25 maio 2015

SINAIS INVERTIDOS

Por dentro do mercado eleitoral


Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa



O fim de semana mostra uma imprensa com os sinais invertidos: os jornais chamados de genéricos politizam a economia, produzindo certa confusão em torno do ajuste em tramitação no Congresso, e o principal diário de economia e negócios apresenta a melhor análise do projeto de reforma política que causa grande desentendimento no Parlamento.
Mas esse não é um fato isolado: diante da perda de qualidade dos títulos genéricos, o Valor Econômico se consolida como uma alternativa para quem ainda busca na mídia tradicional os elementos para interpretar o cotidiano brasileiro.
Dada a crescente importância do noticiário econômico na vida das pessoas, pode-se afirmar que, ao completar quinze anos, o jornal que ocupou o lugar da extinta Gazeta Mercantil conquista uma posição confortável para tentar novos avanços. Seus concorrentes, além da versão digital da revista Exame, são o caderno de Economia do Estado de S.Paulo e os sites de publicações estrangeiras especializadas. Nesse mercado, é preciso combinar o público mais bem posicionado na hierarquia das empresas com os jovens executivos em ascensão na carreira.
O fato de o Estado, assim como os outros diários genéricos de circulação nacional, ter contaminado seu noticiário econômico com o viés partidário que condiciona suas escolhas editoriais abre uma perspectiva para o Valor se posicionar um pouco além de sua especialidade.
Com cerca de 60 mil assinantes, o diário nascido de uma parceria do Globo com a Folha de S.Paulo se beneficia do fato de ter menos flutuações em sua carteira de leitores fiéis e aprofunda seu relacionamento com protagonistas do mundo dos negócios por meio do serviço digital Valor PRO.
Apesar de um erro estratégico primário nos seus primeiros anos de vida, quando sucumbiu à onda dos brindes para conquistar assinantes, o projeto ganhou corpo à medida em que a Gazeta Mercantil agonizava. Quinze anos depois, seu núcleo de especialistas pode ampliar as incursões nos campos em que dominam a Folha, o Estado e o Globo. Portanto, não se deve estranhar se oValor aumentar o destaque a temas da política, pois esse seria um caminho natural para captar leitores exigentes que estão frustrados com a queda de qualidade dos três diários de circulação nacional.
Aposta na inteligência
A edição do fim de semana, que circula a partir da sexta-feira, oferece uma espécie de revista na qual se pode encontrar uma coleção de bons textos sobre cultura e política, como a entrevista produzida pelo debate entre o presidente da Câmara dos Deputados e os cientistas políticos Jairo Nicolau e Fernando Limonji, publicada na sexta (22/5).
Enquanto os outros jornais se concentram nos detalhes da disputa política, o texto de Valorpermite ao seu leitor penetrar profundamente nos bastidores do poder e entender aquilo que para o outro público não passa de picuinha.
O confronto de dois scholars com o presidente da Câmara revela como a política real foi se distanciando dos paradigmas que justificam, em tese, o esforço pela democracia. Pressionado por interlocutores qualificados, Eduardo Cunha se vê obrigado a apresentar respostas mais consistentes do que aquelas que distribui durante entrevistas coletivas, quase sempre com um sorriso zombeteiro a denunciar o desprezo que nutre pela imprensa.
O título do caderno é esclarecedor: “A reforma do mercado eleitoral”.
Mesmo que discorde de sua visão específica da atividade política e do sistema partidário que patrocina, o leitor se vê obrigado a refletir sobre as razões do presidente da Câmara, que personifica o triunfo do chamado baixo clero após décadas de uma guerra de extinção entre os grupos políticos mais ideologizados que dominaram a cena até aqui.
Pode-se entender, na conversa dura mantida pelos três debatedores, como o extrato da representação partidária mais pragmático e menos comprometido com princípios programáticos se articula para consolidar o poder adquirido nos últimos meses.
Pode-se imaginar que o esforço de Eduardo Cunha para se impor como líder de uma maioria suprapartidária no Congresso irá durar o tempo que a Justiça levar para envolvê-lo definitivamente na Operação Lava Jato. Mas, ainda assim, o debate publicado pelo Valor Econômico é uma grande contribuição para a formação de opiniões mais consistentes entre seus leitores: trata-se de uma aposta na inteligência do leitor.
Enquanto isso, os três diários genéricos de circulação nacional seguem investindo na escola de formação de midiotas conduzida por seus colunistas pitbulls.
 
 
 

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