Inflação: o pulo do gato
Amir Khair, na Agência Carta Maior
O que inviabiliza a política econômica é o fantasma da inflação. Aniquilou o crescimento no governo FHC, que abusou da Selic elevada para combatê-la, não deixou aproveitar melhor o surto de crescimento internacional no governo Lula, frustrou o crescimento nos últimos dois anos e ameaça os próximos dois.
A inflação atinge a todos, reduzindo o poder de compra e prejudicando mais os mais pobres, que têm menos condições de se defender da alta de preços. Portanto, o enfrentamento da inflação é prioridade de qualquer governo. Mas como enfrentá-la?
Falsa solução - O pensamento dominante, inclusive de parte do governo, é o uso da Selic como o remédio para conter a inflação. É aí que ocorre o pulo do gato, ao se afirmar que precisa subir a Selic. Isso denota o atraso na política econômica do país. O consolo é que já foi pior. Armínio Fraga inaugurou o regime de metas para a inflação posicionando a Selic no seu recorde histórico de 45%. A banca internacional vibrou junto com os rentistas domésticos.
É mais provável que uma elevação da Selic prejudique mais a oferta do que a demanda, pois onera as empresas no custo financeiro e no capital de giro, o que pressiona preços, e não mexe na demanda, pois, num país de alto spread bancário a eficácia da alteração da taxa básica de juro quase nada altera a taxa de juro do tomador.
Mas alguns ainda defendem que o BC ao usar a Selic estaria orientando as expectativas dos agentes econômicos para a fixação dos preços. Mas essas expectativas se dão pela consulta à inflação passada e presente. Nada a ver com a Selic.
Além disso, segundo o BC, a alteração da Selic leva de seis meses a um ano (?) para surtir efeito. Nesse período tanta coisa pode acontecer que torna impossível caracterizar o eventual efeito.
Existem políticas adequadas para enfrentar a inflação como: a) a desoneração de produtos de consumo popular; b) redução e controle dos preços monitorados pelo governo; c) encarecimento do crédito por medidas macroprudenciais; d) estímulos à oferta por empréstimos com melhores condições e; e) controle de preços aos monopólios e oligopólios.
Determinantes do IPCA - O IPCA é influenciado em 36% pelos bens comercializáveis, 40% pelos não comercializáveis e 25% pelos monitorados. Vejamos esses componentes.
Comercializáveis - São todos os bens sujeitos à concorrência externa. A evolução dos seus preços depende do mercado internacional, que desde a crise de 2008, passa por acirrada concorrência.
Em 2011 a inflação desses bens foi de 4,4% e no ano passado 4,5%, portanto, no centro da meta de inflação. Os alimentos é que dispararam pelas quebras de safra nos Estados Unidos e Brasil.
Desde meados do ano passado o IPCA sem os alimentos está no nível de 4%, abaixo do centro da meta de 4,5%. Basta isso para derrubar os que usam o fantasma da inflação para elevar a Selic. Em adição, neste ano a safra é recorde, contribuindo para a queda da inflação.
E o que causou a elevação dos preços dos alimentos foram os in natura que cresceram nos últimos doze meses 55% (!). Interessante observar que há um ano esses alimentos tiveram deflação de 5,3% (!).
Não Comercializáveis - São basicamente os serviços que não estão sujeitos à concorrência externa. Desde 1997 até 2004 contribuíram para baixar a inflação e a partir de 2005 passaram a ser o vilão da inflação. A razão para isso é maior demanda do que oferta pelo acelerado crescimento da classe C.
Para conter os preços no curto prazo, alguns economistas ortodoxos defendem a política suicida de elevar o desemprego. O lamentável é que até alguns economistas não ortodoxos embarcaram nessa.
Se aumentar o desemprego, o resultado seria certamente a estagnação, com graves repercussões sociais. Como o governo não é irresponsável a esse ponto, esses economistas vão falar ao vento.
Enquanto não aumentar a oferta de serviços, atraída pela procura em expansão, não será possível evoluir os preços dos não comercializáveis abaixo do centro da meta de inflação.
Monitorados - São os que dependem de decisões do governo. Esses preços evoluíram acima da inflação desde 1995 até 2006, com média anual de 13,9% (!). A sociedade teve que aguentar isso, que é um subproduto da privatização marcada por forte elevação de tarifas para ampliar lucros.
A partir de 2007 tiveram crescimento médio anual de 3,8%, agindo como freio à inflação. Que o diga a Petrobras que foi fragilizada pelo governo, ignorando a posição estratégica para enfrentar o desafio do pré-sal e, ainda foi obrigada a fazer compras com forte conteúdo local e participação de 30% nos investimentos futuros. A crítica não é nos objetivos que foram determinados à empresa, mas a inviabilização de atingi-los pela política desastrosa de preços imposta.
Para romper com a paralisia econômica é necessário não se deixar levar pelo fantasma da inflação, nem pelo falso remédio da elevação da Selic em autêntico pulo do gato.
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