04 novembro 2014

INFRAÇÕES MIDIÁTICAS

'Ressaca eleitoral' e misturas pouco
recomendáveis


Alberto Dines, no Observatório da Imprensa



Sob o título “Em busca da verdade”, Veja tentou desfazer a sua mais recente imersão no jornalismo marrom às vésperas do segundo turno. Na edição seguinte (2398, com data de capa de 5/11/2014), na “Carta ao Leitor”, o semanário reviu suscintamente e tentou encerrar o episódio em que acusou a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula de saberem o que se passava na Petrobras.
A única prova apresentada para validar o libelo do doleiro-delator Alberto Youssef e justificar a publicação de um trecho está na frase “seu advogado em momento algum negou esse fato”.
Sofisma canhestro, pífio, mal-intencionado: o advogado está terminantemente proibido de negar, confirmar ou comentar o depoimento do cliente porque o caso corre protegido pelo sigilo. A pretendida busca da verdade anunciada pela direção do semanário é, portanto, enganosa, arrogante. Não resiste a uma apuração decente.
Infrações midiáticas
A publicação de um trecho da delação configura-se como difamação, tentativa espúria de influir no resultado de uma eleição. Pela sua gravidade não pode ficar à espera da conclusão das investigações sobre as malfeitorias da Petrobras porque envolve não apenas a credibilidade de Veja, mas da imprensa que acolheu um texto ainda em estado de calúnia.
A ombudsman/ouvidora da Folha de S.Paulo Vera Magalhães Martins revelou em sua última coluna (domingo, 2/11) que questionou a direção da Redação e foi informada de que a informação de Veja fora checada e confirmada por duas fontes, como se esta lacônica informação numérica fosse suficiente para validar uma acusação de tamanha gravidade (ver “Apuração por telefone sem fio”).
A Folha tem uma ouvidora e leitores aguerridos que, juntos, são capazes de manter a questão do desempenho da imprensa na pauta de discussões e angústias cívicas. Mas e O Globo, TV Globo, Globonews, Estado de S.Paulo, Zero Hora, que ainda não alcançaram esse estágio de transparência? Vão contentar-se em manter seus leitores, telespectadores e assinantes alheados de um questionamento que em sociedades desenvolvidas já estaria aceso?
E a legião de colunistas e opinionistas que emprestam seus ilustres nomes para avalizar o pseudopluralismo da chamada grande imprensa? Com a exceção de Janio de Freitas, naFolha, e alguns bravos blogueiros independentes, passados dez dias da votação a tal “ressaca eleitoral” ainda não incluiu as infrações midiáticas cometidas nesta temporada. Nem as outras que provocaram o súbito questionamento do instituto da reeleição, ao contrário do que aconteceu em 1998 e 2006.
Ressacas não tratadas podem produzir efeitos perversos.
 
 

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