Depois de Molina, Julian Assange
Numa prova de espírito democrático e grandeza política, seria bem oportuno sugerir às mesmas forças que aplaudem a fuga do senador boliviano que reforcem a pressão para que o fundador do Wikileaks possa deixar a Inglaterra
Paulo Moreira Leite, em seu blogue
Imagine se um funcionário do governo do Equador organizasse a fuga de Julian Assange da embaixada de Londres para Quito. O governo de David Cameron já teria organizado uma frota para ameaçar o pequeno país sul-americano. O gesto seria considerado uma afronta e um insulto de caráter internacional. Já posso ver autoridades falando em boicote aos produtos do Equador.
Sempre em busca de argumentos para atacar Correa e todos os governantes que podem ser considerados herdeiros de Hugo Chávez, não faltariam colunistas conservadores, no Brasil, para exigir nossa ruptura com aquele país. Ou pelo menos um gesto de agressividade sobre um país de PIB menor do que o nosso -- como chamar o embaixador para explicações.
Passando da imaginação para a realidade, foi mais ou menos isso que aconteceu na Bolívia, quando o diplomata Eduardo Sabóia decidiu fugir, clandestinamente, com um senador que se encontrava refugiado na embaixada em La Paz há um ano e meio.
O governo brasileiro tem uma tradição de asilar perseguidos políticos e, apesar de possuir mais de vinte condenações no currículo, existem motivos razoáveis para incluir Roger Molina nessa categoria.
Na última negociação realizada, o governo de Evo Morales concordou em liberar a saída do senador, sem lhe dar o salvo conduto, o que tornaria a saída uma operação arriscada.
Olhando para o caso de uma certa distância, é possível admitir que há prós e contras, em especial quando se encara o problema pelo ângulo humanitário. Vivemos num país que já exilou ditadores de alta periculosidade, como o paraguaio Stroessner.
E é justamente desse ângulo que volto à questão de Julian Assange.
Numa prova de espírito democrático e grandeza política, seria bem oportuno sugerir às mesmas forças que aplaudem a fuga do senador boliviano que reforcem a pressão para que o fundador do Wikileaks possa deixar a Inglaterra para residir em liberdade no país que concordou em lhe dar asilo.
Claro que a oposição faz isso num esforço óbvio para desgastar o governo. É do jogo.
Mas vamos combinar que há nobreza em Assange, uma causa que tem ligação direta com a liberdade de expressão e o direito a informação, tão preciosos em tempos de autoritarismo velado e espionagem.
Comparando um caso com o outro, cabe reparar que os direitos de Assange têm inteiro respaldo pelas tradições internacionais. Sua chegada ao Equador está autorizada pelo governo daquele país, ao contrário do que aconteceu com Roger Molina, que entrou clandestinamente pela fronteira.
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