As elites e os Estados arábes, um modelo em crise
Reginaldo Nasser (*)
O que aconteceu na Tunísia, Egito, Iemen e Líbia pode ainda acontecer em todo o mundo árabe revelando o colapso de uma ordem pós colonial que há muito tempo perdeu a sua legitimidade. Provavelmente, se não tivesse ocorrido a invasão militar, o Iraque também estaria nessa lista. Inspirados pelas rebeliões que ocorrem em todo o mundo árabe milhares de iraquianos, de várias regiões saíram às ruas nessa semana para protestar de forma pacífica contra a corrupção e a falta de serviços básicos. Oito anos após a invasão liderada pelos EUA que derrubou o ditador Saddam Hussein há falta de comida, água, eletricidade e empregos.
As rebeliões aparecem, cada vez mais, como um reflexo da falência não apenas do desempenho de seus líderes, da forma de governo adotada (repúblicas ou monarquias) ou do projeto nacionalista iniciado na década de 50, mas sim da essência desses Estados. O Islamismo e o nacionalismo árabe sempre competiram em torno de qual deveria ser o verdadeiro fator de substituição do imperialismo e de unificação das diversidades étnicas, tribais e religiosas nas sociedades árabes. As facções militares, portadoras de um nacionalismo secular, substituíram a velha oligarquia como uma panacéia para todos os males árabes, incluindo o subdesenvolvimento.
Tanto o islamismo como o nacionalismo secular procuraram construir sua legitimidade quase que, exclusivamente, numa postura antiimperialista que se articulou à rejeição do Estado de Israel, mas era desprovida de programas de reformas econômicas, mecanismos de participação política e de integração que permitissem integrar suas respectivas sociedades ou de solidificar o sentimento de uma comunidade árabe de caráter transnacional.
Sem qualquer sinal de rejeição da presença islâmica, mas com uma ênfase na reivindicação de liberdade de expressão, direitos humanos e melhorias socioeconômicas os novos movimentos são, provavelmente, o melhor antídoto às identificações sectárias. Apesar de desvinculado do antigo projeto nacionalista, o imaginário de uma identidade árabe continua com vigor e pode ser o unificador potencial contra possíveis tendências de desintegração e de intervenção estrangeira na região. Essas perspectivas promissoras de democratização na sociedade civil com sua atenção voltada para o bem-estar das massas são fortes, apesar da permanência das elites no processo de transição.
O desafio maior é mudar o perfil desses “Estados rentistas” cujo funcionamento do sistema político e parte substancial das suas receitas provêm de rendas derivadas dos recursos naturais, especialmente petróleo. Além disso, ultimamente, esses Estados também têm se sustentado fortemente em pagamentos multilaterais de ajuda externa, ajuda ao desenvolvimento ou de assistência militar, agora denominadas “rendas estratégicas”. O nível elevado da renda nacional e a ausência de distribuição de renda nesses “Estados rentistas” têm como base um contrato social implícito entre as elites ( locais e internacionais) que só pode ser sustentável, desde que haja recursos suficientes para ser distribuído em uma ampla coalizão de interesses constituída por empresas petrolíferas, indústrias de defesa e empresas de lobby. (ver excelente matéria no HUFFPOST Marcus Baram Libyan Opposition Leaders Slam U.S. Business Lobby's Deals With Gaddafi, traduzida e publicada aqui na Carta Maior).
Existe uma forte correlação positiva entre a renda real e a força do sistema do Estado. A noção de "comprar" o consentimento popular que, por sua vez, concede legitimidade ao regime é pedra angular desse sistema. O Estado dirige a sociedade e cria um sistema de inclusão/exclusão construindo uma relação clientelista entre a classe rentista (não produtivos, considerados como cidadãos) e todo o resto da sociedade que não se beneficia da renda (parte da população que não desfruta de uma plena cidadania).
A tão alardeada paz e estabilidade nos Estados do Golfo (Qatar, Kuwait, Bahrein, Arábia Saudita e Emirados Árabes ) está alicerçada numa distinção muito clara entre os membros da sociedade. Lealdade para com a elite dominante local é aceita na medida em que os indivíduos encontram seus interesses econômicos adquiridos diretamente no Estado. Assim “sair” da comunidade local ou nacional se traduz em enormes custos econômicos. Além disso, a distribuição das receitas petrolíferas também é usada como uma ferramenta para policiamento por meio da deportação ou privação de cidadania contra aqueles que se opõem à elite dominante.
Para os EUA e aliados, a Arábia Saudita é a última fortaleza a ser preservada da “contaminação revolucionária”. Entretanto se levarmos em consideração as recentes atitudes do monarca saudita, as fissuras já começaram aparecer. Após passar meses hospitalizado, o monarca, em seu retorno, foi tomado por um verdadeiro surto humanitário e prometeu despejar 37 bilhões de dólares em medidas de seguridade social, habitação e emprego. Como lembrou apropriadamente Robert Fisk a revolta árabe, que deu início à derrota do império otomano começou nos desertos da Arábia. Resta ver se a história se repete, mas não como farsa.
(*) Professor de Relações Internacionais da PUC/SP)
As rebeliões aparecem, cada vez mais, como um reflexo da falência não apenas do desempenho de seus líderes, da forma de governo adotada (repúblicas ou monarquias) ou do projeto nacionalista iniciado na década de 50, mas sim da essência desses Estados. O Islamismo e o nacionalismo árabe sempre competiram em torno de qual deveria ser o verdadeiro fator de substituição do imperialismo e de unificação das diversidades étnicas, tribais e religiosas nas sociedades árabes. As facções militares, portadoras de um nacionalismo secular, substituíram a velha oligarquia como uma panacéia para todos os males árabes, incluindo o subdesenvolvimento.
Tanto o islamismo como o nacionalismo secular procuraram construir sua legitimidade quase que, exclusivamente, numa postura antiimperialista que se articulou à rejeição do Estado de Israel, mas era desprovida de programas de reformas econômicas, mecanismos de participação política e de integração que permitissem integrar suas respectivas sociedades ou de solidificar o sentimento de uma comunidade árabe de caráter transnacional.
Sem qualquer sinal de rejeição da presença islâmica, mas com uma ênfase na reivindicação de liberdade de expressão, direitos humanos e melhorias socioeconômicas os novos movimentos são, provavelmente, o melhor antídoto às identificações sectárias. Apesar de desvinculado do antigo projeto nacionalista, o imaginário de uma identidade árabe continua com vigor e pode ser o unificador potencial contra possíveis tendências de desintegração e de intervenção estrangeira na região. Essas perspectivas promissoras de democratização na sociedade civil com sua atenção voltada para o bem-estar das massas são fortes, apesar da permanência das elites no processo de transição.
O desafio maior é mudar o perfil desses “Estados rentistas” cujo funcionamento do sistema político e parte substancial das suas receitas provêm de rendas derivadas dos recursos naturais, especialmente petróleo. Além disso, ultimamente, esses Estados também têm se sustentado fortemente em pagamentos multilaterais de ajuda externa, ajuda ao desenvolvimento ou de assistência militar, agora denominadas “rendas estratégicas”. O nível elevado da renda nacional e a ausência de distribuição de renda nesses “Estados rentistas” têm como base um contrato social implícito entre as elites ( locais e internacionais) que só pode ser sustentável, desde que haja recursos suficientes para ser distribuído em uma ampla coalizão de interesses constituída por empresas petrolíferas, indústrias de defesa e empresas de lobby. (ver excelente matéria no HUFFPOST Marcus Baram Libyan Opposition Leaders Slam U.S. Business Lobby's Deals With Gaddafi, traduzida e publicada aqui na Carta Maior).
Existe uma forte correlação positiva entre a renda real e a força do sistema do Estado. A noção de "comprar" o consentimento popular que, por sua vez, concede legitimidade ao regime é pedra angular desse sistema. O Estado dirige a sociedade e cria um sistema de inclusão/exclusão construindo uma relação clientelista entre a classe rentista (não produtivos, considerados como cidadãos) e todo o resto da sociedade que não se beneficia da renda (parte da população que não desfruta de uma plena cidadania).
A tão alardeada paz e estabilidade nos Estados do Golfo (Qatar, Kuwait, Bahrein, Arábia Saudita e Emirados Árabes ) está alicerçada numa distinção muito clara entre os membros da sociedade. Lealdade para com a elite dominante local é aceita na medida em que os indivíduos encontram seus interesses econômicos adquiridos diretamente no Estado. Assim “sair” da comunidade local ou nacional se traduz em enormes custos econômicos. Além disso, a distribuição das receitas petrolíferas também é usada como uma ferramenta para policiamento por meio da deportação ou privação de cidadania contra aqueles que se opõem à elite dominante.
Para os EUA e aliados, a Arábia Saudita é a última fortaleza a ser preservada da “contaminação revolucionária”. Entretanto se levarmos em consideração as recentes atitudes do monarca saudita, as fissuras já começaram aparecer. Após passar meses hospitalizado, o monarca, em seu retorno, foi tomado por um verdadeiro surto humanitário e prometeu despejar 37 bilhões de dólares em medidas de seguridade social, habitação e emprego. Como lembrou apropriadamente Robert Fisk a revolta árabe, que deu início à derrota do império otomano começou nos desertos da Arábia. Resta ver se a história se repete, mas não como farsa.
(*) Professor de Relações Internacionais da PUC/SP)
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Guerras do Afeganistão e Iraque sugam orçamentos dos EUA
Amy Goodman - Democracy Now
Wisconsin, Indiana, Ohio, Idaho...estas são as últimas frentes na batalha dos orçamentos, com uma luta mais ampla que surge como a raiz da possível repressão por parte do governo dos Estados Unidos. Estas lutas, que surgem da ocupação do edifício do Capitólio de Wisconsin, têm como pano de fundo as duas guerras que os Estados Unidos levam adiante no Iraque e no Afeganistão. Não pode haver uma discussão nem um debate sobre orçamentos, salários, aposentadorias ou déficits sem uma análise clara de quais são os custos destas guerras e os benefícios incalculáveis de por um fim às mesmas.
Em primeiro lugar, o custo da guerra. Os EUA gastam cerca de 2 bilhões de dólares por semana somente no Afeganistão, o que representa cerca de 104 bilhões de dólares ao ano – isso sem incluir o Iraque. Comparemos esta cifra com o déficit do orçamento federal. Segundo um recente informe do grupo independente Centro sobre Prioridades Orçamentárias e políticas, “cerca de 45 estados mais o distrito de Columbia projetam déficits orçamentários de um total de 125 bilhões de dólares para o ano fiscal de 2012”. As contas são simples: o dinheiro deveria ir para os estados, em lugar de ser gasto em um estado de guerra.
O presidente Barack Obama não dá sinais de que vá terminar nem a ocupação do Iraque nem a atual guerra no Afeganistão. Pelo contrário, durante a campanha eleitoral prometeu ampliar a guerra no Afeganistão e essa promessa se cumpriu. Então, como marcha a guerra de Obama? Não muito bem.
Durante este período, foi registrado o maior número de mortes de civis no Afeganistão desde que começou a invasão encabeçada pelos Estados Unidos em outubro de 2001. Informou-se que, recentemente, sessenta e cinco civis foram assassinados em Kunar, perto do Paquistão, onde o aumento das mortes de civis provocou o aumento do apoio popular para o Talibã. Em 2010, também se deu o maior número de mortes de soldados estadunidenses, chegando a um total de 711 estadunidenses e aliados mortos no Afeganistão. O número de soldados mortos segue alto em 2011 e a previsão é de que os enfrentamentos se intensifiquem quando terminar o inverno.
O Washington Post informou recentemente que o controvertido programa de aviões não tripulados de Obama, implementado pela CIA, por meio do qual aviões não tripulados sobrevoam zonas rurais do Paquistão para lançar mísseis Hellfire contra supostos “militantes suspeitos”, matou pelo menos 581 pessoas, das quais apenas duas estavam em uma lista estadunidense de pessoas suspeitas de ser “militantes de alto nível”. Há muitas provas de que os ataques com aviões não tripulados, que aumentaram drasticamente durante o governo de Obama, matam civis, sem mencionar o apoio civil paquistanês aos EUA.
Enquanto isso, no Iraque, a democracia que os neoconservadores em Washington pretendiam entregar a ponta de pistola com sua estratégia de “impacto e intimidação” poderia finalmente estar chegando, não com a ajuda dos EUA, mas sim inspirada nos levantes populares pacíficos na Tunísia e no Egito. No entanto, a Human Rights Watch acaba de informar que enquanto as pessoas protestam e os dissidentes se organizam, “os direitos dos cidadãos mais vulneráveis do Iraque, especialmente mulheres e presos, são violados sistemática e impunemente”.
Samer Muscati, investigador da Human Rights Watch no Iraque acaba de sair desse país. Ele disse: “Uma das coisas que temos monitorado é a tortura no Iraque. E lamentavelmente a tortura segue sendo sistemática e generalizada nos centros de detenção. Os detentos se queixam habitualmente dos maus tratos que sofrem. Quando estivemos lá há duas semanas, descobrimos outra prisão secreta em Bagdá, administrada por forças de segurança de elite, ligadas ao escritório do ministro, sem nenhum tipo de prestação de contas. E estas forças mantiveram os mantidos incomunicáveis. Efetivamente, estão desaparecidos. Não têm contato com seus familiares nem com advogados, e os inspetores de direitos humanos estão proibidos de visitá-los. Então os problemas de direitos humanos no Iraque são graves”.
Surgiram protestos em outra Praça Tahrir, em Bagdá (sim, Tahrir significação “libertação” no Iraque e no Egito), contra a corrupção e para exigir empregos e melhores serviços públicos. As forças do governo iraquiano mataram 29 pessoas no fim de semana e detiveram outras 300, entre elas trabalhadores da área de direitos humanos e jornalistas.
No entanto, os Estados Unidos continuam desviando dinheiro e soldados para estas guerras intermináveis. Michael Hastings, da revista Rolling Stone, cujo artigo trouxe à luz o comportamento inaceitável do general Stanley McChrystal, acaba de expor o que denomina uma operação ilegal do tenente general William Caldwell no Afeganistão, na qual o exército dos Estados Unidos montou uma “operação psicológica” contra senadores estadunidenses e outras autoridades que visitavam o país, para obter apoio e mais financiamento. Segundo uma das fontes militares de Hastings, Caldwell perguntou: “O que temos que fazer para que esses tipos nos mandem mais gente? O que preciso pôr na cabeça deles?”.
Arnold Fields, inspetor geral especial para a reconstrução do Afeganistão (SIGAR, na sigla em inglês), recentemente aposentado, acaba de informar que 11,4 bilhões de dólares estão em risco devido a um planejamento inadequado. Outro grupo, a Comissão Estadunidense para Contratos em Tempos de Guerra “concluiu que os EUA desperdiçaram dezenas de bilhões de dólares dos quase 200 bilhões gastos em contratos e subsídios desde 2002 para apoiar as operações militares, de reconstrução e outras operações do país no Iraque e Afeganistão”.
Isso nos remete aos professores, enfermeiros, policiais e bombeiros em Wisconsin. Mahlon Mitchell, presidente dos Bombeiros Profissionais de Wisconsin, me disse na praça do Capitólio, em Madison, por que os bombeiros sindicalizados estavam ali, apesar de seu sindicato não estar entre os afetados pelo projeto de lei do governador Scott Walker.
Mahlon Mitchell disse: “Sabemos que o governador estava utilizando a tática de nos dividir para reinar. Isso é um ataque à classe média. Basicamente está tratando de separar a classe média e os sindicatos para nos enfrentar e se livrar de nós e da negociação coletiva. Nós não íamos ficar sentados esperando que isso acontecesse”.
Se deixarmos de atacar o povo no Iraque e no Afeganistão, podemos evitar estes ataques contra os pobres e a classe média em nosso país.
(*) Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna.
(**) Amy Goodman é apresentadora do Democracy Now!, um noticiario internacional transmitido diariamente para mais de 600 emissoras de rádio e televisão em inglês e em mais de 300 em español. É co-autora do libro “Os que lutam contra o sistema: heróis ordinários em tempos extraordinários nos Estados Unidos”, editado pelo Le Monde Diplomatique Cone Sul.
Tradução: Katarina Peixoto
Em primeiro lugar, o custo da guerra. Os EUA gastam cerca de 2 bilhões de dólares por semana somente no Afeganistão, o que representa cerca de 104 bilhões de dólares ao ano – isso sem incluir o Iraque. Comparemos esta cifra com o déficit do orçamento federal. Segundo um recente informe do grupo independente Centro sobre Prioridades Orçamentárias e políticas, “cerca de 45 estados mais o distrito de Columbia projetam déficits orçamentários de um total de 125 bilhões de dólares para o ano fiscal de 2012”. As contas são simples: o dinheiro deveria ir para os estados, em lugar de ser gasto em um estado de guerra.
O presidente Barack Obama não dá sinais de que vá terminar nem a ocupação do Iraque nem a atual guerra no Afeganistão. Pelo contrário, durante a campanha eleitoral prometeu ampliar a guerra no Afeganistão e essa promessa se cumpriu. Então, como marcha a guerra de Obama? Não muito bem.
Durante este período, foi registrado o maior número de mortes de civis no Afeganistão desde que começou a invasão encabeçada pelos Estados Unidos em outubro de 2001. Informou-se que, recentemente, sessenta e cinco civis foram assassinados em Kunar, perto do Paquistão, onde o aumento das mortes de civis provocou o aumento do apoio popular para o Talibã. Em 2010, também se deu o maior número de mortes de soldados estadunidenses, chegando a um total de 711 estadunidenses e aliados mortos no Afeganistão. O número de soldados mortos segue alto em 2011 e a previsão é de que os enfrentamentos se intensifiquem quando terminar o inverno.
O Washington Post informou recentemente que o controvertido programa de aviões não tripulados de Obama, implementado pela CIA, por meio do qual aviões não tripulados sobrevoam zonas rurais do Paquistão para lançar mísseis Hellfire contra supostos “militantes suspeitos”, matou pelo menos 581 pessoas, das quais apenas duas estavam em uma lista estadunidense de pessoas suspeitas de ser “militantes de alto nível”. Há muitas provas de que os ataques com aviões não tripulados, que aumentaram drasticamente durante o governo de Obama, matam civis, sem mencionar o apoio civil paquistanês aos EUA.
Enquanto isso, no Iraque, a democracia que os neoconservadores em Washington pretendiam entregar a ponta de pistola com sua estratégia de “impacto e intimidação” poderia finalmente estar chegando, não com a ajuda dos EUA, mas sim inspirada nos levantes populares pacíficos na Tunísia e no Egito. No entanto, a Human Rights Watch acaba de informar que enquanto as pessoas protestam e os dissidentes se organizam, “os direitos dos cidadãos mais vulneráveis do Iraque, especialmente mulheres e presos, são violados sistemática e impunemente”.
Samer Muscati, investigador da Human Rights Watch no Iraque acaba de sair desse país. Ele disse: “Uma das coisas que temos monitorado é a tortura no Iraque. E lamentavelmente a tortura segue sendo sistemática e generalizada nos centros de detenção. Os detentos se queixam habitualmente dos maus tratos que sofrem. Quando estivemos lá há duas semanas, descobrimos outra prisão secreta em Bagdá, administrada por forças de segurança de elite, ligadas ao escritório do ministro, sem nenhum tipo de prestação de contas. E estas forças mantiveram os mantidos incomunicáveis. Efetivamente, estão desaparecidos. Não têm contato com seus familiares nem com advogados, e os inspetores de direitos humanos estão proibidos de visitá-los. Então os problemas de direitos humanos no Iraque são graves”.
Surgiram protestos em outra Praça Tahrir, em Bagdá (sim, Tahrir significação “libertação” no Iraque e no Egito), contra a corrupção e para exigir empregos e melhores serviços públicos. As forças do governo iraquiano mataram 29 pessoas no fim de semana e detiveram outras 300, entre elas trabalhadores da área de direitos humanos e jornalistas.
No entanto, os Estados Unidos continuam desviando dinheiro e soldados para estas guerras intermináveis. Michael Hastings, da revista Rolling Stone, cujo artigo trouxe à luz o comportamento inaceitável do general Stanley McChrystal, acaba de expor o que denomina uma operação ilegal do tenente general William Caldwell no Afeganistão, na qual o exército dos Estados Unidos montou uma “operação psicológica” contra senadores estadunidenses e outras autoridades que visitavam o país, para obter apoio e mais financiamento. Segundo uma das fontes militares de Hastings, Caldwell perguntou: “O que temos que fazer para que esses tipos nos mandem mais gente? O que preciso pôr na cabeça deles?”.
Arnold Fields, inspetor geral especial para a reconstrução do Afeganistão (SIGAR, na sigla em inglês), recentemente aposentado, acaba de informar que 11,4 bilhões de dólares estão em risco devido a um planejamento inadequado. Outro grupo, a Comissão Estadunidense para Contratos em Tempos de Guerra “concluiu que os EUA desperdiçaram dezenas de bilhões de dólares dos quase 200 bilhões gastos em contratos e subsídios desde 2002 para apoiar as operações militares, de reconstrução e outras operações do país no Iraque e Afeganistão”.
Isso nos remete aos professores, enfermeiros, policiais e bombeiros em Wisconsin. Mahlon Mitchell, presidente dos Bombeiros Profissionais de Wisconsin, me disse na praça do Capitólio, em Madison, por que os bombeiros sindicalizados estavam ali, apesar de seu sindicato não estar entre os afetados pelo projeto de lei do governador Scott Walker.
Mahlon Mitchell disse: “Sabemos que o governador estava utilizando a tática de nos dividir para reinar. Isso é um ataque à classe média. Basicamente está tratando de separar a classe média e os sindicatos para nos enfrentar e se livrar de nós e da negociação coletiva. Nós não íamos ficar sentados esperando que isso acontecesse”.
Se deixarmos de atacar o povo no Iraque e no Afeganistão, podemos evitar estes ataques contra os pobres e a classe média em nosso país.
(*) Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna.
(**) Amy Goodman é apresentadora do Democracy Now!, um noticiario internacional transmitido diariamente para mais de 600 emissoras de rádio e televisão em inglês e em mais de 300 em español. É co-autora do libro “Os que lutam contra o sistema: heróis ordinários em tempos extraordinários nos Estados Unidos”, editado pelo Le Monde Diplomatique Cone Sul.
Tradução: Katarina Peixoto
(Matérias transcritas do site http://www.cartamaior.com.br/)
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