A França e o Brasil, na esquina do futuro
Mauro Santayana, no Jornal do Brasil
Por outro lado, ele foi um dos numerosos chefes de Estado europeus que — sem direito à palavra — teve que assistir à presidente Dilma Rousseff, três dias antes, discursar da tribuna de honra, ao lado de Obama, Ban Ki Moon, de Raúl Castro e do vice-presidente chinês, e do representante indiano, na cerimônia em homenagem ao presidente Nelson Mandela, no Soccer City Stadium, em Johannesburgo.
Ao visitar o Brasil, um ano depois da ida de Dilma Rousseff à França, Hollande veio, principalmente, fazer negócios. Em sua comitiva estavam vários executivos de empresas francesas instaladas no Brasil, além do CEO da Dassault, que tenta vender ao Brasil os aviões Raffale, no âmbito do Programa F-X.
Nos últimos anos os franceses têm feito excelentes negócios com o Brasil. Cobraram bilhões pela tecnologia de submarinos Scórpene já obsoletos, e pelo casco de nosso submarino atômico, sem transferir nenhum conhecimento sensível, do ponto de vista ofensivo ou nuclear, já que até mesmo o reator dessa nave terá que ser desenvolvido de forma independente pela Marinha. Suas empresas têm participado de vultosos contratos na área de energia e telecomunicações, que incluem turbinas hidrelétricas, o reator de Angra 3, o novo satélite que substituirá os antigos Brasilsats, privatizados e entregues, no final da década de 1990, a capitais estrangeiros.
Nada disso chega a representar, por mais boa vontade os franceses queiram mostrar — elogiando nosso baixo endividamento na Fiesp, ou declarando apoio à entrada do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU — uma efetiva “parceria estratégica”.
Para a Europa ou os Estados Unidos, será sempre mais “estratégico” o vizinho do outro lado do Atlântico que qualquer país do Hemisfério Sul, a não ser que, um dia, o Brasil venha a se integrar à aliança ocidental, na mesma posição subalterna a que se habituaram a nos ver e manter no passado. Falar em “parceria estratégica”, a longo prazo, entre Brasil e França, portanto, é tão irreal como falar de “parceria estratégica” entre o Brasil e os EUA, ou o Brasil e a própria União Europeia. Não podemos nos permitir agir com ingenuidade, em um mundo guiado mais pelas conveniências do que pela solidariedade.
Isso não quer dizer que o Brasil deva fechar as portas para ninguém. Se for interessante fazer um acordo comercial com a União Europeia, que o façamos. O mesmo vale para os Estados Unidos, ou acordos pontuais com a França e a Alemanha, como ocorre na ONU, agora, com a iniciativa sobre a internet.
Na nova ordem multilateral que se avizinha — com vários polos de poder ao invés de um — temos que agir orientados, sempre, pelos nossos interesses como nação, sabendo separar as alianças circunstanciais, de interesse mútuo, daquelas que podem efetivamente, mudar a história, e o futuro do povo brasileiro.
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