30 setembro 2014

É SEMPRE ASSIM ÀS VÉSPERAS DAS ELEIÇÕES

Vazamento premiado e o fator Youssef


Novembro/dezembro de 1989: com a possibilidade de um candidato metalúrgico chegar ao poder, a elite dominante se uniu para fechar a porta do Planalto. A empreitada produziu momentos inesquecíveis da baixaria eleitoral.

Primeiro foram atrás de uma ex-mulher de Lula para "acusá-lo" de defender o aborto. Não bastou. Com a ajuda da polícia paulista, o sequestro do empresário Abilio Diniz foi atribuído a grupos internacionais supostamente simpáticos ao PT. Fotografias de sequestradores com a camiseta do partido circularam sorrateiramente, de preferência nem tanto.

Também era pouco. Faltava a televisão. Numa edição que o então diretor de jornalismo da TV Globo, Armando Nogueira, admitiu anos depois ter sido enviesada, o debate entre Lula e Collor carregou nas tintas em favor do autointitulado caçador de marajás. Para fechar o cerco, denúncias de fraude em massa na Bahia foram sufocadas para selar a vitória de Collor. O resto é de todos conhecido.

Setembro/outubro de 2014: numa sucessão galopante, "denúncias" e mais "denúncias" aparecem para tentar provar que o governo petista não passa de uma quadrilha de saqueadores. A origem são as tais delações premiadas, diante das quais dispensam-se provas ou evidências cabais. O réu fala o que quiser, e seria um sinal de retardo mental acreditar que vá falar algo em seu prejuízo.

Basta ver as reportagens. Os verbos mais usados são indicam, sugerem, supõem, fazem crer, sinalizam –tudo com muito cuidado para, ao mesmo tempo, espalhar a dúvida e escapar de processos. Chega-se ao ponto de acusar o ex-ministro Antonio Palocci de pedir a doleiros recursos para a campanha de Dilma. Mas a mesma reportagem reconhece não haver provas de que o dinheiro jorrou. Lembra aquela outra peça de ficção, assinada por um hoje influente assessor de governo tucano, que acusava petistas de ganhar por fora, mas declarava, ao mesmo tempo, não ter condição de confirmar ou desmentir as próprias afirmações transformadas em capa! Nota: nada foi comprovado.

O clima agora é parecido, mas os personagens atrapalham a oposição. O frisson do momento é a delação premiada de Alberto Youssef. Mas quem é Youssef? Um mergulho num passado não tão distante mostra que ele foi um dos doleiros usados pelo então operador do caixa do PSDB, Ricardo Sérgio, para "externalizar", num linguajar ao gosto da legenda, propinas da privatização selvagem dos anos 1990.

Youssef é velho de guerra tanto em delitos com em delação premiada. Já fez uma em 2004, na época da CPI do Banestado, quando se comprometeu a nunca mais sair da linha. O tamanho de sua confiabilidade aparece em sua situação atual. Está preso de novo. Quem diz é o Ministério Público: "Mesmo tendo feito termo de colaboração com a Justiça (...), voltou a delinquir, indicando que transformou o crime em verdadeiro meio de vida." É num sujeito com tal reputação que oposicionistas apostam suas fichas.

Resumo da ópera: sem investigação a fundo, nada vale. Espera-se que a esdrúxula teoria do domínio do fato tenha sido enterrada na gestão Joaquim Barbosa, atualmente mais preocupado com tarifas telefônicas. Goste-se ou não, o bueiro escavado em governos pregressos e nas privatizações feitas no "limite da irresponsabilidade" está sendo aberto pelas administrações petistas. Talvez por isso Dilma tenha deslanchado nas pesquisas, enquanto Marina e Aécio (com aquele ar de falsa virgem já inúmeras vezes deflorada) patinam nas intenções de voto.



(Extraído do ESQUERDOPATA)

 


MARCO REGULATÓRIO PARA AS COMUNICAÇÕES É PRIORITÁRIO

Promessas, omissões e realidade


Venício A. de Lima, no Observatório da Imprensa



A Constituição de 1988 fará 26 anos, portanto, mais de um quarto de século, no próximo dia 8 de outubro. O parágrafo 5º do artigo 220 reza:
“Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.”
Desde outubro de 2010 aguarda decisão no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO nº 10) pedindo que se declare a omissão inconstitucional do Congresso Nacional em legislar regulamentando, dentre outros, o parágrafo acima.
Há quase quatro anos, mais precisamente no dia 2 de novembro de 2010, a então presidente (eleita) Dilma Rousseff, em entrevista concedida à Rede Bandeirante, afirmou:
“Veja bem, você tem de distinguir duas coisas: marco regulatório de um controle do conteúdo na mídia. (...) Porque o marco regulatório é outra questão. (...) O Brasil vai ter de regular minimamente, até porque tem casos que, se você não fizer isso, você deixa que haja uma concorrência meio desproporcional entre diferentes organismos.”
Ao longo do seu primeiro mandato, a presidente Dilma e o seu ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, não consideraram prioritária a questão de um marco regulatório para as comunicações. Na verdade, nem mesmo um anteprojeto elaborado por comissão presidida pelo ex-ministro Franklin Martins, obedecendo a decreto assinado pelo ex-presidente Lula, foi tornado público ou teve qualquer continuidade.
Depois do voto
O Programa de Governo da presidente (candidata) Dilma excluiu, na undécima hora, qualquer referência a um futuro marco regulatório para as comunicações.
Em raras ocasiões ao longo da atual campanha eleitoral e, especificamente, na sexta-feira (26/9), no Palácio do Planalto, a presidente (candidata) Dilma, em entrevista que concedeu a um grupo de blogueiros, afirmou:
“A Constituição diz que os meios de comunicação não podem ser objetos de monopólio e oligopólio. Eu acredito que a regulação tem uma base, que é a base econômica. (...) Além disso, a mídia é um grande negócio. Se for oligopolizada, ela não dará conta da diversidade cultural que temos. (...) É um setor como qualquer outro, tem que ser regulado. (...) Eu acredito que esse é um dos temas do meu segundo governo.”
Nenhum dos três candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República explicitou em seus programas de governo, registrados no Tribunal Superior Eleitoral, propostas de regulação democrática para o setor de comunicações.
Além disso, a Empresa Brasil de Comunicação/TV Brasil não conseguiu realizar um debate entre os candidatos à Presidência da República sobre o tema da comunicação, programado em parceria com a Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e Direito à Comunicação com Participação Popular.
Esses são os fatos.
A ver o que acontecerá depois das eleições de 2014.
***
Venício A. Lima é jornalista e sociólogo, professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado), pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (Cerbras) da UFMG e organizador de Para Garantir o Direito à Comunicação – A Lei Argentina, o Relatório Leveson e o HGL da União Europeia, Perseu Abramo/Maurício Grabois, 2014; entre outros livros
 
 
 

29 setembro 2014

BOLETIM ESCOLAR

A caça aos indecisos


Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa



Os principais jornais de circulação nacional entram na semana decisiva da disputa eleitoral pressionados por uma realidade incômoda: sua principal aposta para a Presidência da República, o senador mineiro Aécio Neves (PSDB), precisaria aumentar em pelo menos 60% seu atual patrimônio de votos e contar com uma complicada mudança de tendências para voltar a ter chances.
Empenhada em interromper o domínio do Partido dos Trabalhadores na política nacional, a imprensa deve recrudescer seus ataques ao governo para tentar impedir uma vitória de Dilma no primeiro turno. A afirmação poderia parecer absurda, não fosse a escolha explícita feita pela mídia tradicional, que se reflete nas edições de todos os dias e se torna ainda mais escancarada nesta reta final.
Em todos os anos em que ocorrem eleições, os jornais dominantes no cenário nacional e as principais publicações regionais anunciam planos para uma cobertura equilibrada e equidistante. Em alguns casos, são contratados consultores especializados e criadas planilhas sofisticadas para análises mais rápidas e precisas dos dados que apontam a tendência dos votos. No entanto, esses planos nunca passam das costumeiras declarações a respeito do jornalismo de qualidade, com frases de efeito sobre lugares-comuns como equilíbrio do noticiário, espaços e destaques divididos de forma equânime e outras excelentes intenções. Quando o jogo começa para valer, o que se vê é sempre o apoio pouco disfarçado ao candidato que mais se aproxima do perfil desejado pelos donos da mídia.
No domingo (28/9), por exemplo, a Folha de S.Paulo anunciou que iria ampliar a cobertura eleitoral, com um caderno especial que agrega oito novos colunistas. Mas o suplemento intitulado “Eleições 2014” traz apenas mais do mesmo, repetindo a prática das análises que garimpam notícias desfavoráveis ao atual governo.
Na segunda-feira (29/9), a manchete sobre o cumprimento do programa registrado pela então candidata Dilma Rousseff em 2010 é um primor de criatividade e manipulação de dados. A base comparativa é o programa genérico que os candidatos entregam à Justiça Eleitoral antes das eleições.
Boletim escolar
Alinhando citações colhidas aleatoriamente em frases “abrangentes, sem prazo ou meta numérica”, como reconhece o texto explicativo, a suposta reportagem submete esses planos a uma escala simplificada de quatro notas, como num boletim escolar: “A” para metas cumpridas em sua totalidade; “B” para objetivos parcialmente alcançados, mas com resultados relevantes; “C” para casos em que foi obtido menos da metade do anunciado e “D” para as propostas que foram abandonadas. A ideia é tão primária que causa constrangimento, mas o título não dissimula as intenções: “Dilma não cumpriu 43% das promessas de 2010”, diz a manchete.
A participação de intelectuais respeitados tenta convencer o leitor-eleitor da seriedade das análises que têm como base um apanhado de pretensões que, como se sabe, não correspondem a compromissos reais de governo. Mesmo porque os tais programas pré-eleitorais não têm força de lei – são apenas declarações superficiais que cumprem uma exigência burocrática e precisarão ser submetidas ao teste de realidade depois da posse. Por exemplo, nenhum candidato previu, em 2010, que o tema da mobilidade urbana dominaria os debates públicos a partir de junho de 2013.
Os editores da Folha incluíram no projeto humoristas e cronistas da vida cotidiana, entre os quais um jornalista que escreve sob o pseudônimo de “Rui Goiaba” – eles estão encarregados de oferecer uma leitura mais leve ao material que normalmente é produzido pelo confronto dos candidatos. Talvez esses venham a ser o melhor do novo suplemento, porque não parecem se levar tão a sério quanto os cientistas sociais, economistas e filósofos que costumam emprestar seus títulos para referendar a opinião dos editorialistas.
As pesquisas de intenção de voto revelam o efeito do noticiário sobre a escolha dos eleitores: o resultado mais evidente do partidarismo da imprensa é a criação de um bloco compacto de opinião antipetista, que se concentra nas cidades onde os grandes jornais têm maior presença. Esse núcleo, tão avesso ao contraditório quanto os mais renhidos entre os militantes petistas, precisa ser alimentado diariamente com sua cota de certezas absolutas.
O último esforço da mídia tradicional se dirige a outro grupo, o dos indecisos, que vão dizer nos próximos dias se haverá segundo turno. 
 
 

28 setembro 2014

A CAMPANHA ELEITORAL

Feia, grossa e errada
Janio de Freitas

Aí estão os dias finais de uma campanha feia. Antecipada por Eduardo Campos e Aécio Neves, que em maio já tinham atitudes eleitoreiras, nos cinco meses até agora não deixou nem um só instante de brilho pessoal ou de criatividade política. Não é menos notável que, em se tratando de candidaturas à Presidência, também não aparecesse nem uma só proposta capaz de distinguir-se do que tem composto o palavrório trocado entre oposições e governos.

Em compensação, não faltou grossura. Desde sua queda na pesquisa anterior à de agora, Marina Silva consumiu muito das oportunidades de atração eleitoral com o discurso de vítima na campanha baseada em ataques. É claro que algum efeito o tiroteio político sempre produz, em quem é alvo e no atirador. Mas ninguém sai desta campanha na condição de devedor de ataques aos adversários diretos. E daí vem uma ameaça às eleições futuras.

Vê-se que o fracasso da agressividade de José Serra, na disputa com Lula, não serviu de ensinamento aos políticos que os sucedem em confrontos iguais. E com os mais afortunados marqueteiros parece ter ocorrido o mesmo, sendo que, no seu caso, também nada aprenderam com o mestre marqueteiro, Duda Mendonça, e o seu Lula cativante e proponente.

A grossura foi até institucionalizada agora, como técnica marqueteira, sob o nome enganoso e enganado de "desconstrução" do adversário. Agressão e desconstrução são coisas diferentes. Mas como ao final da batalha verbal haverá, necessariamente, vencedor que praticou a "desconstrução", é grande o risco de que a nova "técnica" fique consagrada como chave do sucesso eleitoral.

O ataque como campanha não fará a vitória nem as derrotas nesta eleição. Explicar as suas quedas nas pesquisas pelos ataques recebidos, como fazem Marina e seus correligionários, equivale a dizer que os ataques eram fundados, porque ela decaiu, em apenas um mês, dos 50 pontos que tinha no fim de agosto para os 27 do fim de setembro.

Da mesma maneira, se "desconstruir" por ataques levasse ao êxito, Aécio Neves teria hoje outra situação. E Dilma Rousseff não poderia estar na liderança, porque durante os cinco meses foi o alvo principal de Aécio, inaugurador da campanha baseada na "desconstrução" e divulgador desse nome.

Aécio tem motivos para lamentar sua campanha. As perspectivas que o levaram à candidatura caíram com o avião de Eduardo Campos, mas as últimas pesquisas mostram que errou duplamente. Primeiro, ao relaxar por causa da entrada impetuosa de Marina na disputa e nas pesquisas. Segundo, por se limitar aos ataques. Quando viu o movimento descendente de Marina, há duas semanas, Aécio reanimou a campanha e, para isso, afinal fez um pouco mais do que atacar. A resposta veio nos dois últimos Datafolha: subida equivalente a 20% do total anterior.

A campanha de Marina não foi capaz de demonstrar ser ela o tal novo, que lhe fora atribuído pela mistura de aversão ao PT, rescaldo de votações passadas, escassa identificação de Aécio e morte de Eduardo Campos. Marina preferiu a aderir aos ataques, e leva o troféu do mais violento deles, na acusação aos governantes do PT de "nomear diretores para assaltar a Petrobras". A expectativa do novo refluiu, à falta de sua exibição, e várias contradições tornaram Marina mais vulnerável. Na queda, à sua fixação no ataque juntou apenas a lamentação de vítima. Será pouco para explorar os próximos e últimos dias.

Dilma entrou na campanha com um patrimônio único. Se bem trabalhadas, muitas das ações do seu governo traziam um potencial grande de atração do eleitorado. Mas sua campanha pendeu, de início, para um populismo barato, levado a extremos no horário eleitoral. Depois, entrou e ficou no jogo dos ataques, escolhido pelos adversários.

Só nas duas últimas semanas Dilma adotou o papel de candidata diante dos eleitores. E recebeu, como resposta, o aumento de sua vantagem no primeiro turno e a liderança no eventual segundo, perdida por Marina. E, a depender dos próximos dias, até a hipótese de encerrar a eleição no primeiro turno.
 
 
(Extraído do ESQUERDOPATA)
 
 
 

VEJA PRODUZIU UM TIRO DE ESPOLETA

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Jovens, chegou a hora!
 
por Gilson Caroni Filho, via e-mail
 
 
Não costumo comentar pesquisas, mas a de ontem, do Datafolha, me obriga a abrir uma exceção. Dilma cresceu nas pesquisas com intenções de voto que migraram de Marina para ela. Os analistas da grande imprensa rapidamente arrumaram uma explicação: “a candidata da Rede perdeu votos nos extratos mais pobres”. É o desejo se confundindo com a análise. É a tentativa de ocultar o mais significativo: parcela da juventude que estava com Marina da Silva entendeu que ela nada mais é que “a velha direita” disfarçada de “nova política”. Mas vocês, jovens que são, sabem o que é velho, mesmo que o disfarce tenha maquiagem da grande mídia.
 
Tentaram instrumentalizá-los nas suas legítimas manifestações de junho do ano passado. Mas ali, com o apoio inestimável da Mídia Ninja, vocês começaram a entender que queriam transformá-los em massa de manobra para interesses reacionários. Pregavam ódio à política. No primeiro momento, vocês até que se confundiram ao gritar “não à política”. Mas com o tempo, afirmaram, mais uma vez, que só se aprende na ação, se deram conta de que a alternativa que lhes propunham era dizer sim a uma imprensa, que abandonou o jornalismo, para virar panfleto partidário do PSDB.
 
A opção que lhes ofereciam era deixar tudo com o mercado e ficarem brincando com celulares, aplicativos e joguinhos. E foi aí, mostrando que não se deixariam infantilizar, que se deu o que chamarei de “a grande recusa”: vocês estão começando a vida, mas não são mais crianças. São jovens cidadãos que não estão acorrentados ao cabresto dos fetiches. Conheceram as ruas e entenderam que é nela que se faz a grande política.
 
Confesso que na minha juventude era muito mais fácil optar por um caminho. As coisas eram claras ou escuras, pois vivíamos sob uma ditadura brutal. Para vocês, foi mais difícil: vivemos uma crise de representação e todos se dizem democratas, velhos corruptos falam de uma indignação que não sentem e escravocratas resolveram posar de vestais da República.
Mostrando discernimento, aprenderam a ler a grande imprensa e passaram a ignorá-la. A edição da revista “Veja” desta semana é um exemplo. Prometeu um “tiro de prata” e produziu uma matéria patética, um tiro de espoleta que evidencia a tarefa dos estudantes jornalismo: recriar a imprensa, pois a que aí está jogou sua credibilidade no ralo.
Por fim, e isso foi maravilhoso, compreenderam que nada é mais novo e revolucionário do que dar continuidade a três governos que reduziram substancialmente as desigualdades com políticas de inclusão. Nada é mais importante do que continuar tirando milhões de pessoas da miséria, dando-lhes condições de frequentar uma escola e, posteriormente, ingressar em uma faculdade. Vocês, mais do que eu, sabem como é rica a convivência, em ambiente acadêmico, de pessoas de classe média alta com jovens oriundos de comunidades carentes. Como o a gente aprende com isso, como vencemos preconceitos. E é isso que faremos juntos: continuaremos vencendo preconceitos e construindo um mundo novo.
 
Em vários artigos os concitei à reflexão. Hoje é diferente. Venho aqui para externar meu orgulho pelos jovens que não se renderam ao discurso do ressentimento, do ódio de classe reproduzido pela mídia, por algumas escolas, igrejas e alguns professores portadores de discursos pseudomodernos.
Meu orgulho é como pai, avô e professor. Seguiremos unidos até a vitória. Um grande abraço.
 
 
(Extraído do VIOMUNDO, de Luiz Carlos Azenha)
 
 

27 setembro 2014

JUNTAR OS CACOS

Marina quase foi o tudo. E pode virar o nada.


Fernando Brito, no TIJOLAÇO



adeus
É muito curioso o que ocorre quando a política, em lugar de se dar como emanação de um processo social, passa a viver à base de jogadas, truques de esperteza e arranjos de marketing.
Não que eles não possam ser bem sucedidos, como foram, por exemplo, na eleição de Fernando Collor, em 89, quando se tratava, antes e acima de tudo, de não permitir a eleição de um favorito de esquerda, primeiro Leonel Brizola e, a seguir, Luís Inácio Lula da Silva, separados por ínfimo meio por cento no primeiro turno.
Antes que digam que estou comparando Marina Silva a Collor, digo que não vejo a menor semelhança entre ambos, exceto a arrogância.
Interessa-me é o que se une em torno e o que, depois do seu desmanche, o que resta nas forças políticas que representam como “salvadores da pátria” que se proclamam fora da política.
E o que pode, surpreendentemente, fazer com que parte da direita brasileira, diante da inviabilidade de uma vitória de Marina Silva, prefira que a eleição se encerre no primeiro turno, o que é menos improvável do que muita gente pensa.
Vejam: o crescimento de Marina Silva veio, essencialmente, de três vertentes.
A primeira, a não-política, espécie de hipocrisia alimentada pela mídia e seu falso moralismo nas classes médias urbanas. É algo que não tem voto, mas tem “estampa”. É um espaço eleitoralmente minúsculo, mas barulhento, onde se aninham “udenistas de esquerda”, de direita e psolistas em geral, abrigados antes no PT “pré-poder”.
A segunda, deformação politiqueira de confissões evangélicas que pretendem se comportar, espalhadas pelos partidos, como um partido político e uma ferramenta de poder.
E, por último, a mais importante: a falta de um candidato da direita orgânica, tradicional, que, diante da rejeição  e repetidas derrotas de seu general José Serra e da inutilidade pomposa do Marechal Fernando Henrique, teve de adotar um candidato pífio, sem luz própria e cuja carreira foi o arranjo de um “filhinho do vovô”.
A fatalidade da queda do avião de Eduardo Campos reciclou Marina Silva e a transformou na “grande esperança verde” para dar fim ao ciclo trabalhista-desenvolvimentista que começou com Lula ( e, ainda assim, depois que ele percebeu que a direita não o aceitaria como solução intermediária a um regime  entreguista e excludente, porque a direita brasileira não aceita – e nunca aceitou – qualquer regime que não fosse o da espoliação selvagem deste país).
Marina tinha o “physique du rôle” para isso: de origem pobre, aparência frágil, evangélica e de personalidade arrogante, em tudo servia para apresentar-se como capaz de capturar os votos da pobreza, o que de fato fez em certa classe média baixa, em parte e durante algum tempo.
Além disso, caprichou em sua conversão à uma imagem de “selvagem domesticada”, cuidando de exibir suas companhias “confiáveis” –  a senhora do Itaú e os economistas neoliberais – como penhor de sua docilidade ao stablishment.
Marina, porém, esbarrou em alguns limites.
O primeiro, a fantástica lucidez do povo mais pobre deste país que, embora vivendo os maiores sacrifícios e carências, soube, quase que instintivamente, proteger suas conquistas.
O segundo, também um instinto de sobrevivência, este de Dilma Rousseff, que abandonou a despolitização que marcou seu governo e assumiu, de frente e sem covardias, o combate político, inclusive e sobretudo no horário político.
O terceiro – e este foi fatal a Marina –  o tempo de exposição de suas próprias fraquezas. A necessidade de atender a tantos senhores quanto os que necessitada em seu inorgânico ajuntamento – de Malafaia a Setúbal, de tudo um pouco – foi-lhe expondo as contradições, as companhias e, sobretudo, a inevitabilidade de um governo de concessão aos ricos e arrocho aos pobres.
Agora, chegamos a um possível – para mim, provável – paradoxo.
A direita paulista – e direita paulista é um pleonasmo e uma definição – prefere agora a morte rápida, com uma decisão de primeiro turno.
A vitória de Alckmin já na primeira rodada parece assegurada e o mesmo ocorre com algo que irá definir seu futuro nos próximos anos: a eleição de José Serra para o Senado.
Este é o eixo de poder real que irá se agrupar na oposição a Dilma, com Aécio reduzido a expectativas no máximo estaduais e Marina Silva, enfim descartada do cenário político, como bananeira que já deu – e na segunda vez não o pôde dar – cacho.
Não estou dizendo que a eleição se encerrará no primeiro turno, até porque os movimentos eleitorais tem um quê de insondável.
Estou registrando, agora com mais clareza, aquilo que já vinha afirmando desde o dia 3: “se a direita convencer-se que Marina não será o seu “cavalo” nesta disputa presidencial, poderá “sacrificá-la” antes da hora. E juntar os cacos do PSDB.”
Para que levar Marina a um segundo turno e deixá-la como “player” em 2018?
A política, não me canso de repetir a frase do velho Brizola, ama a traição, mas logo acaba por abominar o traidor.
 
 

"LISTA DE MALDADES"

A sombra sinistra do passado


Maurício Dias, na Revista CartaCapital




Há quem ache um exagero, para assustar eleitores, os discursos de campanha de Dilma Rousseff. Ela fala e se mostra convencida de que, em caso de vitória, a oposição representada pelas candidaturas de Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB) cumpriria uma “lista de maldades”. Uma citação que traz à memória a “Caixa de Pandora”, onde, diz a lenda, estão guardados todos os males.
Esse programa oposicionista centrado nessa “lista de maldades”, batizada assim pelo economista Arminio Fraga, é capaz de arruinar muitas das conquistas sociais criadas nos 12 anos de governos petistas. E não é novidade esse propósito.
Os economistas tucanos, e os tucanos travestidos de marineiros, pensam da mesma forma e cultivam o mesmo sonho. Propõem resolver problemas econômicos saindo pela velha e costumeira porta sempre aberta para sacrifício da população mais pobre: salário menor, desemprego maior, menos consumo etc.
Um sonho para eles. Um pesadelo para a multidão de cidadãos pobres abrigados sob programas sociais. Milhões deles arrancados da miséria recentemente e tirados da marginalidade social.
Mais que isso. Há planos para eliminar direitos trabalhistas conquistados na “Era Vargas”, que soma o período ditatorial (1937-1945) e o período Constitucional (1951-1954).
À eliminação de direitos trabalhistas Dilma disse “não”. E introduziu no debate antigo ditado popular: “Nem que a vaca tussa”.
As artimanhas dos adversários da presidenta, denunciadas por ela, poderia ser rebatida pelos opositores como fruto de invenção eleitoreira. Essa resposta poderia criar dúvidas até a semana passada. Mais precisamente, antes da palestra do economista Arminio Fraga, feita em São Paulo, para cerca de 600 empresários.
Fraga, ex-presidente do Banco Central no governo FHC, seria o czar da economia com a vitória de Aécio. Com a vitória de Marina talvez não tivesse o cargo. Teria poder, sem dúvida.
Perguntado acerca de medidas que tomaria para reduzir gastos do governo, ele desviou-se. Mas deixou as mangas de fora ao afirmar que seria “tolo” se falasse sobre uma “lista de maldades” em um ambiente eleitoral.

No mesmo dia, quase simultaneamente, o secretário de Política Econômica do governo, Márcio Holland, debatia na Fundação Getulio Vargas, no Rio, com Samuel Pessoa, da equipe de Aécio, e com Marco Bonomo, do time de Marina. O confronto, de dois contra um, transcorreu em forma de guerra verbal.
Holland reagiu de forma dura às críticas feitas ao governo. Sugeriu que Bonomo e Pessoa se atualizassem com teorias econômicas mais recentes.
Em certo ponto sugeriu a Pessoa: “Acho que você devia atualizar a leitura pós-crise, ler bons livros”. Citou de passagem Joseph Stiglitz, Nobel de Economia em 2001, e Janet Yellen, presidente do FED, o banco central dos EUA.
Pessoa contra-atacou o argumento considerado por ele como “difícil de aceitar”. O Brasil parou de crescer, ele afirmou, em razão da desaceleração da economia mundial. Após isso fez o diagnóstico que, certamente, Arminio Fraga assinaria: “O ritmo mais fraco da economia brasileira está ligado aos custos dos programas sociais”. Esse é somente mais um dos itens da “lista de maldades” guardada no bolso de Arminio Fraga.
 
 

OS ARAUTOS DA VIOLÊNCIA

Mídia ninja e a imprensa factual


Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa




Pesquisadores acadêmicos já se debruçaram sobre a questão da credibilidade da imprensa com mais interesse até vinte anos atrás, mas o tema perdeu espaço para outros assuntos, como a expansão das mídias sociais digitais.
A onda de protestos que varreu as grandes cidades brasileiras a partir de junho do ano passado atraiu atenção para o advento da chamada “mídia ninja”, caracterizada pela cobertura de eventos massivos com o uso de aparelhos de comunicação móvel e divulgados por meio de estruturas abertas e orgânicas sem vínculo com empresas de comunicação.
Um dos trabalhos mais consistentes sobre esse fenômeno acaba de ser publicado pela jornalista e escritora Elizabeth Lorenzotti: Jornalismo Século XXI - O Modelo Mídia Ninja. A frase que motivou a pesquisadora a estudar o surgimento dessa nova prática no campo do jornalismo foi colhida no Twitter. Dizia o seguinte: “Não precisamos de mídia partidarista; temos celulares”. A declaração se inseria na percepção geral de que a mídia tradicional fazia uma cobertura tendenciosa dos protestos, criminalizando os manifestantes.
Embora os “ninjas” tenham se tornado mais conhecidos com as passeatas, relata a autora, seus participantes já atuavam em eventos que eram desprezados pela mídia tradicional, como a investigação da morte de líderes rurais no Pará. A intensidade da cobertura desses grupos orgânicos nas manifestações, com grande repercussão nas mídias sociais, levou a imprensa dominante a também infiltrar repórteres munidos de telefones celulares nos movimentos de rua, conforme relata Lorenzotti. No fim do processo, ganhou o jornalismo, com as principais emissoras de televisão e os grandes jornais sendo obrigados a olhar mais de perto as causas do descontentamento manifestado nas ruas.
O fenômeno “ninja” refluiu com o esvaziamento das passeatas, tomadas pelo protagonismo violento dos “black bloc”, e ficou uma percepção geral de que essa nova prática jornalística se limitava a uma cobertura factual de eventos impactantes. O livro de Elizabeth Lorenzotti mostra que o fenômeno se relaciona com mudanças mais profundas na sociedade contemporânea, e que o fato de não ouvirmos falar deles não quer dizer que os “ninjas” estejam inativos.
Notícias sem contexto
O protagonismo dos “ninjas” evidenciou que a mídia tradicional vem passando por um processo de encolhimento não apenas quanto às suas audiências, mas principalmente no que se refere à abrangência de suas coberturas. Mesmo dispondo de tecnologias que permitem detectar os acontecimentos e recriar em torno deles as correlações que facilitariam sua compreensão, a leitura dos jornais e o acompanhamento dos noticiários da televisão e do rádio nos mostram que a imprensa compõe uma realidade fragmentada e submetida a uma opinião centralizada sobre tudo.
Vejamos, por exemplo, dois fatos recentes: a morte de um estudante na Universidade de São Paulo e o assassinato de um vendedor ambulante, cometido por um policial militar.
As notícias e suas repercussões são publicadas isoladamente, sem um contexto que as relacione. Paralelamente, somos informados de que o índice de homicídios e roubos seguidos de morte voltou a crescer pelo segundo mês consecutivo, enquanto as estatísticas registram o aumento da letalidade das ações policiais em todo o território paulista. Ao mesmo tempo, pode-se observar que cresce o número de candidaturas à Câmara dos Deputados e às Assembleias Legislativas de ex-policiais cujas campanhas se caracterizam pela apologia da violência. A chamada “bancada da bala” pode crescer em todos os Estados e no Congresso Nacional, como resultado da sensação de insegurança gerada por crimes de grande repercussão e pela grande repercussão dada aos fatos criminosos.
Há uma interessante correlação entre a morte do estudante, em que as principais suspeitas caem sobre agentes privados de segurança, o aumento dos crimes letais, a epidemia crescente de violência policial e o número de votos destinados a oportunistas que buscam a carreira política com o discurso irresponsável da lei do cão.
A cobertura da mídia tradicional sobre esses acontecimentos é meramente factual. A omissão da imprensa em questionar a responsabilidade dos governantes diante da arbitrariedade policial e a truculência de agentes privados de segurança deixa à vontade os arautos da violência.
 
 
 

26 setembro 2014

É HORA DE ACABAR O MONOPÓLIO DA GLOBO

O tratamento VIP do Bom Dia Brasil
a Marina


Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo



Parecia uma família feliz
Parecia uma família feliz
Não fui eu que disse. Foi a Sheherazade loira, Joice Hasselman, da TV Veja. Ela fez a seguinte avaliação da entrevista concedida por Marina ao Bom Dia Brasil.
“Marina nadou de braçada. Ela falou o que quis e bem entendeu. Não foi interrompida e nem colocada contra a parede (…). Em condições tão favoráveis, fez bonito: sorriu, brincou e atacou. Cada vez que uma bola era levantada, Marina cortava e de forma certeira. E o alvo era a adversária, Dilma Rousseff.”
Joice estava, naturalmente, elogiando a entrevista e a entrevistada. Fora rugas e estrias, provavelmente a coisa que Joice mais abomina na vida é Dilma.
Não havia, portanto, nenhum ar condenatório em sua avaliação da sabatina de Marina no Bom Dia Brasil.
E no entanto essa diferença brutal de tratamento é o triunfo do antijornalismo e da desonestidade intelectual.
Em favor de Bonner e Poeta, registre-se que a agressividade deles foi dirigida igualmente a todos os candidatos que tiveram o desprazer de passar pelo Jornal Nacional.
Mas no Bom dia Brasil as coisas foram distintas, como notou e aprovou Joice Hasselman.
Até Míriam Leitão estava sorridente, doce, acolhedora. Maternal.
Suas perguntas na área econômica – seu “terreno”, como ela fez questão de dizer – foram daquele tipo que uma mãe faz ao filho.
Por exemplo, ela tocou nos direitos trabalhistas. Melhor, levantou a bola, como disse a nova Sheherazade.
Que significa “atualizar”?
Sabemos todos que atualizar, na cabeça dos mentores econômicos de Marina, é subtrair direitos trabalhistas.
Ninguém no time de Marina pensa em mexer na CLT para aperfeiçoar as conquistas dos empregados.
Da última vez que um governo “atualizou” a CLT, sob o general Castelo Branco, pouco depois da instauração da ditadura militar, foi eliminada a estabilidade de que gozavam os empregados depois de dez anos de trabalho.
Mas isso não dá votos, é claro, senão entre donos de empresas. Foi exatamente a um grupo deles que Marina fez a promessa.
Marina disse que não disse o que tinha dito, diante da reação negativa a seu anúncio de “atualizar” os direitos.
No Bom Dia Brasil, com a ajuda de Míriam Leitão, ela teve a oportunidade de completar seu giro espetacular na questão.
Na verdade, afirmou Marina, não apenas não serão mexidos os benefícios de quem tem emprego regular, de carteira assinada, como eles serão estendidos aos que trabalham na informalidade.
Nesta pergunta, e em todas as demais, Marina esteve sempre numa zona de monumental conforto.
Não houve um único momento de atrito. Ali estava, você poderia pensar, uma família feliz e harmoniosa.
Por que tamanha diferença de tratamento?
Há, primeiro que tudo, a vontade da Globo de ver Dilma ser derrotada, e Marina é agora a grande esperança.
Mas existe também uma coisa de mulher. Ou de mulheres. Uma antipatia mútua, uma hostilidade maldisfarçada.
Você vê, na entrevista de Dilma, que Míriam Leitão não gosta dela. Repare nas expressões. Se há algo em que denunciamos nossos sentimentos, é exatamente isso – as expressões.
Não me pareceu unilateral. Tive a forte impressão de que Míriam Leitão é correspondida por Dilma.
Se fosse no Velho Oeste, talvez as coisas terminassem num duelo ao por do sol.
Não entendo por que Dilma se submete às excruciantes entrevistas da Globo, francamente.
Lembranças de um tempo remoto em que a Globo fazia e desfazia presidentes? Talvez.
Mas isso ficou lá para trás.
A internet trouxe variadas possibilidades de um candidato se conectar com os eleitores, das redes sociais a sites independentes. Fora isso, Dilma tem um espaço generoso no programa eleitoral gratuito.
Por que se submeter à violência torrencial da Globo? Apenas para lembrar, na sabatina do jornal Globo, o colunista Ricardo Noblat conseguiu a proeza de mandar Dilma falar menos.
Dilma perde muito mais do que ganha – até em paz – ao se submeter às múltiplas sabatinas da Globo.
São sabatinas na tevê, no jornal, na internet, no rádio – tantos veículos distintos que no fim você apenas conclui que é hora de desfazer o monopólio da Globo na mídia.