Por Leandro Fortes
Na íntegra do discurso de Dilma Rousseff proferido na cerimônia de aniversário de 90 anos da Folha de S.Paulo, disponibilizado na internet pela página do Portal UOL, lê-se, não sem certo espanto: “Estou aqui representando a Presidência da República. Estou aqui como presidente da República”. Das duas uma: ou Dilma abriu mão, em um discurso oficial, de sua batalha pessoal para ser chamada de “presidenta”, ou, mais grave, a transcrição de seu discurso foi alterada para se enquadrar aos ditames do anfitrião, que a chama ostensivamente de “presidente”, muito mais por birra do que por purismo gramatical.
Caso tenha, de fato, por conta própria, aberto mão do título de “presidenta” que, até então, lhe parecia tão caro, este terá sido, contudo, o menor dos pecados de Dilma Rousseff no regabofe de 90 anos da Folha.
Explica-se: é a mesma Folha que estampou uma ficha falsa da atual presidenta em sua primeira página, dando início a uma campanha oficial que pretendia estigmatizá-la, às vésperas da campanha eleitoral de 2010, como terrorista, assaltante de banco e assassina. A ela e a seus companheiros de luta, alguns mortos no combate à ditadura.
Ditadura, aliás, chamada de “ditabranda”, pela mesma Folha.
Esta mesma Folha que, ainda na campanha de 2010, escalou um colunista para, imbuído de sutileza cavalar, chamá-la, e à atual senadora Marta Suplicy, de vadia e vagabunda.
Essa mesma Folha, ora homenageada com a presença de Dilma Rousseff.
Digo o menor dos pecados porque o maior, o mais grave, o inaceitável, não foi o de submeter a Presidência da República a um duvidoso rito de diplomacia de uma malfadada estratégia de realpolitik. O pecado capital de Dilma foi ter, quase que de maneira singela, corroborado com a falsa retórica da velha mídia sobre liberdade de imprensa e de expressão. Em noite de gala da rua Barão de Limeira, a presidenta usou como seu o discurso distorcido sobre dois temas distintos transformados, deliberadamente, em um só para, justamente, não ser uma coisa nem outra. Uma manipulação conceitual bolada como estratégia de defesa e ataque prévios à possível disposição do governo em rever as leis e normas que transformaram o Brasil num país dominado por barões de mídia dispostos, quando necessário, a apelar para o golpismo editorial puro e simples.
A liberdade de expressão que garantiu o surgimento de uma blogosfera crítica e atuante durante a guerra eleitoral de 2010 nada tem a ver com aquela outra, defendida pela Associação Nacional dos Jornais, comandada por uma executiva da Folha de S.Paulo. São posições, na verdade, antagônicas. A Dilma, é bom lembrar, a Folha jamais pediu desculpas (nem a seus próprios leitores, diga-se de passagem) por ter ostentado uma ficha falsa fabricada por sites de extrema-direita e vendida, nas bancas, como produto oficial do DOPS. Jamais.
Ao comparecer ao aniversário da Folha, a quem, imagina-se, deve ter processado por conta da ficha falsa, Dilma se fez acompanhar de um séquito no qual se incluiu o ministro da Justiça. Fez, assim, uma concessão que está no cerne das muitas desgraças recentes da história política brasileira, baseada na arte de beijar a mão do algoz na esperança, tão vã como previsível, de que esta não irá outra vez se levantar contra ela. Ledo engano. Estão a preparar-lhe uma outra surra, desta feita, e sempre por ironia, com o chicote da liberdade de imprensa, de expressão, cada vez mais a tomar do patriotismo o status de último refúgio dos canalhas.
Dilma foi torturada em um cárcere da ditadura, esta mesma, dita branda, que usufruiu de veículos da Folha para transporte e remoção de prisioneiros políticos – acusação feita pela jornalista Beatriz Kushnir no livro “Cães de guarda” (Editora Boitempo), nunca refutada pelos donos do jornal.
A presidenta conhece a verdadeira natureza dos agressores. Deveria saber, portanto, da proverbial inutilidade de se colocar civilizadamente entre eles.
(Transcrito do blog http://www.brasiliaeuvi.com/ )
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O ESPECTRO LULA
Por EMIR SADER
O anticomunismo é o ultimo refúgio das elites brasileiras em pânico. Cada vez que vêem seus interesses e seus privilégios em perigo, apelam para o expediente do “espectro do comunismo”. Foi em seu nome que se fizeram as piores coisas na história brasileira, incluído o golpe de 1964, perpetrado pelo suposto risco que o comunismo traria para a democracia, para instaurar a pior ditadura que o Brasil já conheceu.
Por que se apela de novo para o “espectro do comunismo”? Porque essas mesmas elites passaram do desespero ao desalento, ao verem seus candidatos serem derrotados pela terceira vez em seguida e se darem conta que o país – que sempre consideraram deles – escapar entre seus dedos.
O fantasma que assusta as elites dominantes se chama Lula. Conseguiram contorná-lo por muito tempo, até que o fracasso do presidente dos seus sonhos – FHC – acabou abrindo espaço para que Lula fosse eleito, em 2002.
Lula começou sob os olhares confiantes dos que consideravam que ele não seria capaz de controlar uma herança econômica de depressão profunda e prolongada, além de descontrole inflacionário, endividamento alto, déficits da balança comercial e de pagamentos, reservas baixas e cartas de compromisso assinadas com o FMI que comprometiam a soberania nacional e a possibilidade de fortalecer o Estado e desenvolver politicas sociais.
Em seguida, quando se deram contra das precauções com que o Lula assumia, passaram a atacá-lo por supostamente tomar de assalto o aparelho de Estado pelos partidos de esquerda, pelos sindicatos. Tentaram a derrubada do governo em 2005, mas ao temer as reações populares, trataram de deixá-lo sangrar até ser derrotado nas eleições de 2006.
Derrotados, o editor chefe de um dos jornais da direita dava murros na mesa enquanto andava, raivoso, em torno dela, na reunião do comitê de redação da empresa, gritando: “Onde é que nós erramos. Onde é que nós erramos?” (O mesmo personagem que tinha interpelado Lula em almoço na redação da sua empresa sobre como ele pensava governar o Brasil, se não sabia falar inglês?)
Tiveram que conviver com o Lula por dois mandatos e, pior (para eles), um presidente que foi recebendo apoios populares de forma crescente e inédita, na mesma medida em que a velha mídia perdia credibilidade e audiência. E passava a diminuir, pela primeira vez, a desigualdade que as elites tinham produzido como característica marcante do Brasil, rompendo com todos os dogmas que essa mesma elite jurava que eram inalteráveis.
O espectro que assusta as elites dominantes hoje, no Brasil, não é outro, senão o espectro Lula. O das camadas populares que passaram a ter seus direitos minimamente garantidos, que passam a ter consciência que um deles pode chegar a governar o Brasil e o faz de maneira incomparavelmente superior do que todos os anteriores representantes daquelas elites.
Lula tira o sono das elites e dos seus ventríloquos na velha mídia. Acreditaram nas pesquisas e se jogaram por inteiro atrás do seu candidato contra Dilma, até que tiveram que se ater à realidade de que o Brasil mudou - apesar deles. Resta-lhes acenar velhos fantasmas como o “espectro do comunismo”, quando o medo deles é do Lula, é medo do povo, é medo da democracia, é medo do Brasil.
(Publicado no Blog do Emir, transcrito do site http://www.cartacapital.com.br/)
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Maus humores à esquerda
A presidenta Dilma Rousseff aproxima-se do centésimo dia de governo. A data é antecedida pela inquietação que afeta setores do Partido dos Trabalhadores. Uma angústia que se reflete na bancada petista do Congresso, que, por sua vez, transmite o desassossego embutido em dúvidas correntes nas bases do PT.
Centésimo dia é data emblemática. Sugere, por exemplo, o balanço do que tem sido feito até agora. Embora seja um tempo curto demais para julgamentos profundos, permite, no entanto, delinear contornos das ações que marcaram esse começo, indicativas dos rumos seguintes.
O mais forte sinal seria, segundo os descontentes, a desidratação na identidade ideológica de esquerda, mantida ao longo do governo Lula. Isso, não por acaso, teria fortalecido a influência do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci.
Ao contrário de Lula, a sucessora é que tem vínculos históricos com a esquerda, mas a presença de Palocci contrasta com a ausência de quadros de influência no governo Lula, a sinalizarem um viés político mais à esquerda. As figuras mais citadas são: Celso Amorim, Franklin Martins, Luiz Dulci e Marco Aurélio Garcia, o qual, embora mantido no Planalto, teria perdido parte do seu peso de conselheiro influente.
Essa agitação, em razão de outros problemas, se alastra por diversos setores da base governista. Nesses casos, é sequela da queda de braço na fixação do novo salário mínimo que deixou desnorteado o titubeante ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Somem-se a isso o aumento da taxa de juros e o corte de 50 bilhões de reais no Orçamento.
Existe dificuldade entre os petistas para assumir as alianças que levaram Dilma ao poder. Desta vez há um parceiro forte que, desde o início, marcou como ponto fundamental do acordo político-eleitoral a partir da indicação do candidato a vice.
Nas entranhas do PT há reflexo a partir de mudanças expressivas nas ações da chancelaria desde a restrição da violação dos direitos humanos no Irã. A objeção é estranha. Como sustentar a condenação da violação dos direitos humanos, durante a ditadura no Brasil e se omitir quando isso ocorre além-fronteira? Observe-se que a presidenta também se referiu a Guantánamo.
Os murmúrios de insatisfação também aludem a um pretenso realinhamento com a política externa americana, em oposição às relações com a Venezuela.
A rigor, a referência feita por Dilma às violações cometidas pelos americanos contrasta com essa suposição. Sabe-se, porém, que depois de receber Obama, visitante iminente, a presidenta irá à Venezuela para encontrar-se com Chávez.
A mineira Dilma não se aproxima depressa demais desse país para não criar açodamento, mas, também, nem tão devagar para evitar distanciamento.
Embora tenha deixado para trás os tempos do “assembleísmo”, alcançando com Lula o poder máximo do País há oito anos, o PT ainda guarda uma estreita relação com os movimentos sociais que sempre exigem prestação de contas. Ao fim, é o ingrediente mais importante nesse fermento que se forma no partido.
Os petistas estão escabreados com a corte que, no momento, a mídia faz a Dilma. Eles ainda guardam as marcas deixadas pela “guerra suja” em que foi transformada a campanha presidencial em outubro de 2010.
Essa reação projeta, certamente, o receio de que a regulação dos meios de comunicação, guardada com zelo pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, seja esquecida pelo caminho. Essa é uma medida necessária para fortalecer a democracia e não para coibir a liberdade de expressão.
Centésimo dia é data emblemática. Sugere, por exemplo, o balanço do que tem sido feito até agora. Embora seja um tempo curto demais para julgamentos profundos, permite, no entanto, delinear contornos das ações que marcaram esse começo, indicativas dos rumos seguintes.
O mais forte sinal seria, segundo os descontentes, a desidratação na identidade ideológica de esquerda, mantida ao longo do governo Lula. Isso, não por acaso, teria fortalecido a influência do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci.
Ao contrário de Lula, a sucessora é que tem vínculos históricos com a esquerda, mas a presença de Palocci contrasta com a ausência de quadros de influência no governo Lula, a sinalizarem um viés político mais à esquerda. As figuras mais citadas são: Celso Amorim, Franklin Martins, Luiz Dulci e Marco Aurélio Garcia, o qual, embora mantido no Planalto, teria perdido parte do seu peso de conselheiro influente.
Essa agitação, em razão de outros problemas, se alastra por diversos setores da base governista. Nesses casos, é sequela da queda de braço na fixação do novo salário mínimo que deixou desnorteado o titubeante ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Somem-se a isso o aumento da taxa de juros e o corte de 50 bilhões de reais no Orçamento.
Existe dificuldade entre os petistas para assumir as alianças que levaram Dilma ao poder. Desta vez há um parceiro forte que, desde o início, marcou como ponto fundamental do acordo político-eleitoral a partir da indicação do candidato a vice.
Nas entranhas do PT há reflexo a partir de mudanças expressivas nas ações da chancelaria desde a restrição da violação dos direitos humanos no Irã. A objeção é estranha. Como sustentar a condenação da violação dos direitos humanos, durante a ditadura no Brasil e se omitir quando isso ocorre além-fronteira? Observe-se que a presidenta também se referiu a Guantánamo.
Os murmúrios de insatisfação também aludem a um pretenso realinhamento com a política externa americana, em oposição às relações com a Venezuela.
A rigor, a referência feita por Dilma às violações cometidas pelos americanos contrasta com essa suposição. Sabe-se, porém, que depois de receber Obama, visitante iminente, a presidenta irá à Venezuela para encontrar-se com Chávez.
A mineira Dilma não se aproxima depressa demais desse país para não criar açodamento, mas, também, nem tão devagar para evitar distanciamento.
Embora tenha deixado para trás os tempos do “assembleísmo”, alcançando com Lula o poder máximo do País há oito anos, o PT ainda guarda uma estreita relação com os movimentos sociais que sempre exigem prestação de contas. Ao fim, é o ingrediente mais importante nesse fermento que se forma no partido.
Os petistas estão escabreados com a corte que, no momento, a mídia faz a Dilma. Eles ainda guardam as marcas deixadas pela “guerra suja” em que foi transformada a campanha presidencial em outubro de 2010.
Essa reação projeta, certamente, o receio de que a regulação dos meios de comunicação, guardada com zelo pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, seja esquecida pelo caminho. Essa é uma medida necessária para fortalecer a democracia e não para coibir a liberdade de expressão.
O que não consigo entender é essa capacidade
ResponderExcluirda chamada "grande imprensa", de encurralar os
governantes. São temerosos, os governantes, em
enfrentar, peitar esses poderosos da mídia.
Será que todos têm rabo preso? Pois a arma
que o chamado quarto poder utiliza é a chan-
tagem.
Meu comentário anterior se refere ao artigo
ResponderExcluirDILMA NA COVA DOS LEÕES. Aproveitando, pergunto:
que necessidade tinha a presidenta de com-
parecer a esse evento?