relançar o desenvolvimento
J. Carlos de Assis, na Agência Carta Maior
O governo deverá anunciar formalmente em breve um programa de
investimento em infraestrutura da ordem de R$ 600 bilhões em quatro anos, na
forma de PPP, ou seja, Parcerias Público-Privadas. É o mais ambicioso projeto de
inversões públicas desde o II Plano Nacional de Desenvolvimento do governo
Geisel, nos anos 70. Poderá, efetivamente, tirar a economia brasileira da
letargia em que se encontra desde os anos 80 – o crescimento de 2006 e de 2010
foram meros suspiros.
É a melhor notícia que se poderia esperar para formar um ambiente favorável à retomada acelerada do desenvolvimento sustentável. A despeito, porém, das condições favoráveis – os investimentos serão integralmente financiados pelo BNDES a uma taxa de juros anual de 5,5% –, temos que esperar a resposta do setor privado para verificar sua efetivação. Além disso, é necessário discutir as repercussões da taxa de retorno interna oferecida – de 9 a 15% – nos custos futuros da infraestrutura.
Os empresários parecem eufóricos pelo que se sentiu na reunião com o diretor do DNIT há cerca de duas semanas na Confederação Nacional da Indústria. Não é para menos. Serão de longuíssimos – 30 a 35 anos – os prazos de concessão, só ao fim dos quais os investimentos realizados retornam ao Estado. O fato é que as condições gerais do programa foram substancialmente melhoradas depois que as últimas licitações de concessões, prevendo taxas de retorno de 6,5%, ficaram desertas.
O programa representa uma mudança radical no conceito de investimento público no Brasil. É uma confissão implícita da incapacidade do Estado de realizar grandes obras de infraestrutura. O governo tinha duas opções: ou fazer uma profunda reforma do Estado de forma a recuperar sua capacidade de execução, o que poderia demandar anos, ou contornar as objeções ao “privatismo” mediante algum expediente de maior eficácia de garantisse as obras já, como é o caso do PAC.
A questão da incompetência do Estado para realizar obras diretamente já foi abordada nesta coluna. Na verdade, construiu-se um sistema de suposta prevenção de corrupção que na prática inviabiliza a construção em tempo regular de obras públicas. Obras sofrem interferência, desde a licitação, pelo Tribunal de Contas da União, pela Corregedoria Geral da União, pelo Ministério Público, por agências reguladoras, pelo Judiciário, por índios, por quilombolas, por órgãos ambientais, e assim por diante.
Não estou entrando no mérito dessas intervenções, pois muitas delas são justas. Mas é injusto para a sociedade que grandes obras públicas em andamento sejam paralisadas. Os controles teriam que ser posteriores, na prestação de contas, quando, diante de irregularidades verificadas, deveriam ser impostas pesadas multas. Contudo, é uma questão de fato que, para retomar obras paralisadas, o setor público tem muito maiores dificuldades de que o setor privado. Em geral, o resultado são elefantes brancos, ou seja, investimentos desperdiçados ou perdidos.
A PPP é uma forma de contornar, pelo menos em parte, essas dificuldades. E convenhamos que é uma forma mais inteligente de construir obras públicas novas do que simplesmente privatizar empresas estatais já construídas como se deu nos governos Collor e FHC. Para se entender bem isso deve-se levar em conta duas premissas: primeiro, que, a despeito da taxa de juros baixa, o empresário assume uma obrigação de pagamento futuro; portanto, não é uma doação; segundo, que, a despeito de longo prazo de concessão, ao fim dele o ativo financiado vem para o Estado.
Esse sistema me lembra do fantástico programa de financiamento de obras públicas praticado pelo genial banqueiro de Hitler, Hjalmar Schacht, para contornar as restrições de aumento de dívida pública na Alemanha dos anos 30. Diante da falta de credibilidade do Estado de lançar títulos de dívida (não é o nosso caso), ele fez com que quatro grandes grupos empresariais alemãs, cujas iniciais formaram a sigla MEFO, lançassem títulos privados, com garantia pública, sendo o dinheiro daí obtido usado no pagamento de obras públicas. Os ministérios realizavam as obras e pagavam o financiamento no tempo compatível com a maturação das dívidas.
Portanto, no esquema Schacht o setor privado viabilizava (aparentemente, porque a garantia dos títulos MEFO era pública) o financiamento, e o setor público realizava fisicamente as obras. No esquema que está sendo posto em marcha, o governo financia com recursos do Tesouro, operados pelo BNDES, e o setor privado executa as obras fisicamente. Ao final, o esquema brasileiro é socialmente mais vantajoso, porque os ativos construídos retornam às mãos do Estado ao fim das concessões.
Há duas possíveis restrições. Primeiro, por que no caso brasileiro o setor público, que oferece o financiamento, não faz a obra? Afinal, o impacto na dívida pública, nos dois casos, é neutralizado pela construção dos ativos. E a resposta já foi dada acima: com a estrutura atual do Estado, é impossível fazer grandes programas de obras públicas no Brasil. Segundo, e esta é a restrição mais séria, com a taxa de retorno interna prevista no programa o custo de algumas obras de infraestrutura no Brasil pode tornar-se proibitivo.
Entretanto, uma taxa menor pode não atrair as empresas. A única saída, a meu ver, é que o governo lance paralelamente um programa inteiramente público para construir obras de infraestrutura, sobretudo rodovias, de menor retorno. Do contrário, seremos todos esmagados por pedágios e taxas portuárias. Caso isso exija uma minirreforma do Estado, para remover obstáculos burocráticos, que se faça imediatamente em nome do interesse social.
É a melhor notícia que se poderia esperar para formar um ambiente favorável à retomada acelerada do desenvolvimento sustentável. A despeito, porém, das condições favoráveis – os investimentos serão integralmente financiados pelo BNDES a uma taxa de juros anual de 5,5% –, temos que esperar a resposta do setor privado para verificar sua efetivação. Além disso, é necessário discutir as repercussões da taxa de retorno interna oferecida – de 9 a 15% – nos custos futuros da infraestrutura.
Os empresários parecem eufóricos pelo que se sentiu na reunião com o diretor do DNIT há cerca de duas semanas na Confederação Nacional da Indústria. Não é para menos. Serão de longuíssimos – 30 a 35 anos – os prazos de concessão, só ao fim dos quais os investimentos realizados retornam ao Estado. O fato é que as condições gerais do programa foram substancialmente melhoradas depois que as últimas licitações de concessões, prevendo taxas de retorno de 6,5%, ficaram desertas.
O programa representa uma mudança radical no conceito de investimento público no Brasil. É uma confissão implícita da incapacidade do Estado de realizar grandes obras de infraestrutura. O governo tinha duas opções: ou fazer uma profunda reforma do Estado de forma a recuperar sua capacidade de execução, o que poderia demandar anos, ou contornar as objeções ao “privatismo” mediante algum expediente de maior eficácia de garantisse as obras já, como é o caso do PAC.
A questão da incompetência do Estado para realizar obras diretamente já foi abordada nesta coluna. Na verdade, construiu-se um sistema de suposta prevenção de corrupção que na prática inviabiliza a construção em tempo regular de obras públicas. Obras sofrem interferência, desde a licitação, pelo Tribunal de Contas da União, pela Corregedoria Geral da União, pelo Ministério Público, por agências reguladoras, pelo Judiciário, por índios, por quilombolas, por órgãos ambientais, e assim por diante.
Não estou entrando no mérito dessas intervenções, pois muitas delas são justas. Mas é injusto para a sociedade que grandes obras públicas em andamento sejam paralisadas. Os controles teriam que ser posteriores, na prestação de contas, quando, diante de irregularidades verificadas, deveriam ser impostas pesadas multas. Contudo, é uma questão de fato que, para retomar obras paralisadas, o setor público tem muito maiores dificuldades de que o setor privado. Em geral, o resultado são elefantes brancos, ou seja, investimentos desperdiçados ou perdidos.
A PPP é uma forma de contornar, pelo menos em parte, essas dificuldades. E convenhamos que é uma forma mais inteligente de construir obras públicas novas do que simplesmente privatizar empresas estatais já construídas como se deu nos governos Collor e FHC. Para se entender bem isso deve-se levar em conta duas premissas: primeiro, que, a despeito da taxa de juros baixa, o empresário assume uma obrigação de pagamento futuro; portanto, não é uma doação; segundo, que, a despeito de longo prazo de concessão, ao fim dele o ativo financiado vem para o Estado.
Esse sistema me lembra do fantástico programa de financiamento de obras públicas praticado pelo genial banqueiro de Hitler, Hjalmar Schacht, para contornar as restrições de aumento de dívida pública na Alemanha dos anos 30. Diante da falta de credibilidade do Estado de lançar títulos de dívida (não é o nosso caso), ele fez com que quatro grandes grupos empresariais alemãs, cujas iniciais formaram a sigla MEFO, lançassem títulos privados, com garantia pública, sendo o dinheiro daí obtido usado no pagamento de obras públicas. Os ministérios realizavam as obras e pagavam o financiamento no tempo compatível com a maturação das dívidas.
Portanto, no esquema Schacht o setor privado viabilizava (aparentemente, porque a garantia dos títulos MEFO era pública) o financiamento, e o setor público realizava fisicamente as obras. No esquema que está sendo posto em marcha, o governo financia com recursos do Tesouro, operados pelo BNDES, e o setor privado executa as obras fisicamente. Ao final, o esquema brasileiro é socialmente mais vantajoso, porque os ativos construídos retornam às mãos do Estado ao fim das concessões.
Há duas possíveis restrições. Primeiro, por que no caso brasileiro o setor público, que oferece o financiamento, não faz a obra? Afinal, o impacto na dívida pública, nos dois casos, é neutralizado pela construção dos ativos. E a resposta já foi dada acima: com a estrutura atual do Estado, é impossível fazer grandes programas de obras públicas no Brasil. Segundo, e esta é a restrição mais séria, com a taxa de retorno interna prevista no programa o custo de algumas obras de infraestrutura no Brasil pode tornar-se proibitivo.
Entretanto, uma taxa menor pode não atrair as empresas. A única saída, a meu ver, é que o governo lance paralelamente um programa inteiramente público para construir obras de infraestrutura, sobretudo rodovias, de menor retorno. Do contrário, seremos todos esmagados por pedágios e taxas portuárias. Caso isso exija uma minirreforma do Estado, para remover obstáculos burocráticos, que se faça imediatamente em nome do interesse social.
*Economista, professor de Economia Internacional da UEPB, autor, entre outras obras de economia política, de “A Razão de Deus”.
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