INTERNACIONAL
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É bom acompanharmos o desenrolar da crise na Europa (e EUA), para ficarmos
preparados para o que der e vier, pois os nossos "rentistas" não vão deixar por
menos, não. Através da chamada grande mídia, que está ao seu dispor, serão
criadas crises, estatísticas manipuladas, pesquisas falsas. Opiniões de "especia-
listas" de um lado só, também fará parte do pacote para desestabilizar a
política econômica do governo brasileiro.
Vamos falar, um pouco, da África também. Esse continente maltratado,
menosprezado e tão explorado no pior sentido.
África, um continente sem história?
Por Emir Sader (em seu Blog)
Não há região do mundo mais vítima da naturalização da miséria do que a África. Na concepção eurocêntrica, bastaria cruzar o Mediterraneo para se ir da “civilização” à “barbárie”. Como se a África não tivesse história, como se seus problemas fossem naturais e não tivessem sido resultado do colonialismo, da escravidão e do neocolonialismo.
Continente mais pobre, mais marcado por conflitos que aparecem como conflitos étnicos, região que mais exporta mão de obra – a África tem todas as características para sofrer a pecha de continente marcado pelo destino para a miséria, o sofrimento, o abandono.
Depois de séculos de despojo colonial e de escravidão, os países africanos acederam à independência política na metade do século passado, no bojo da decadência definitiva das potências coloniais europeias. Alguns países conseguiram gerar lideranças políticas nacionais, construir Estados com projetos próprios, estabelecer certos níveis de desenvolvimento econômico, no marco do mundo bipolar do segundo pós-guerra.
Mas essas circunstâncias terminaram e o neocolonialismo voltou a se abater sobre o continente africano, vítima de novo da pilhagem das potências capitalistas. A globalização neoliberal voltou a reduzir o continente ao que tinha sido secularmente: fornecedor de matérias primas para as potências centrais, com a única novidade que agora a China também participa desse processo.
Mas o continente, que nunca foi ressarcido pelo colonialismo e pela escravidão, paga o preço desses fenômenos e essa é a raiz essencial dos seus problemas. Mesmo enfrentamentos sangrentos, atribuídos a conflitos étnicos, como entre os tutsis e os hutus, se revelaram na verdade expressão dos conflitos de multinacionais francesas e belgas, com envolvimento dos próprios governos desses países.
Hoje a África está reduzida a isso no marco do capitalismo global. Salvo alguns países como a Africa do Sul, por seu desenvolvimento industrial diferenciado e alguns países que possuem matérias primas ou recursos energéticos estratégicos, tem um papel secundário e complementar, sem nenhuma capacidade de assumir estratégias próprias de desenvolvimento e de superação dos seus problemas sociais.
A globalização neoliberal acentuou a concentração de poder e de renda no centro em detrimento da periferia. Os países emergentes – em particulares latino-americano e alguns asiáticos – conseguiram romper essa tendência, mas não os africanos, porque não conseguiram eleger governos que rompessem com a lógica neoliberal predominante.
O novo ciclo da crise capitalista e a primavera no mundo árabe podem trazer novidades que permitam a países africanos somar-se aos governos progressistas da América Latina.
Continente mais pobre, mais marcado por conflitos que aparecem como conflitos étnicos, região que mais exporta mão de obra – a África tem todas as características para sofrer a pecha de continente marcado pelo destino para a miséria, o sofrimento, o abandono.
Depois de séculos de despojo colonial e de escravidão, os países africanos acederam à independência política na metade do século passado, no bojo da decadência definitiva das potências coloniais europeias. Alguns países conseguiram gerar lideranças políticas nacionais, construir Estados com projetos próprios, estabelecer certos níveis de desenvolvimento econômico, no marco do mundo bipolar do segundo pós-guerra.
Mas essas circunstâncias terminaram e o neocolonialismo voltou a se abater sobre o continente africano, vítima de novo da pilhagem das potências capitalistas. A globalização neoliberal voltou a reduzir o continente ao que tinha sido secularmente: fornecedor de matérias primas para as potências centrais, com a única novidade que agora a China também participa desse processo.
Mas o continente, que nunca foi ressarcido pelo colonialismo e pela escravidão, paga o preço desses fenômenos e essa é a raiz essencial dos seus problemas. Mesmo enfrentamentos sangrentos, atribuídos a conflitos étnicos, como entre os tutsis e os hutus, se revelaram na verdade expressão dos conflitos de multinacionais francesas e belgas, com envolvimento dos próprios governos desses países.
Hoje a África está reduzida a isso no marco do capitalismo global. Salvo alguns países como a Africa do Sul, por seu desenvolvimento industrial diferenciado e alguns países que possuem matérias primas ou recursos energéticos estratégicos, tem um papel secundário e complementar, sem nenhuma capacidade de assumir estratégias próprias de desenvolvimento e de superação dos seus problemas sociais.
A globalização neoliberal acentuou a concentração de poder e de renda no centro em detrimento da periferia. Os países emergentes – em particulares latino-americano e alguns asiáticos – conseguiram romper essa tendência, mas não os africanos, porque não conseguiram eleger governos que rompessem com a lógica neoliberal predominante.
O novo ciclo da crise capitalista e a primavera no mundo árabe podem trazer novidades que permitam a países africanos somar-se aos governos progressistas da América Latina.
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ONU vê crise pior e apela para ricos não 'embarcarem' em arrocho
Economia global crescerá em 2012 e 2013 menos do que o previsto antes, segundo relatório da Conferência da ONU sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) divulgado nesta terça (17). Agência avalia que condução política contra 'crise do emprego' nos países ricos ameaça agravar situação e apela: 'Não embarquem em políticas de austeridade fiscal'.
André Barrocal
BRASÍLIA – A agência das Nações Unidas voltada para estudos sobre comércio e desenvolvimento, a Unctad, divulgou nesta terça-feira (17) relatório sobre a economia global em 2012 com um cenário mais pessimista e previsões de crescimento menores. E para que a situação não se agrave ainda mais, a Unctad fez um apelo ao núcleo da crise, os países ricos: evitem arrocho fiscal.
“As Nações Unidas apelam aos governos dos países desenvolvidos que não embarquem prematuramente em políticas de austeridade fiscal, dados o estado ainda frágil da recuperação [econômica] e a persistência de altos níveis de desemprego”, diz a agência, no comunicado em que divulgou o relatório.
A declaração não cita países individualmente, mas é um referência ao núcleo “europeu” da crise. Mergulhados em problemas para pagar dívidas estatais ao “mercado”, Grécia, Itália, Portugal, Espanha e Irlanda têm negociado soluções que implicam corte de gastos públicos e de salários e redução de conquistas trabalhistas, como forma de economizar dinheiro e pagar o “mercado”.
A poupança pretendida pelos devedores teria como consequência estagnação ou baixo crescimento – sem injeção de recursos via investimentos públicos e consumo dos trabalhadores, a economia real não giraria.
Sem crescimento, no entanto, a arrecadação de impostos seria menor, impedindo os países de controlar mais rapidamente a dívida, deixarem de ser reféns do “mercado” e retomarem os investimentos. Uma espiral de estagnação sem dia para acabar.
Para a Unctad, estas nações deveriam resistir à tentação de se entregar à ortodoxia, pois teriam como escapar de um caminho que só beneficiaria o “mercado” – apesar de tudo, diz a agência, os países ainda teriam algum dinheiro em caixa para botar na economia e assim ativá-la; e ainda “desfrutariam” de juro baixo na hora de tomar empréstimos para investir também.
“A ONU recomenda ainda uma mais vigorosa coordenação internacional de medidas adicionais de estímulo em todos os países e a redefinição das políticas para estimular a criação de empregos diretos e mais investimento em infra-estrutura, eficiência energética e de fornecimento de energia sustentável e segurança alimentar, abrindo o caminho para se descontrair endividamento”, diz o documento.
Segundo a Unctad, a crise global hoje caracteriza-se por uma combinação de quatro fatores presentes simultaneamente: queda da demanda, fragilidade do sistema financeiro, problemas no pagamento de dívidas estatais e paralisia política.
É neste último elemento que a agência acredita que reside a maior ameaça de que a situação piore ainda mais. Para a Unctad, Europa e Estados Unidos (o outro núcleo da crise) precisam buscar soluções que ao mesmo tempo enfrentem o que a agência chama de “crise de empregos” e de “fragilidade da dívida soberana”. “As economias desenvolvidas estão à beira de uma espiral descendente”, afirma.
O relatório prevê que o mundo vai crescer 2,6% (a estimativa anterior, de junho, era de 3,6%); os EUA, 1,5% (eram 2,8%); e a União Européia, 0,7% (1,6% antes).
“As Nações Unidas apelam aos governos dos países desenvolvidos que não embarquem prematuramente em políticas de austeridade fiscal, dados o estado ainda frágil da recuperação [econômica] e a persistência de altos níveis de desemprego”, diz a agência, no comunicado em que divulgou o relatório.
A declaração não cita países individualmente, mas é um referência ao núcleo “europeu” da crise. Mergulhados em problemas para pagar dívidas estatais ao “mercado”, Grécia, Itália, Portugal, Espanha e Irlanda têm negociado soluções que implicam corte de gastos públicos e de salários e redução de conquistas trabalhistas, como forma de economizar dinheiro e pagar o “mercado”.
A poupança pretendida pelos devedores teria como consequência estagnação ou baixo crescimento – sem injeção de recursos via investimentos públicos e consumo dos trabalhadores, a economia real não giraria.
Sem crescimento, no entanto, a arrecadação de impostos seria menor, impedindo os países de controlar mais rapidamente a dívida, deixarem de ser reféns do “mercado” e retomarem os investimentos. Uma espiral de estagnação sem dia para acabar.
Para a Unctad, estas nações deveriam resistir à tentação de se entregar à ortodoxia, pois teriam como escapar de um caminho que só beneficiaria o “mercado” – apesar de tudo, diz a agência, os países ainda teriam algum dinheiro em caixa para botar na economia e assim ativá-la; e ainda “desfrutariam” de juro baixo na hora de tomar empréstimos para investir também.
“A ONU recomenda ainda uma mais vigorosa coordenação internacional de medidas adicionais de estímulo em todos os países e a redefinição das políticas para estimular a criação de empregos diretos e mais investimento em infra-estrutura, eficiência energética e de fornecimento de energia sustentável e segurança alimentar, abrindo o caminho para se descontrair endividamento”, diz o documento.
Segundo a Unctad, a crise global hoje caracteriza-se por uma combinação de quatro fatores presentes simultaneamente: queda da demanda, fragilidade do sistema financeiro, problemas no pagamento de dívidas estatais e paralisia política.
É neste último elemento que a agência acredita que reside a maior ameaça de que a situação piore ainda mais. Para a Unctad, Europa e Estados Unidos (o outro núcleo da crise) precisam buscar soluções que ao mesmo tempo enfrentem o que a agência chama de “crise de empregos” e de “fragilidade da dívida soberana”. “As economias desenvolvidas estão à beira de uma espiral descendente”, afirma.
O relatório prevê que o mundo vai crescer 2,6% (a estimativa anterior, de junho, era de 3,6%); os EUA, 1,5% (eram 2,8%); e a União Européia, 0,7% (1,6% antes).
Fonte: www.cartamaior.com.br
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O rebaixamento da França e do governo Sarkozy
Em novembro passado, um conselheiro do presidente francês disse ao Le Monde: “se Nicolas Sarkozy perder a nota Triplo A está morto”. Pois aconteceu. A agência de classificação de risco Standard & Poor’s retirou da França a prestigiada nota de triplo A. O fato representa um duro golpe para um dirigente cujo mandato aplicou à letra a receita liberal. As pesquisas dão hoje ao candidato socialista François Hollande uma folgada vantagem frente a Sarkozy. Até aqui, porém, Hollande não sinalizou nehuma ruptura com o atual modelo. O artigo é de Eduardo Febbro.
Eduardo Febbro - Direto de Paris
Paris - Ser um bom aluno do sistema não garante a condescendência dos inspetores das receitas liberais. O presidente francês acaba de experimentar a amarga experiência com a decisão da agência de classificação de risco Standard & Poor’s de retirar da França a prestigiada nota de triplo A. Faltando cem dias para o primeiro turno das eleições presidenciais, onde Sarkozy espera ser reeleito, apesar de uma onda de pesquisas pouco animadoras, o chefe de Estado recebe uma severa sanção.
O Executivo havia se preparado para isso desde outubro-novembro do ano passado quando insistentes rumores e especulações adiantavam a posição da agência de classificação. Apesar da tentativa de minimizar o fato, perder a nota financeira do triplo A representa um duro golpe para um dirigente cujo mandato aplicou à letra a receita liberal com os consequentes benefícios que isso traz para os setores privilegiados.
De um modo mais amplo, o terremoto de estende por toda a União Europeia, em particular pelos 17 países da zona euro, no momento em que se sanciona a política proposta pela chanceler alemã Angela Merkel e pelo próprio Nicolas Sarkozy para liderar o resgate da zona euro. O rebaixamento da França lança por terra toda a imagem e a política de “heróis unidos” que Sarkozy e Merkel construíram em torno deles com o objetivo de aparecerem como os timoneiros de uma Europa sem capitão e sem rumo.
Um dos capitães perdeu suas estrelas e, com isso, já são nove os países da zona euro que viram sua nota rebaixada pelo grande policial qualificador. Para Sarkozy, manter vigente o Triplo A era uma questão de princípio fundamental e, ante à opinião pública, uma prova de que o caminho que escolheu era o correto. A avaliação que os franceses fazem do mandato de Sarkozy não dizia isso, mas o argumento do Triplo A tinha um lugar destacado na estratégia de comunicação do palácio presidencial.
Quase cinco anos depois de ter sido eleito, o balanço dos franceses sobre seu mandato é muito adverso. Segundo a pesquisa realizada por OpinionWay-Fiducial para o semanário Le Nouvel Observateur, sete de cada dez franceses (70%) pensam que seu mandato foi negativo. 73% dizem que o presidente não foi fiel a suas promessas (só 19% acreditam que a crise impediu-o de fazer isso) e 49% pensa que sob seu mandato a democracia francesa debilitou-se.
A nota de aprovação mais alta, 66%, está relacionada à sua política de imigração. Nicolas Sarkozy protagonizou uma presidência tão agitada como contraditória. Podia falar como um social-democrata, mas atuou como um liberal. Neste sentido, a primeira coisa que fez foi adotar uma política fiscal que fez dele o presidente dos ricos. Logo após ser eleito, Sarkozy colocou em prática o “escudo fiscal”, com o qual limitou o volume dos impostos dos ricos. Em 2010, ao final de uma batalha social que durou muitos meses e mobilizou milhões de pessoas, Sarkozy modificou o sistema de aposentadorias, suprimindo a aposentadoria aos 60 anos, outra medida emblemática do socialismo francês, vigente desde o mandato do falecido presidente socialista François Miterrand (1981-1995).
Em seguida, seu governo travou uma batalha pragmática e ideológica contra as 35 horas de trabalhos semanais, um princípio adotado pelo último governo socialista (Lionel Jospin, 1997-2002) com a meta de lutar contra o desemprego. O credo ultra-liberal instaurado por Sarkozy dizia: trabalhar mais para ganhar mais. As pessoas trabalharam mais e ganharam menos. Paralelamente, ao final de seu mandato e com um desemprego que ultrapassa a casa dos quatro milhões (9.2% da população economicamente ativa), os liberais constatam seu fracasso na luta contra o desemprego e se veem obrigados a recuperar o princípio socialista instaurado entre 97 e 2002: trabalhar menos para que trabalhem todos.
A avaliação das ações de Nicolas Sarkozy só piora quando se leva em conta seu comportamento de homem veloz, que prejudicou sua imagem e suas reformas. Para o bem e para o mal, Sarkozy moveu muitas linhas em um país quase petrificado. O instituto Thomas More contabilizou 1.300 medidas, das quais 490 correspondem a suas promessas eleitorais.
Sarkozy foi eleito como o homem das reformas. No entanto, à beira das urnas, o balanço sobre seu governo é diferente: as reformas fundamentais prometidas por Sarkozy não foram realizadas. Cercado pela crise, limitado por suas próprias contradições e pelas disputas dentro deu sua própria maioria, Sarkozy mudou radicalmente o sentido de seu mandato: foi eleito para reformar, modernizar e fazer o país progredir. O balanço oficial de quatro anos no poder publicado em maio passado pela presidência francesa fala de “proteger os franceses”. A mudança é profunda.
Não há relato positivo da presidência de Sarkozy. A perda do Triplo A torna um pouco mais turva ainda a imagem de um dirigente que tem avaliação negativa mesmo entre seus próprios aliados ideológicos. O presidente francês contou até o último momento com a possibilidade de que a Standard & Poor’s mantivesse a França no pedestal. Em novembro passado, um conselheiro do presidente disse ao vespertino Le Monde: “se Nicolas Sarkozy perder a nota Triplo A está morto”. A sanção da agência de classificação norteamericana é tripla: cai sobre Sarkozy, sobre a Europa e sobre o futuro. O candidato socialista á presidência, François Hollande, disse que, com a nota da S&P “está se rebaixando uma política”. A avaliação vale para si mesmo caso seja eleito. O ultra-liberalismo de Nova York não perdoa nem faz concessões.
O ano eleitoral começou na França sob o signo do silêncio político e com o ruído de fundo da recessão e da crise. A segunda economia da zona euro celebra entre abril e maio as eleições presidenciais que poderão abrir aos socialistas as portas do palácio presidencial depois de três derrotas consecutivas. As pesquisas dão hoje ao candidato socialista François Hollande uma folgada vantagem frente ao presidente Nicolas Sarkozy. Mas essa vantagem não se traduz até aqui por propostas sólidas que marquem uma ruptura com a presidência de Sarkozy. Tanto Hollande como Sarkozy optaram pelo risco mínimo: dizer pouco, não prometer quase nada, passar voando sobre os temas centrais e manter a incógnita sobre temas essenciais. As agências de classificação dos Estados Unidos entraram na campanha. Até os que fazem o dever de casa acabam sendo castigados.
Tradução: Katarina Peixoto
O Executivo havia se preparado para isso desde outubro-novembro do ano passado quando insistentes rumores e especulações adiantavam a posição da agência de classificação. Apesar da tentativa de minimizar o fato, perder a nota financeira do triplo A representa um duro golpe para um dirigente cujo mandato aplicou à letra a receita liberal com os consequentes benefícios que isso traz para os setores privilegiados.
De um modo mais amplo, o terremoto de estende por toda a União Europeia, em particular pelos 17 países da zona euro, no momento em que se sanciona a política proposta pela chanceler alemã Angela Merkel e pelo próprio Nicolas Sarkozy para liderar o resgate da zona euro. O rebaixamento da França lança por terra toda a imagem e a política de “heróis unidos” que Sarkozy e Merkel construíram em torno deles com o objetivo de aparecerem como os timoneiros de uma Europa sem capitão e sem rumo.
Um dos capitães perdeu suas estrelas e, com isso, já são nove os países da zona euro que viram sua nota rebaixada pelo grande policial qualificador. Para Sarkozy, manter vigente o Triplo A era uma questão de princípio fundamental e, ante à opinião pública, uma prova de que o caminho que escolheu era o correto. A avaliação que os franceses fazem do mandato de Sarkozy não dizia isso, mas o argumento do Triplo A tinha um lugar destacado na estratégia de comunicação do palácio presidencial.
Quase cinco anos depois de ter sido eleito, o balanço dos franceses sobre seu mandato é muito adverso. Segundo a pesquisa realizada por OpinionWay-Fiducial para o semanário Le Nouvel Observateur, sete de cada dez franceses (70%) pensam que seu mandato foi negativo. 73% dizem que o presidente não foi fiel a suas promessas (só 19% acreditam que a crise impediu-o de fazer isso) e 49% pensa que sob seu mandato a democracia francesa debilitou-se.
A nota de aprovação mais alta, 66%, está relacionada à sua política de imigração. Nicolas Sarkozy protagonizou uma presidência tão agitada como contraditória. Podia falar como um social-democrata, mas atuou como um liberal. Neste sentido, a primeira coisa que fez foi adotar uma política fiscal que fez dele o presidente dos ricos. Logo após ser eleito, Sarkozy colocou em prática o “escudo fiscal”, com o qual limitou o volume dos impostos dos ricos. Em 2010, ao final de uma batalha social que durou muitos meses e mobilizou milhões de pessoas, Sarkozy modificou o sistema de aposentadorias, suprimindo a aposentadoria aos 60 anos, outra medida emblemática do socialismo francês, vigente desde o mandato do falecido presidente socialista François Miterrand (1981-1995).
Em seguida, seu governo travou uma batalha pragmática e ideológica contra as 35 horas de trabalhos semanais, um princípio adotado pelo último governo socialista (Lionel Jospin, 1997-2002) com a meta de lutar contra o desemprego. O credo ultra-liberal instaurado por Sarkozy dizia: trabalhar mais para ganhar mais. As pessoas trabalharam mais e ganharam menos. Paralelamente, ao final de seu mandato e com um desemprego que ultrapassa a casa dos quatro milhões (9.2% da população economicamente ativa), os liberais constatam seu fracasso na luta contra o desemprego e se veem obrigados a recuperar o princípio socialista instaurado entre 97 e 2002: trabalhar menos para que trabalhem todos.
A avaliação das ações de Nicolas Sarkozy só piora quando se leva em conta seu comportamento de homem veloz, que prejudicou sua imagem e suas reformas. Para o bem e para o mal, Sarkozy moveu muitas linhas em um país quase petrificado. O instituto Thomas More contabilizou 1.300 medidas, das quais 490 correspondem a suas promessas eleitorais.
Sarkozy foi eleito como o homem das reformas. No entanto, à beira das urnas, o balanço sobre seu governo é diferente: as reformas fundamentais prometidas por Sarkozy não foram realizadas. Cercado pela crise, limitado por suas próprias contradições e pelas disputas dentro deu sua própria maioria, Sarkozy mudou radicalmente o sentido de seu mandato: foi eleito para reformar, modernizar e fazer o país progredir. O balanço oficial de quatro anos no poder publicado em maio passado pela presidência francesa fala de “proteger os franceses”. A mudança é profunda.
Não há relato positivo da presidência de Sarkozy. A perda do Triplo A torna um pouco mais turva ainda a imagem de um dirigente que tem avaliação negativa mesmo entre seus próprios aliados ideológicos. O presidente francês contou até o último momento com a possibilidade de que a Standard & Poor’s mantivesse a França no pedestal. Em novembro passado, um conselheiro do presidente disse ao vespertino Le Monde: “se Nicolas Sarkozy perder a nota Triplo A está morto”. A sanção da agência de classificação norteamericana é tripla: cai sobre Sarkozy, sobre a Europa e sobre o futuro. O candidato socialista á presidência, François Hollande, disse que, com a nota da S&P “está se rebaixando uma política”. A avaliação vale para si mesmo caso seja eleito. O ultra-liberalismo de Nova York não perdoa nem faz concessões.
O ano eleitoral começou na França sob o signo do silêncio político e com o ruído de fundo da recessão e da crise. A segunda economia da zona euro celebra entre abril e maio as eleições presidenciais que poderão abrir aos socialistas as portas do palácio presidencial depois de três derrotas consecutivas. As pesquisas dão hoje ao candidato socialista François Hollande uma folgada vantagem frente ao presidente Nicolas Sarkozy. Mas essa vantagem não se traduz até aqui por propostas sólidas que marquem uma ruptura com a presidência de Sarkozy. Tanto Hollande como Sarkozy optaram pelo risco mínimo: dizer pouco, não prometer quase nada, passar voando sobre os temas centrais e manter a incógnita sobre temas essenciais. As agências de classificação dos Estados Unidos entraram na campanha. Até os que fazem o dever de casa acabam sendo castigados.
Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: www.cartamaior.com.br
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