estrangeiros?
Marcelo Pellegrini, na Revista CartaCapital
A falta de médicos do Brasil é um problema crônico que atinge principalmente áreas carentes e de difícil acesso do Norte e do Nordeste do País e que parece longe de ser solucionada. Desde que assumiu a pasta da Saúde, em 2011, o ministro Alexandre Padilha tem apostado em programas de residências médicas ainda incipientes e no aumento da oferta de vagas em medicina nas universidades federais. Contudo, a formação de profissionais de saúde leva tempo e, a curto prazo, restou ao ministério apelar para a importação de médicos.
A proposta foi divulgada nesta semana. Na segunda-feira 6, os ministros das Relações Exteriores, Antonio Patriota, e o cubano Bruno Eduardo Rodríguez Parrilla anunciaram uma parceria para que 6 mil médicos cubanos sejam enviados ao Brasil. Na terça-feira 7, Padilha afirmou que médicos portugueses e espanhóis também estão na mira do governo federal. "Como ministro da Saúde, não vou ficar vendo a situação de Espanha e Portugal - que têm médicos de muita qualidade, que falam português e que vivem uma situação de 30% de desemprego - sem pensar em alternativas de intercâmbio para trazer esses profissionais", disse Padilha.
Segundo dados do Ministério da Saúde há, no Brasil, 1,8 médico para cada mil habitantes. Na Argentina, a proporção é de 3,2 médicos para mil habitantes e, em países como Espanha e Portugal, essa relação é de 4 médicos. Uma das formas de resolver este problema, segundo Padilha, seria emular as experiências de países desenvolvidos como a Inglaterra, onde 40% dos médicos foram atraídos de outros países, Canadá onde 22% dos médicos são estrangeiros, e Austrália, onde essa participação é 17%.
A proposta de trazer profissionais de fora do País não é exclusiva do ministério. Em 2012, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) classificou como “insustentável” a falta de médicos na região amazônica e o número de mortes decorrentes dessa carência. Vanessa contou que, dos 62 municípios do Amazonas, apenas 12 têm médicos especialistas e pediu a permissão para a entrada de médicos bolivianos no estado. A ideia também não é nova. Em 1999, então como ministro da Saúde, José Serra (PSDB) defendeu a 'importação" de médicos cubanos. No ano seguinte, o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fez o mesmo.
Resistência
A solução enfrenta resistência no Brasil. Na terça-feira 7, foram apresentados os resultados do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos - necessário para que estrangeiros possam exercer a profissão no Brasil. O resultado do exame mostrou uma situação crítica: dos 182 médicos cubanos que realizaram a prova em 2012, apenas 20 foram aprovados. O mesmo aconteceu com profissionais de outros países latinos, como Portugal e Espanha. Entre os 26 médicos com diploma espanhol, somente cinco foram aprovados em 2012. Já os portugueses tiveram três aprovados dentre oito inscritos.
“Se os médicos formados no exterior vêm exercer a profissão sem nenhum critério de avaliação de suas qualificações, isso é temerário. Naturalmente, traz à população grandes riscos, principalmente a parte da população mais carente. Isso não se configura como uma medida legal, nem justa”, disse o vice-presidente do Conselho Federal de Medicina, Vital Corrêa, reafirmando a necessidade do exame. Padilha disse que concorda que a contratação de médicos tem de considerar a qualidade e a responsabilidade desses profissionais. O ministro destacou que o governo já descartou a validação automática de diplomas e a contratação de médicos de países que tenham menos profissionais que o Brasil, como é o caso da Bolívia e do Paraguai.
Desigualdade na distribuição de médicos é preocupante
De acordo com um levantamento realizado em 2012 pelo CFM, a origem do problema de saúde pública no Brasil reside na péssima distribuição de médicos pelo território. Enquanto a região Sudeste possui 2,67 médicos com registro ativo no CFM por cada mil habitantes, a região Norte apresenta apenas 1,01 médico para mil pessoas.
A desigualdade fica mais explícita quando se compara as capitais. Cidades como Porto Alegre e Rio de Janeiro têm, respectivamente, 8,73 e 6,18 médicos para mil habitantes, enquanto Rio Branco e Macapá apresentam 1,91 e 1,38, respectivamente.
Os dados comprovam que o problema brasileiro não é a falta de doutores. “O aumento do número global de médicos não significa a presença de profissionais em áreas sem provimento, mas sim, o inchaço de médicos em grandes centros” , diz o médico Mário Scheffer, responsável pelo estudo.
Cidades como Belterra, encravada no meio da floresta amazônica do estado do Pará, apresentam índices ainda piores. "Temos uma dificuldade muito grande para contratar médicos", conta Dilma Serrão, a prefeita de Belterra, município de 16 mil habitantes, incrustada no interior da Amazônia, no estado do Pará. “Recebemos 70 mil reais mensais do governo federal para custear os gastos com o hospital, os postos de saúde e pagar os médicos especialistas, que recebem 4 mil reais para atenderem duas vezes por semana”, detalha a prefeita. Quanto mais difícil é o acesso, maiores se tornam os salários dos médicos e o custo da saúde pública. “Os municípios ao longo da Transamazônica travam uma guerra salarial por médicos que chega a salários de 20 a 30 mil reais”, afirma Dilma. “A nossa situação, felizmente não é essa”, completa aliviada.
Para o médico Mário Scheffer, a solução passa pela construção de planos de carreiras federais e estaduais para profissionais de saúde do SUS. “O SUS está fragmentado e confuso, entregue a múltiplas organizações, cada uma com um processo de contratação e com salários diferentes”, diz. Hoje, a gestão do Sistema Único de Saúde é dividida entre os estados.
"Enquanto o País não tiver planos de carreira que incentivem, de fato, o médico a ocupar definitivamente ou rotativamente regiões de difícil acesso, a população seguirá negligenciada”, prevê o médico.
Apesar disso, não há nenhuma proposta concreta que vise a criação de um plano de carreira federal para médicos do SUS em desenvolvimento no Ministério da Saúde. O ministro Padilha - que recebe críticas dentro do próprio governo em relação a sua gestão frente à pasta - destacou que o governo descartou a validação automática de diplomas e a contratação de médicos de países que tenham menos profissionais que o Brasil, como é o caso da Bolívia e do Paraguai.
*Com informações da Agência Brasil
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