12 maio 2013

PARANOIA DA VIOLÊNCIA

Obsessão com noticiário policial
esconde crise de criatividade
jornalística


Carlos Castilho, no Observatório da Imprensa





A frequência e intensidade da cobertura policial nos telejornais brasileiros deixou de ser apenas preocupante para ser irritantemente monótona. Qualquer noticiário em qualquer horário apresenta uma massacrante sequência de ocorrências policiais, deixando no ar uma intrigante pergunta: trata-se de uma maquiavélica estratégia editorial para implantar a paranoia da violência na população ou é um sintoma da falta de criatividade das redações?
É difícil saber qual das duas hipóteses é a pior e mais danosa à relação de confiança entre a população e a imprensa. Uma relação que está sendo submetida a um triplo estresse. Se a criminalidade domina nos telejornais, nas páginas web de jornais a tendência é destacar informações bizarras ou fofocas de personalidades, enquanto nos jornais e revistas impressas predomina a preocupação em impor uma agenda política desfavorável ao governo e voltada para as eleições de 2014.
Assim fica fácil perceber a orfandade do público em relação à imprensa do país, pois, com raras exceções, os problemas concretos da população ficam em segundo plano. Uma das exceções é o jornal local da rede RBS em Florianópolis (SC), que regularmente identifica problemas de atendimento dos serviços públicos e cobra soluções das autoridades. Não sei se situação idêntica acontece noutras capitais brasileiras, porque moro em Floripa e não tenho acesso ao noticiário local de outras cidades. Os leitores podem me ajudar a montar um quadro mais completo postando comentários com informações.
Crime, escândalos e corrupção não são um monopólio da mídia brasileira. Nos Estados Unidos e até em alguns países europeus o noticiário local também está contaminado pelo vírus da violência. A máxima do “se sangrar é notícia” tem seguidores em todo o mundo, mas ela se tornou insuportável nos últimos tempos aqui no Brasil por falta de opções editoriais em redações que parecem dominadas pela falta de criatividade e ousadia jornalística.
É difícil encontrar razões editoriais para justificar uma cobertura tão detalhada e prolongada de julgamentos como os do goleiro Bruno, para um crime ocorrido em 2010, e o dos seguranças de PC Farias, morto há 17 anos. O noticiário quotidiano virou um circo de horrores em que o caso do norte-americano que sequestrou e estuprou três mulheres durante 10 anos vai logo ser substituído por outro caso tão ou mais macabro. 
O noticiário policial sempre foi um prato forte no menu dos jornais populares, nas rádios e nos telejornais, mas a concorrência feroz entre empresas jornalísticas fez com que elas passassem a focar em detalhes, mesmo sórdidos, e no impacto emocional. É quase uma regra induzir o entrevistado ao choro, no caso de televisão. As entrevistas de policiais, então, são um primor de jargão e recitação do Código Penal, principalmente sobre as penas a que está sujeito um suspeito.
Os editores parecem mais preocupados com a concorrência do que com o público que é obrigado a suportar a batalha de egos e de marqueteiros, enquanto reclama dos transportes, da falta de água, do atendimento médico e da escassez de vagas em creches e escolas primárias. Qualquer repórter que for a uma comunidade vai encontrar uma farta pauta para reportagens e principalmente campo para uma interação com moradores. Mas quando ele volta para a redação encontra uma realidade muito distinta: a da concorrência e subordinação à agenda política dos donos do jornal, revista ou emissora.


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