26 maio 2012

SOCIEDADE/POLÍTICA/EDUCAÇÃO/FUTEBOL

COMO ENCARAR UMA GREVE?



A pigarra tucana



Saul Leblon, no Blog das Frases

 
É um velho truque do conservadorismo brasileiro reiterado ao longo da história: quando a raiz dos problemas repousa nas entranhas de seu aparelho administrativo ou no descaso histórico com as prioridades da população, desfralde-se a bandeira udenista da sabotagem perpetrada por 'agitadores'. 

A lenga-lenga exala naftalina e remete ao linguajar pré-golpe de 64, mas encontra em São Paulo 71 quilômetros de motivações para ser ressuscitada com regularidade suíça pela pigarra do PSDB. Nessa rede escandalosamente saturada e curta do metrô --inferior a da cidade do México, por exemplo, com 200 kms-- os registros de panes, acidentes e interrupções tem exibido frequência preocupante: só este ano foram 143 ocorrências, 33 delas sérias. 

Nesta 4ª feira, a pigarra conservadora aproveitou a greve salarial dos metroviários para isentar a gestão temerária por trás dos transtornos renitentes. A narrativa é a de um 'jornal da tosse'; gargantas raspando pastilhas Walda emitem denúncias de sabotagem e insinuam 'incêndios do Reichstag' de olho nas eleições municipais. Agitadores conturbam o ambiente da metrópole; não fosse isso, os serviços públicos tucans deslizariam no azeite fino de oliva. 

O ' jornal da tosse' por definição é pouco informativo: faltam-lhe pernas para driblar números adversos. Em 2011, o governador Alckmin investiu R$ 1,2 bi dos R$ 4,5 bilhões previstos para a expansão do metrô e não deixou por menos na ponta ferroviária: as compras de trens caíram à metade.No conjunto do sistema o recuo do investimento foi da ordem de 20% sobre 2010. A média tucana de  expansão dos trilhos tem sido de 2,35 kms/ano. Significa que nas mãos do PSDB a rede precisará de cinco décadas para se equiparar a do México.Até lá as gerações de paulistanos terão a oportunidade de vivenciar o sentido da expressão 'sardinha enlatada', com todos os riscos que a lata encerra. 

O 'jornal da tosse' passa ao largo dessas miunças que fazem do metrô de São Paulo o sistema de transporte mais saturado do mundo, com 11,5 milhões de passageiros/por km. Seu forte é a frase lacerdista. Com a palavra, um virtuose na arte, o comentarista da tosse José Serra, que limpa a garganta, ajeita a gengivite e sapeca: "É muito fácil hoje você paralisar o funcionamento de uma linha qualquer. Uma gravata, uma blusa na porta de uma vagão pode provocar [a paralisação]", disse o ex-governador e pré-candidato do conservadorismo ao comando da capital paulista. "Não digo que todas [as ocorrências) foram sabotagem, mas que algumas delas -- com certeza-- têm a ver com isso".( UOL 23-05).

Depois, com uma tossinha matreira o governador Geraldo Alckmin emenda: ' "Ano passado não teve eleição, nem nenhuma greve, este ano tem (eleição e greve). Será que é só coincidência?"(UOL, 23-05). 

O 'jornal da tosse' tem uma visão de mundo que o dispensa de atualizar o noticiário. Em setembro de 2010, em plena eleição presidencial, o metrô de São Paulo registrou uma megapane, seguida de protestos com 17 composições apedrejadas. A pigarra tucana emoldurou então a voz do governador em exercício Alberto Goldman, que não perdoou: 'Puseram uma blusa na porta de um vagão paralisando o sistema;isso cheira a sabotagem'. 

Dias depois, perícia do Instituto de Criminalística comprovou que a pane fora causada pelo colapso técnico do metrô paulistano. 'Mas a blusa estava lá', deu de ombros o pigarrento Goldman. Justiça seja feita, a narrativa tucana tem feito esforços de renovação. Soninha Francine, do PPS, incorporou-se à bancada da tosse desde o episódio de 2010, quando era chefe de campanha de Serra na Internet e comentou assim,pelo twitter, o acidente que deixou 250 mil pessoas a pé: "“Metrô de Spaulo tem problemas na proporção direta da proximidade com a eleição. Coincidência? #SABOTAGEM #valetudo #medo”.

Bela pigarreada, Soninha. No engavetamento do último dia 16 , quando duas composições colidiram numa pane do comando automático, ela reafirmou a disposição de injetar ar fresco no script udenista e dedilhou toda faceira no twitter: "Metrô caótico, é? Não fosse pela TV e o Twitter, nem saberia. Peguei linha verde e amarela; sussa". Convenhamos, 'sussa', num acidente com 143 feridos é uma pérola. A Soninha achou o tom da coisa: conservadorismo fantasiado de Vila Madalena. Essa pigarra leva jeito.



Greve expõe problemas no processo de
expansão do ensino superior



Brasília - A greve deflagrada pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), na quinta (17) passada, segue forte, com adesão crescente. Já são 42 universidades paradas, além de dois institutos e de um centro de formação técnica. Duas outras instituições já oficializaram ingresso no movimento a partir da próxima segunda. Os servidores técnicos-administrativos discutem a adesão e assembleias estudantis representativas, em todo o país, referendam o processo. Cenário raro em tempos de desmobilização do movimento sindical. 

Para o professor da Universidade Federal do Rio Grande (UFRG), Billy Graeff, membro do Comando Nacional de Greve do Andes-SN, a surpreendente mobilização se ancora no fato de que esta é uma greve atípica, centrada não na luta mais imediata da categoria por reajuste salarial, mas em questões conjunturais que afetam o conjunto da comunidade acadêmica. E, consequentemente, o projeto de oferta de um ensino público de qualidade no país.

A pauta de reivindicações da categoria está centrada em dois pontos principais: a reestruturação da carreira docente, considerada pouco atraente e funcional há décadas, e a melhoria nas condições de trabalho. 

A primeira, segundo o Sindicato, já havia sido negociada com o governo, para ser implantada até o final de março deste ano, junto ao reajuste de 4%, acordado em 2010. O reajuste saiu, por meio de medida provisória enviada ao congresso pela presidenta Dilma Rousseff em 14 de maio, mas a reestruturação da carreira permaneceu pendente. “Nós estamos negociando desde agosto de 2010, mas o governo se mostra intransigente frente às nossas reivindicações”, justifica. 

A segunda decorre de uma insatisfação latente da categoria, compartilhada com estudantes e servidores técnicos-administrativos. “Os professores não suportam mais esses anos de expansão universitária irresponsável”, afirma o professor. Ele se refere ao programa de expansão universitária iniciado durante o governo Lula, o Reuni, mais efetivamente entre 2006 e 2008. Segundo o professor, aumentou-se o número de alunos matriculados nas universidades, sem a devida contrapartida em contratação de pessoal e ampliação da infraestrutura.

“Estamos preparando um dossiê da precarização para mostrar a verdadeira face do Reuni”, conta Billy. Conforme ele, os problemas são inúmeros, principalmente nos campi novos e nos cursos recém implantados. Faltam professores, laboratórios, bibliotecas, restaurantes universitários, casas do estudante e até banheiros. “Estamos levantando também a qualidade dos prédios recém construídos e os problemas ambientais decorrentes dessas obras. As denúncias são alarmantes”, antecipa. 

Em entrevista coletiva nesta quarta (23), o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, disse que todos os acordos firmados em 2011 com os professores universitários da rede federal foram cumpridos pelo governo. Segundo ele, a negociação referente à reestruturação da carreira é para 2013 e ainda está aberta. E acrescentou que há tempo até 31 agosto para enviar a proposta para a aprovação do orçamento no Congresso. “A greve faz parte da democracia, mas quando se faz um acordo e o governo cumpre, não consigo ver razões e necessidade de uma greve. Não há qualquer prejuízo material para os docentes”, esclareceu. 

O ministro acrescentou que uma paralisação, neste momento, não contribui para o esforço que o Brasil faz para desenvolver o ensino superior. “São 220 mil novas vagas, 14 universidades e 132 novos campi para dar suporte a esse 1 milhão de matrículas. Desde 2005, investimos R$ 8,4 bilhões na reestruturação da rede federal. Somente em 2012, o investimento é de R$ 1,4 bilhão. Temos 3.427 obras”, anunciou. 

Expectativas
No próximo dia 28, os professores realizam nova reunião com o governo para tentar solucionar o impasse. 

No dia 5/6, outras categorias de servidores públicos federais se juntam aos professores para realizar uma marcha à Brasília. Após o protesto, realizarão plenária unificada em que será discutida a possibilidade de paralisação de novas categorias, a partir de 11/6. 

Os servidores públicos defendem pautas específicas, mas também uma com eixos comuns, como a definição da data-base em 1° de maio; política salarial permanente com reposição inflacionária e reajuste linear em 22,08% (referente a soma da inflação de maio de 2010 e maio de 2012 e a variação do PIB neste mesmo período); e valorização do salário base e incorporação das gratificações.

Os servidores reivindicam, também, a retirada do Congresso dos projetos de lei e medidas provisórias que, conforme análise das categorias, ferem direitos conquistados pelos trabalhadores.



Fonte: www.cartamaior.com.br 




DIREITOS HUMANOS


(Brasil, te cuida!)


Anistia Internacional critica governos que
não respondem às demandas sociais


Marcelo Justo - De Londres
Londres - Em meio à crise econômica e política no mundo árabe e na União Europeia o informe anual da Anistia Internacional criticou duramente os governos por sua falta de resposta às demandas sociais. “De Nova York e Moscou a Londres e Atenas, de Dakar e Kampala a La Paz e Cuernavaca, de Phom Penh a Toquio, as pessoas saíram às ruas. Foi patente o contraste entre a valentia dos que exigem direitos e a incapacidade dos líderes para responder com medidas concretas”, assinalou o secretário geral da Anistia Internacional Salil Shetty”.

O informe global 2012 da organização de direitos humanos com sede em Londres envolve desde as rebeliões que sacudiram o mundo árabe a partir da imolação de um vendedor ambulante tunisiano no início do ano passado até as manifestações contra os programas de austeridade que sacodem o mundo desenvolvido. “A crise econômica expôs uma ruptura do pacto social entre o governo e a cidadania. No melhor dos casos, os governos se mostraram indiferentes. Muitas vezes só se preocuparam em proteger os poderosos”, destacou Shetty.

No mundo árabe esse pacto social era uma quimera que só começou a aparecer com o começo da rebelião. “A resposta dos governos à Primavera Árabe foi brutal e o Ocidente se preocupou mais em manter o status quo do que em promover a democracia, tudo agravado por uma retórica crescentemente xenófoba da União Europeia ante o considerável número de refugiados que começaram a chegar do norte da África. Hoje a Primavera Árabe está se convertendo em muitos aspectos em um inverno”, disse à Carta Maior Javier Zuñiga, assessor do secretário geral da Anistia Internacional.

O Egito é um caso paradigmático. Divulgado no mesmo dia das eleições presidenciais nesse país, o informe assinala que os ideais revolucionários estão em perigo. O Conselho Supremo das Forças Armadas, que assumiu o poder após a queda de Hosni Mubarak, com a promessa de dirigir a transição, processou ou levou aos tribunais mais de 12 mil civis, muito mais do que ocorreu durante os 30 anos do governo de Mubarak.

As mulheres foram especialmente afetadas. Em março de 2011, as forças de segurança obrigaram um grupo de detidas em uma manifestação a submeter-se a “provas de virgindade”. A Anistia Internacional destaca que um tribunal administrativo egípcio determinou que tais provas não tinham valor legal, mas quando a organização pediu aos partidos políticos que se comprometessem a proteger princípios básicos de direitos humanos, os dois partidos que obtiveram a maioria dos votos nas eleições parlamentares se negaram a fazê-lo. O Partido da Liberdade e da Justiça, da Irmandade Muçulmana, que conseguiu 235 cadeiras (47%), não respondeu à petição e o partido salafista Al Nur, que ficou em segundo lugar com 121 cadeiras (24%), negou-se a promover os direitos das mulheres ou a abolição da pena de morte.

Austeridade, multinacionais e direitos humanos
A Anistia Internacional é igualmente dura com os países desenvolvidos e sua resposta à crise econômica. Coerente com a extensão feita do conceito de direitos humanos para o campo econômico e social, em seu informe de 2009, a Anistia critica “as políticas internas que levaram à persistente crise econômica e a uma grande tolerância com a desigualdade”. Os protestos na Europa e na América do Norte mostraram que “as pessoas perderam a fé nos governos que desprezaram várias vezes a prestação de contas, a justiça e a promoção da igualdade”. Esta crescente deslegitimação teve um claro impacto político: desde o início da crise da dívida, 16 países dos 27 que formam a União Europeia mudaram de governo.

Dada a profundidade da crise, a legitimidade dos novos governos não dura muito e diminui ainda mais com a repressão policial dos protestos. “Na Grécia, a polícia utilizou reiteradamente força excessiva e fez amplo uso de produtos químicos contra pessoas que protestavam pacificamente. Na Espanha, houve um uso excessivo da força contra manifestações que pediam mudanças políticas, econômicas e de política social”, assinala o secretário geral da Anistia Internacional.

Este “singular fracasso da liderança nacional e internacional” é também evidente, segundo o informe, no crescente poder das multinacionais para evitar toda regulação e obter benefícios a custa das comunidades locais. “Desde a Shell, no delta do Níger, até a Vedanta Resources, em Orissa, Índia, os governos não garantem que, minimamente, as empresas respeitem os direitos humanos. Em muitos países, centenas de milhares de pessoas são alvo de remoção forçada quando chegam as empresas mineradoras e reclamam as terras onde há recursos naturais”, diz ainda o secretário geral Salil Shetty. 

A Anistia elogia o papel das novas tecnologias na democratização, mas critica muitas de suas empresas. “Ficou demonstrado que empresas que, aparentemente, se dedicam à expressão e ao intercâmbio de opiniões (e se beneficiam disso), como Facebook, Google, Microsoft, Twitter, Vodafone e Yahoo, estão colaborando na promoção de violações de direitos humanos”, acrescenta o secretário geral.

Sobre a América Latina, a Anistia Internacional destaca que a demanda por direitos humanos foi ouvida por toda a região durante 2011: nos tribunais nacionais, no sistema interamericano e nas ruas. “As petições de justiça realizadas por cidadãos individuais, defensores e defensoras dos direitos humanos, organizações da sociedade civil e povos indígenas seguiram ganhando força e, frequentemente, foram encaminhadas por setores que realizavam enfrentamento direito com poderosos interesses econômicos e políticos”, diz Shetty.

Os contextos políticos mais dramáticos dessas mobilizações se deram com os massacres promovidos pelo narcotráfico no México (mais de 12 mil mortes no ano passado) ou pelo conflito armado na Colômbia. No caso do Brasil, o elevado índice de criminalidade violenta e as práticas das forças de segurança foram os pontos mais ressaltados pela Anistia que destacou que o atentado contra a juíza Patricia Acioli “mostra o alcance e a confiança com que operam as milícias”. A isso, soma-se a expulsão, frequentemente violenta, de grupos indígenas de suas terras tanto no Brasil, como na Colômbia, Guatemala ou México. “Às vezes multinacionais, outras vezes grupos nacionais, iniciam explorações petroleiras, mineiras ou de recursos florestais sem respeitar os direitos indígenas e das comunidades que vivem no lugar”, disse Javier Zuñiga à Carta Maior. 

Uma nova oportunidade
Segundo a Anistia, os governos terão uma nova oportunidade, em julho de 2012, de reverter essa situação e mostrar uma nova liderança quando se reunirem para acordar o texto definitivo do tratado para o comércio de armas. “Um tratado sólido impediria a transferência internacional de todo tipo de armas convencionais, incluindo as armas pequenas, armas leves, munição e componentes-chave, para países onde exista um risco provável de que sejam utilizadas para cometer graves violações do direito internacional humanitário e dos direitos humanos. Para atingir esse objetivo, o tratado exigiria que os governos realizassem uma rigorosa avaliação do risco para os direitos humanos antes de conceder uma licença de exportação de armas”, assinala Sajil.

No informe, a Anistia é cética. Em 2010, pelo menos 70% do total das exportações importantes de armas corresponderam aos seguintes países: Estados Unidos (30%), Rússia (23%), França (8%), Reino Unido (4%) e China (3%). “ Em todo o mundo, o fluxo irresponsável de armas procedentes destes cinco países causou inúmeras mortes de civis e outras graves violações dos direitos humanos e das leis da guerra”, enfatizou o secretário geral da organização Salil Shetty.

Tradução: Katarina Peixoto


Fonte: www.cartamaior.com.br




FUTEBOL E POLÍTICA

         UMA CRÔNICA


A VITÓRIA DA GILETE


Antigamente eles tinham barba. 

Quando falo “antigamente”, não quero dizer pré-história. E quando falo “eles”, não quero dizer australopitecos.

Quero dizer umas décadas atrás e jogadores de futebol.

Você que é dos tempos d.c, depois do computador, pode não acreditar, mas havia vários jogadores que usavam barba. 

Quereis nomes? Dou-vos. 

Havia, por exemplo, Gerd Muller, até hoje o maior artilheiro da seleção alemã. Ele tinha apenas 1,74m, pernas grossas, barba (pensando bem, talvez realmente lembrasse um australopiteco) e jogava muito. Foi campeão mundial com a seleção em 1974 e pelo Bayern em 1976. 

Aliás, no mesmo Bayern de Munique havia outro lendário barbudo: Paul Breitner. Era um lateral-esquerdo excelente. Depois foi para o meio-campo, sendo a estrela do Real Madrid em meados dos anos 70. Abandonou o futebol aos 31 anos, dizendo que ainda gostava de futebol, mas que estava cansado das coisas que aconteciam fora do campo. Numa polêmica entrevista, Breitner declarou-se socialista e leitor de Mao Tse Tung. E eis aí uma das características dos jogadores barbudos: muitos eram politicamente engajados. 

Sócrates é o nosso maior exemplo. Politizado e opinativo, ele foi uma das grandes estrelas da campanha das Diretas Já. Mas houve outros, como Afonsinho, também médico e barbudo, um dos primeiros a lutar pelos direitos dos jogadores.

Maradona é outro que teve sua fase de pelos faciais. E não se pode dizer que seja um sujeito apático politicamente. É a favor de Cuba e tem posições controversas sobre todos os assuntos. 

A barba é uma espécie de marca registrada dos sujeitos que gostam da ideia de mudar o mundo. Ela pode ser vista nos rostos comunistas de Marx e Engels, nos revolucionários Fidel e Che, no anarquista Bakunin, em Jesus, Maomé e Freud.

É como se estes homens dissessem que não têm tempo para se preocupar com a aparência, pois têm que pensar, escrever, agir. 

Mas hoje as barbas sumiram dos campos. Na verdade, até os cabelos andam desaparecidos, já que muitos deixam suas cabeças totalmente peladas. Especialmente os zagueiros, como Domingos, que mais parece uma estátua da Ilha de Páscoa.

Na política não é muito diferente. Por lá as barbas também estão de molho. E, quando há alguma, é aparada com o mesmo esmero com que uma drag queen faz suas sobrancelhas.

Em vez de barbas desleixadas, a moda é usar os pelos como logotipo. É o caso de Valdívia, com seu bigode de ladrão mexicano, de Marcelinho Paraíba, com seus cabelos loiros, e principalmente de Neymar, com seu moicano mutante.

Trocaram-se as barbas emaranhadas pelo cabelo cuidadosamente elaborado, o “não ligo para minha aparência” por horas nas cadeiras dos salões de beleza. 

Hoje em dia, talvez o uruguaio Loco Abreu, do Botafogo, que se formou em jornalismo e tem opiniões firmes, seja o único barbudo legítimo do futebol brasileiro. É pouco.

As barbas fazem falta. No futebol e na política.

PS: Falei em favor da barba, mas esta semana deixei o clube dos barbudos. É que Catarina, minha sobrinha de três anos, negou-se a beijar meu espinhento rosto. Então não tive dúvidas: raspei tudo. O que não se faz pelo beijo de uma senhorita...

José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça (Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para o Jornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e tevê, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado.


Fonte: www.cartamaior.com.br 



ECONOMIA ECONOMIA ECONOMIA





MUITO CUIDADO, PRESIDENTA


Ciro Gomes

 Brasil tem hoje a menor taxa de juros de sua história moderna. Mas é ainda a segunda maior taxa do mundo. Em verdade, na América, na Europa e no Japão a taxa de juros é negativa há já algum tempo. Quer dizer, taxas inferiores às respectivas taxas de inflação. Portanto, se há uma oportunidade para o Brasil trazer sua taxa de juros a um patamar civilizado e em linha com o padrão internacional é agora.
E o governo da presidenta Dilma está claramente buscando isto. Mas não creio que será assim tão fácil. Mais que isso, duvido que seja indolor. E sei por experiência própria. Foi eu falar claro sobre isto em minha campanha à presidência e o mundo do poder real em nosso País desabou em cima de mim. E Lula viu a necessidade e a oportunidade de escrever a famosa “carta aos brasileiros”. Acusei o golpe e a chamei de carta aos banqueiros. Foi bom pro Brasil, afinal.
Volto ao assunto só porque acho, comovidamente, que nuvens escuras se aproximam por sobre nosso governo. Parte é visível, parte clandestina.
Na parte visível, as penas alugadas já germinam grande pressão sobre o Banco Central. Tombini, que conduz com grande profissionalismo a diretoria do BC, já sentiu necessidade de declarar que as decisões são técnicas, “independentes”, querendo responder à provocação de que Dilma controla o Banco Central. E é uma graça pra quem tem minha vivência, ver os bancos privados correrem atrás da decisão dos bancos públicos de saírem do oligopólio e baixarem unilateralmente suas taxas de juros na ponta da freguesia, aonde o abuso e a usura são ainda mais escandalosos e sem precedente no mundo.
Esta pressão vai se agudizar muito proximamente. É a taxa Selic aloprada que causava a artificial taxa de câmbio, valorizando o real de maneira a que fica mais barato viajar pra Miami, saindo de São Paulo, do que viajar para Fortaleza, quando todo mundo sabe que Fortaleza é muito melhor do que Miami.
Baixam os juros, a taxa de câmbio desliza, desvalorizando o real. Isto restaura a competitividade sistêmica da economia produtiva brasileira, especialmente naqueles setores vinculados à exportação. Isto sinaliza, a futuro, uma inversão da atual tendência à desindustrialização do País. Persistindo no caminho, isto e só isto, pode acenar para uma parte importante da superação de nosso mais explosivo problema estratégico, o cavalar, aliás, recorde, déficit em nossas transações correntes com o estrangeiro.

Isto então é muito bom, certo? Não é bem assim na ferramentaria que pretende colocar nossa economia política em piloto automático, leia-se, fora do controle público democrático.
Modernamente – e isto os brilhantes técnicos que imaginaram o Plano Real aprenderam – os preços relativos de uma economia tendente à integração internacional são imediatamente sensíveis a um único preço relativo: o preço do dólar.
Funciona assim, perdoem-me os iniciados: o povo não compra dólar mas compra pão. Pão é trigo…e trigo é dólar pois não produzimos por aqui o suficiente; e temos que pagar ao estrangeiro em dólar. O povão não especula com câmbio, mas anda sofridamente de ônibus. O principal item de custo da passagem é combustível. Combustível é petróleo; petróleo é commoditie internacional e a nossa Petrobras ainda tem, em parte, saudade de FHC. Quer cotar o barril não pelo custo de produção, bem mais barato, mas pelo preço de Roterdã.
Nosso povo, tratado como bicho na rede pública de saúde, não pratica carry-trade (comprar moedas a juros internacionais negativos e aplicar em nossos juros de agiota com segurança “triple A”) mas precisa comprar remédios. Remédio é química fina, e o Brasil importa mais de 80% dos pozinhos e líquidos de nossos remédios, em dólar.
Assim, estamos próximos de chegar a uma armadilha, montada às pressas para esconjurar a crise brasileira de 1999, três providenciais meses depois da reeleição de Fernando Henrique Cardoso: baixam os juros, os preços, e alguns índices adredemente criados para dolarizar tarifas de setores privatizados e internacionalizados (IGPM, por exemplo), acusam quase instantaneamente o golpe. Tendem a subir. Subindo, como inevitável, o inflation target, entre nós batizados de meta de inflação, obriga o Banco Central a… subir os juros, restaurando-se a mamata rentista.
Este será o desafio que nosso governo terá que enfrentar proximamente.
E, temo, que o fará não só contra a falsa ciência defendida ardorosamente pelas penas e vozes alugadas em nossa grande mídia, mas também com a ferramentaria clandestina da desmoralização, do escândalo e da tentativa de corrosão da autoridade e da legitimidade da presidenta.
O mandato do Banco Central brasileiro tem que ser alterado para o padrão internacional e para a melhor doutrina: manter a menor inflação a pleno emprego! É esta contradição que dá aos bancos centrais do mundo civilizado a tarefa complexa de achar o equilíbrio entre desenvolvimento e inflação, não esta coisa tosca que ainda mantemos dez anos depois que o povo desautorizou esta modelagem.


Fonte: www.cartacapital.com.br 




O LIBERALISMO DE JABUTICABA 


Luis Nassif 




Há anos, por seu alcance, o sistema Globo tornou-se a principal influência na opinião pública, inclusive em questões econômicas. TV Globo, Globonews, CBN, jornal O Globo, portal G1, constituem-se na mais formidável caixa de irradiação de opiniões no país.
Por isso mesmo, é um bom laboratório para se analisar como se formam consensos, especialmente em temas ligados ao mercado e à economia.
Em geral, o discurso assenta-se em bordões de fácil assimilação  que, pela repetição, vulgarizam-se, podendo ser repetidos desde executivos com pouca formação econômica até papos de boteco. Paradoxalmente, essa banalização de conceitos responde pela extrema superficialidade da análise e, ao mesmo tempo, por sua enorme eficácia.
Até agosto do ano passado, esse discurso mercadista era facilitado pelo sofisma da prioridade única. Todas as análises tinham como mote a inflação. Justificava-se qualquer nível de taxa de juros porque era anti-inflação. Criticava-se qualquer redução da Selic, por mínima que fosse, por acirrar a inflação.
Não havia a menor necessidade de pensar. Baixou a taxa, imediatamente rebimbava o coro anti-inflação. Aumentou em percentuais ínfimos gastos sociais, acordava o coro contra a gastança.
Quando, em fins de agosto passado, o Banco Central reduziu a Selic e a inflação continuou caindo, o discurso desmoronou. Seria preciso refazer o discurso, recriar bordões.  E aí o sistema deu tilt.
Por exemplo, a boa análise econômica sabe que não é possível desenvolvimento sustentável sem dois eixos bem azeitados: consumo e investimento.
Primeiro, trata-se de montar o mercado – o interno, através da ampliação da base de consumo, e o externo, através de instrumentos de apoio à exportação.
Dado o mercado, garantir o investimento, através de ferramentas fiscais, financeiras e cambiais.
Cria-se o mercado interno. Estimula-se o investimento na produção. Amplia-se a capacidade produtiva do país, geram-se empregos mais qualificados e, por conseguinte, mais consumidores, completando o ciclo virtuoso do crescimento.
Sem o investimento, esse crescimento será apropriado pelo produto importado até o limite do estrangulamento externo. Não se completaria o ciclo. Mas não se investe sem dispor de um mercado de consumo em expansão.
No entanto, anos de defesa de juros altos criaram um pensamento anti-crescimento irracional – que é repetido de cabo a cabo por todo aparato midiático das Organizações Globo.
Ontem, as medidas de redução do custo do financiamento foram taxadas de temerárias por induzir o consumidor ao “endividamento irresponsável”.
Ora, o discurso econômico das Organizações é fundamentalmente neoliberal.
É princípio elementar do liberalismo o pleno direito de opção ao consumidor, ao investidor, à empresa. Ao Estado compete apenas criar condições adequadas, sem pretender tutelar os agentes econômicos.
Na hora de criar o bordão, esquece-se o livre arbítrio do consumidor, as ferramentas de análise de crédito dos bancos, o monitoramento da inadimplência pelo Banco Central, o fato do financiamento de automóvel ser garantido pelo próprio veículo, aspectos técnicos e conceituais.
Em Wall Street – onde esse pessoal se espelha -, seria motivo de chacota.


Fonte: www.cartacapital.com.br 





















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