeadores de cachorro, manobristas e equivalentes.
Compram carros de luxo, mas lutam contra o aumento do salário-mínimo e o ganho real nas datas-base de categorias trabalhistas. Foto: Clayton de Souza/AE
Daí as pressões crescentes contra cada aumento do salário-mínimo e pedido de ganho real nas datas-base de categorias trabalhistas que acompanham há décadas o desnível entre lucratividade e produtividade, com larga vantagem para a primeira. É para agradá-los que a mídia adota o discurso de que a “inflação dos serviços” traz de volta a ameaça de descontrole de preços. O encarecimento de certas atividades é um fenômeno inexorável, na verdade um reparo histórico.
Em qualquer país desenvolvido, certos serviços domésticos são prerrogativas de uma elite pequena. Não há tanta gente assim, lá fora, capaz de remunerar apropriadamente, por exemplo, o sacrifício de uma mãe que abre mão de cuidar dos próprios filhos, num sábado à tarde, para vigiar os da patroa, que quer mais tranquilidade durante uma festa de aniversário. Até porque não há tantas mulheres dispostas a vender seu tempo dessa maneira.
Há não muito tempo, uma colunista da Folha de S. Paulo sugeria aos indignados com a corrupção acrescentassem à causa a elevada carga tributária. Afinal, alegava a porta-voz da turma do Cansei (provavelmente os responsáveis pela marcha de 200 gatos pingados que “invadiram” a Avenida Paulista no último feriado e ganharam preciosos minutos de cobertura na Globo), nossas grávidas se vêem obrigadas a viajar até Miami para comprar, por preços mais justos, o enxoval de seus futuros rebentos…
Até os veículos mais insuspeitos volta e meia recaem no discurso das facilidades, tão caro à elite brasileira. O Valor Econômico, hoje um dos melhores jornais do País, trouxe no último dia 25 uma reportagem intitulada “Armadilhas da febre de Miami”, com dicas preciosas aos interessados em se aproveitar de uma nação em crise.
Acreditem ou não, as tais armadilhas do título são as leis tributárias dos EUA. E a genial recomendação é que os brasileiros endinheirados e interessados em arrematar uma “pechincha imobiliária” na Flórida abram empresas em paraísos fiscais e façam por meio delas as aquisições. Assim, prossegue a reportagem, evitam-se os impostos de transmissão de propriedade que, em caso de morte do comprador, podem chegar a 47%.
Quem acha que o Fisco brasileiro “persegue” os ricos precisa saber que, em países com mais longa tradição republicana e democrática, a tributação de propriedades é utilizada, assim como os impostos sobre heranças e grandes fortunas, para evitar a acumulação excessiva de riqueza nas mãos de umas poucas famílias, como ocorre por estas bandas.
Enquanto isso, permitimos a veiculação de propagandas de estratagemas que permitem aos ricos escapar ao pagamento de impostos tanto no Brasil quanto no exterior. Há quem chame esse tipo de estratagema de engenharia tributária. Mais um eufemismo para o jeitinho brasileiro, no pior dos sentidos.


Fonte: www.cartacapital.com.br 


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A crise vem brava

Cada dia aumenta a oscilação no humor dos mercados acompanhando os anúncios do sobe e desce da crise europeia. No último dia 30 veio a notícia que os bancos centrais dos Estados Unidos, Europeu (BCE), Canadá, Grã-Bretanha, Japão e Suíça concordaram em reduzir o custo das linhas existentes em suas operações, a partir do próximo dia 5.

O objetivo desses bancos centrais é “a aliviar as tensões nos mercados financeiros e, assim, mitigar os efeitos de tais apertos sobre a oferta de crédito às famílias e empresas, e assim ajudar a promover a atividade econômica”.

Eles acordaram em facilitar e ampliar até fevereiro de 2013 os intercâmbios de divisas entre si, a um juro reduzido de 0,50% e em alguns casos, prosseguir com suas operações de refinanciamento a três meses até nova ordem.

São decisões para garantir liquidez e evitar que os mercados de crédito travem, o que já estava ocorrendo nos bancos europeus devido a dúvidas sobre a capacidade da região de lidar com a crise da sua dívida.

Essas notícias impulsionaram dia 30 as bolsas de valores mundo afora, tendo a nossa chegado a crescer acima de 4%, fechado a 2,85%.

Creio que há um viés otimista numa parte das análises sobre o desenrolar da crise da zona do euro. Elas apostam que haverá solução para essa crise apesar dos agudos problemas econômicos, fiscais e financeiros, devido à impossibilidade de absorver ou dar garantia à montanha de títulos podres que carregam os bancos. Esses títulos se referem à dívida soberana dos governos que estão entrando em forte recessão que agravou as finanças publicas, e com sérios problemas sociais inerentes ao aperto fiscal, que sofreram.

A realidade vem indicando o agravamento crescente do quadro europeu. No dia 25 último veio a notícia de que a crise de confiança chegou afinal ao coração da Europa, a Alemanha, maior economia do bloco e sócio mais importante da união monetária. O sinal de alerta soou na quarta-feira (24), quando o Tesouro alemão só conseguiu vender 65% dos títulos no valor de €6 bilhões oferecidos ao mercado, e assim mesmo, com o Banco Central Alemão (Bundesbank) comprando parte desse total.

A crise do euro começou nos países de menor importância econômica: Irlanda, Portugal e Grécia e agora atinge economias maiores como Espanha e Itália, já apontando a França como a nova bola da vez. Sobraria como país importante só a Alemanha, que ainda pensa que está imune à crise. Fato é que sua sorte depende fundamentalmente da saúde desses países em recessão no seu intercâmbio comercial e nos reflexos que poderão vir do colapso do sistema financeiro de algum desses países. 

A cegueira alemã consiste na sua intransigência em não apoiar os planos de socorro do BCE para comprar de forma mais intensa os títulos soberanos dos países com sérias dificuldades de honrá-los.

As agências de classificação de risco, com grande atraso, repetindo o ocorrido na crise de 2007/2008 acordaram para a crise europeia e agora começam a rebaixar as notas de classificação de risco de governos e bancos em profusão.

Em face desse quadro creio que há condições para se instalar uma recidiva da crise de 2007/2008, porém mais grave por envolver simultaneamente o sistema financeiro europeu e, dadas as relações estreitas com o sistema financeiro americano, pode contaminar ele. 

Se essa avaliação for correta é de se esperar um mergulho mais profundo das economias europeia e americana, com redução expressiva do consumo de suas populações devido ao desemprego em níveis mais elevados em relação aos atuais, com aprofundamento da crise social durante vários anos. As ditas economias desenvolvidas passarão a ser chamadas de economias estagnadas. Suas moedas serão desvalorizadas e elas serão cada vez mais dependentes da exportação, disputando com países que têm custos mais baixos, como os do leste da Ásia. A situação é difícil e poderá exigir a redução de salários para enfrentar a concorrência internacional.

Nesse cenário, as economias dos países emergentes seriam afetadas pela redução das exportações e enxugamento do mercado de crédito. A saída delas é se apoiar na ampliação dos seus mercados internos. Isso ajudaria a direcionar parte dos produtos antes destinados ao mercado externo para serem usados e consumido no país. Além disso, existe a possibilidade de usar políticas públicas de redistribuição de renda e de redução dos custos que mais pesam nas camadas de renda média e baixa como: alimentação, habitação, transporte, saúde e educação. Isso amplia o poder aquisitivo delas estimulando o desenvolvimento econômico, além do maior atendimento na área social. 

Os países emergentes poderão ampliar seu poder de competição externa na evolução desse processo, devido aos salários mais baixos, e ampliação da produção devido ao crescimento do mercado interno, o que reduz os custos devido à economia de escala. 

O Brasil tem boa munição para o enfrentamento dessa recidiva. Goza de situação fiscal confortável, reservas internacionais de US$ 350 bilhões, depósitos compulsórios dos bancos no Banco Central (BC) superior a R$ 400 bilhões, além de ter juro básico elevado, que pode ser rebaixado, reduzindo despesas do governo federal e, taxas de juros do sistema financeiro elevadas, que reduzem o consumo e que podem baixar se o governo quiser.

Preocupado com a desaceleração da economia, o governo anunciou nesta quinta-feira novo pacote de medidas para estimular os empréstimos dos bancos para a população e, consequentemente, aumentar o consumo das famílias.

O governo decidiu reduzir o Imposto Sobre Produtos Industrializados sobre os produtos da linha branca, como geladeiras, fogões e máquinas de lavar. Além disso, a alíquota do Imposto Sobre Operações Financeiras para pessoas físicas está sendo reduzida de 3% para 2,5% ao ano. Com isso, está sendo revertido, parcialmente, o aumento do tributo efetuado em abril.
Recentemente a presidente Dilma Rousseff tem pedido aos brasileiros que continuem consumindo e que as empresas mantenham sua produção.

No dia 25 último, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reuniu-se com representantes de entidades ligadas à indústria e ao varejo e afirmou que “nós estaremos tomando medidas para continuar estimulando o consumo, para que ele volte ao patamar adequado para manter a economia crescendo entre 4% e 4,5%”.

Infelizmente o BC vai agindo em contradição ao que tem manifestado seu presidente e em suas atas e relatórios quanto à preocupação com os reflexos da crise europeia. A parcimônia com que vem reduzindo a taxa básica de juro é preocupante. Continuamos praticando a maior taxa do mundo. Isso desestimula os investimentos, impede o equilíbrio fiscal e artificializa o câmbio reduzindo a competitividade de nossas empresas. É hora de mudar isso para completar o arsenal de defesa do País para enfrentar a crise que já está em nossa porta.


Fonte. www.cartamaior.com.br 




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