11 dezembro 2010

A OPINIÃO DE MINO CARTA

NOVO GOVERNO: AS CONFIRMAÇÕES




Como se dá amiúde comigo, chega da memória Raymundo Faoro. Estamos no começo dos anos 80 e ele me diz: “Anote um nome, Nelson Jobim, político gaúcho do qual falaremos muito”. Falaríamos bem, estava claro. Anos depois, eu ancorava um programa de debates na televisão Record, ainda sob o comando da família Machado de Carvalho, Jogo de Carta. Convidei Jobim, ao lembrar a frase de Faoro, e ele saiu-se a contento, na minha opinião.
Mais uns anos, e meu eterno amigo e companheiro de algumas aventuras para mim inesquecíveis, volta ao tema Jobim e afirma: “Esqueça o que disse a respeito do meu conterrâneo”. Perguntei por quê. “Inteligente ele é – definiu –, mas inconfiável, você vai perceber.”
Os anos galopam e Faoro não está mais aqui, chamava-o de Profeta no sentido de Mensageiro, aquele que se antecipa aos eventos porque já os vê desenhados na sua própria mente. No começo do enredo, imaginava Jobim como um liberal à feição americana. A esta altura, já me pergunto se em lugar de estudar Direito ele não deveria ter cursado a Academia Militar. O transparente enlevo com que enverga uma farda me deixa em severa dúvida.
Da atuação de Jobim como ministro da Defesa do governo Lula recordo, sobretudo, duas passagens a meu ver notavelmente representativas, embora diversas as situações. Primeira. O ministro acompanha o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, ao Palácio do Planalto para um encontro com o presidente da República e o ministro da Justiça Tarso Genro. É um momento de grande tensão. Mendes declarou o propósito de “chamar às falas” o próprio Lula e no centro da questão estão Daniel Dantas e a Operação Satiagraha.
O presidente não se faz de rogado, e da conversa resulta o afastamento da direção da Abin do honrado delegado Paulo Lacerda, rebaixado para adido policial da embaixada de Lisboa, com a pronta aquiescência do ministro. Jamais esquecerei que, muitos dias antes,  o próprio me ligou na manhã em que o banqueiro orelhudo foi preso: Genro pretendia celebrar comigo o êxito da operação comandada pelo delegado Protógenes Queiroz. Regozijava-se apressadamente, é óbvio. Estava equivocado, não quanto a mim, a ele mesmo.
O segundo momento crucial da trajetória ministerial de Jobim remonta ao momento em que os iludidos da Secretaria Especial dos Direitos Humanos acharam ter chegado a hora de reivindicá-los. Tratava-se de desnudar os crimes cometidos durante a ditadura pelo terror de Estado. A despeito e por sobre a chamada Lei da Anistia, imposta em 1979 pelos autores do golpe de 1964, os quais, como se sabe, na qualidade de vencedores, enquanto foi possível, e pelo jeito é até hoje, escrevem a história.
Fardado, e rodeado por aqueles que pareciam seus pares, o ministro Jobim surgiu em cena para tomar o partido dos torturadores e, portanto, para corroborar a validade da Lei da Anistia. A decepção de Faoro, mais de 20 anos atrás, estava justificada e CartaCapital não hesita em afirmar agora sua perplexidade com a confirmação de Nelson Jobim em pasta tão significativa, tanto mais em um país como o Brasil, acostumado à interferência militar na área civil, e vice-­versa. Ou seja, às relações umbilicais entre certos paisanos e certos fardados, decisivas em ocasiões diversas.
É o contrário do que se dá em relação a outras confirmações, a começar pela do ministro Guido Mantega na Fazenda, ou de Luciano Coutinho no BNDES. Teríamos aplaudido a permanência do ministro Celso Amorim na Chancelaria, mas temos a certeza de que o novo titular, Antonio Patriota, saberá dar continuidade a uma política exterior exemplar na sua independência.
Outra a meteorologia se sobrevém Jobim. Por ser Nelson, não é um furacão na Flórida, nem teria porte para tanto. Representa, porém, algumas das tradições mais deploráveis do poder nativo. Sem contar que, além da farda, já envergou inúmeras casacas.


Mino Carta





Um comentário:

  1. É lamentável, sob todos os aspectos, a permanên-
    cia do Minitro Jobim no novo governo. Mas, isso
    só vem provar a máxima: nada é perfeito.
    As mudanças no Brasil, no âmbito da política,
    são "lentas e graduais". É da nossa história.

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