02 fevereiro 2013

O FALSO MORALISMO A SERVIÇO DA POLÍTICA


A eleição de Renan, além do udenismo


por Antônio David, mestrando em Filosofia na FFLCH/USP


Eleição para presidente do Senado em si mesmo é algo que pouco interfere na conjuntura, muito menos na luta de classes. Apesar disso, as movimentações e opções que os partidos fazem são sintomáticas de posições que, essas sim, têm importância na conjuntura.

A eleição de Renan mostra o óbvio: a força que a direita fisiológica tem no Brasil. (Vale lembrar que provavelmente o presidente da Câmara será também do PMDB). O que não é obvio é: como o PT conseguirá avançar nas mudanças dependente que o governo é do parlamento e estando o governo preso a partidos como o PMDB?

Para refletir sobre isso, vale destacar um trecho da entrevista de André Singer ao Brasil de Fato: “Veja o que foi o papel do PMDB na campanha eleitoral de 2010: foi de brecar as medidas mais radicais que o PT tinha proposto em seu IV Congresso, como, por exemplo, a redução da jornada de trabalho e a taxação das grandes fortunas. O PMDB brecou essas duas coisas, que no final não entraram no programa da presidente Dilma”.

Qual é o problema? O problema é que criticar a política de alianças do PT é fácil, sobretudo quando a crítica é no varejo. É fácil criticar o apoio a Renan <nessa> eleição. Qualquer um critica. O problema é que crítica séria tem de ser no atacado – ou seja, o problema não é <esse> apoio, <essa> eleição, mas a estratégia do PT. E aí a coisa complica. Porque a estratégia que prevê alianças com a direita, que fortalece o agronegócio, que financia a imprensa golpista com publicidade etc., é a mesma que está aumentando o emprego e a massa salarial, diminuindo a pobreza e a desigualdade, viabilizando a expansão do ensino, cotas nas universidades etc.

É possível jogar fora alianças com a direita, e seguir avançando? É possível jogar fora a “governabilidade”, e seguir avançando? É possível corrigir os erros, mudar tudo o que tem de atraso na política do governo, e seguir avançando no que tem de bom, sem “governabilidade”, sem maioria no Congresso? Para a esquerda, essa é a questão central, ou uma das questões centrais. Não tenho resposta pronta no bolso. O que eu sei é que não dá para se acomodar, como se a estratégia de conciliação e de composição fosse boa, como também não dá para dar uma resposta simplista, como uma parte da esquerda faz.

A oposição (PSDB, DEM, PPS) não tem discurso. O governo FHC foi um fiasco e onde eles governam as coisas vão mal. Mas eles precisam fazer oposição, pois esses partidos representam o capital financeiro, que não apenas está insatisfeito com o governo, mas sabe que o desenvolvimentismo do governo fere seus interesses de classe. E como esses partidos não têm o que falar, qual é o discurso? Ética na política, moralidade, corrupção. Já vimos esse filme antes: UDN, Jânio, vassorinha…

Renan é sujo igual a todos os outros – inclusive o outro candidato – mas a diferença é que todo mundo (inclusive a classe média) sabe que Renan é sujo. Como o candidato do governo foi um candidato descaradamente sujo, a oposição aproveitou a oportunidade para posar de preocupada com a Ética e a moralidade pública. A imprensa ajudou, e eles de certa forma conseguiram o que queriam. O que eles queriam não era ganhar a eleição. O objetivo era alimentar, na classe média, a ideia de que eles são éticos, preocupados com a moralidade. E de fato saíram com pontos positivos junto à classe média. Graças a Deus, o povo não se preocupa com eleição de presidente do Senado.

O que falar do PSOL? Não surpreende a posição do PSOL, de apoiar a candidatura de Pedro Taques. Afinal, para quem o PSOL fala? Para a classe média. O povo nem liga para o PSOL, exceto em Belém e no Rio. Que ideias o PSOL alimenta? De que o grande problema do Brasil é a corrupção e de que o PT é corrupto. Portanto, não surpreende. Mas… ao embarcar na candidatura alternativa organizada pelo PSDB (sim, para os ingênuos que não sabem, a candidatura de Pedro Taques foi organizada pelo PSDB), o PSOL não fez outra coisa senão ajudar o PSDB a posar de arauto da Ética e da moralidade. Posição coerente nessa eleição teria sido votar nulo.

Em tempo: o grande problema do Brasil não é a corrupção, mas a desigualdade.


Extraído do blog O Escrevinhador 

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