12 março 2013

A TOGA E A PENA

Muito barulho para nada


Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa




Não se pode afirmar que o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, esteja interessado em permanecer no noticiário, ou que tenha desenvolvido uma estratégia de comunicação para manter seu nome em evidência. O fato é que os jornais parecem ter descoberto que ele sempre pode render uma boa polêmica, e o ministro acaba se transformando em instituição, dessas que merecem um correspondente exclusivo.
Observe-se que, depois do episódio em que o presidente do STF destratou e ofendeu um repórter doEstado de S.Paulo, o jornalão paulista encenou um desagravo mas acabou substituindo o correspondente junto à Sua Excelência. Na edição de terça-feira (12/3), Joaquim Barbosa volta às manchetes do Estadão e da Folha de S. Paulo e ganha destaque no Globo com uma declaração de grande impacto: ele afirmou que os bancos são lenientes e omissos no controle da lavagem de dinheiro.
Trata-se de uma dessas verdades que todos conhecem mas a imprensa se recusa a encarar: evidentemente, o crime organizado, a corrupção e a exploração da fé por empreendedores religiosos só podem ser contidos quando os bancos aplicarem um controle mais rigoroso no dinheiro que transita pelo sistema. Se os bancos não fazem sua parte e aceitam movimentações de qualquer origem e para qualquer destino, fica impossível impedir a legalização do dinheiro sujo.
Escudadas em competentes assessorias de comunicação, as instituições financeiras evitaram comentar a declaração do ministro. Os dirigentes de bancos sabem que o jornalismo declaratório, mesmo quando verbaliza a opinião de um presidente do Supremo Tribunal Federal, é apenas fumaça: o fato de o ministro Joaquim Barbosa entender que o dinheiro de narcotraficantes, exploradores da fé alheia ou trambiqueiros do poder público é protegido pela ineficiência dos controles, não quer dizer que alguma coisa vai mudar.
O fato é que as instituições republicanas, seus representantes, a imprensa e o distinto público sabem que estamos vivendo um regime de fantasia, no qual todos fingem que um problema deixa de existir porque alguém disse alguma coisa.
Palavras, apenas palavras
Na vida real, o que as instituições públicas, inclusive o Judiciário em todas as suas instâncias, ensinam à sociedade é que o crime compensa. Veja-se a reportagem na Folha de S. Paulo de terça-feira, sobre o caso do professor que matou a esposa e segue recebendo pensão pela morte dela (ver aqui).
Chega a ter um toque de comicidade o presidente da Corte Suprema declarar que os bancos são omissos no combate à lavagem de dinheiro, porque soa como alguém declarar que vai chover esta tarde numa cidade do sudeste do Brasil.
Só para dar um exemplo: em 2010, os jornais revelaram que um ex-presidiário chamado Claudinei Santos, investigado sob a suspeita de lavar dinheiro para o grupo criminoso conhecido como PCC, era candidato a deputado federal pelo PSC (Partido Social Cristão). No dia 15 de setembro daquele ano, a polícia paulista iniciou uma megaoperação com uma centena de agentes, para levantar provas contra ele. Houve detenções, apreensão de bens, entre eles uma Ferrari F430, avaliada em cerca de R$ 1,5 milhão.
O que aconteceu com o sr. Santos? Segue transitando por aí a bordo de sua Ferrari. É acusado de administrar quinze postos de combustível e uma empresa de factoring pertencentes ao grupo criminoso, indícios mais do que evidentes de como o dinheiro é lavado.
As autoridades policiais que liberaram essas informações para a imprensa devem ser absolutamente levianas, a ponto de não se ouvir falar mais do ex-candidato a deputado. Por acaso, Claudinei Santos obteve sua candidatura no mesmo partido que tem como figura de proa o deputado e pastor evangélico Marco Feliciano, que se tornou presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados depois de haver dado grande contribuição ao descenso da sociedade brasileira rumo ao obscurantismo.
O que muda com a bombástica declaração do sr. ministro? Em outro país, se um juiz de província afirmasse que os bancos facilitam a vida de bandidos, isso seria tido como notícia-crime e possivelmente seria aberta uma investigação. No Brasil, o presidente do Supremo Tribunal Federal faz essa afirmação, ganha manchetes dos jornais e ninguém espera que aconteça alguma coisa.
É mesmo possível que ele tenha feito tal declaração, por recomendação de seus assessores de comunicação, apenas para apagar rapidamente sua última e desastrosa manifestação pública. Os bancos não vão se empenhar em impedir a lavagem de dinheiro, assim como o repórter do Estadão não vai chafurdar no lixo, porque o ministro mandou.
São palavras, apenas palavras.


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